Os sérios problemas que vieram
com a Agricultura Série transcrita dos livros
"A SOPA QUÍMICA"/“THE CHEMICAL BROTH
- Milton Maciel – Idel - 2008/2013 (Broth = Caldo)
(ver mapa abaixo: distribuição dos indígenas)
O Desequilíbrio Essencial (continuação)
Mas todos os indígenas brasileiros aproveitavam qualquer tipo de animal na alimentação, incluindo mosquitos, piolhos,
larvas, lagartas, gafanhotos, formigas, cupins e lagartixas, além dos óbvios
macacos, antas, capivaras, porcos do mato, cobras, aves (e seus ovos) e muitos
outros animais que caçavam. Os rios e lagos lhes proporcionavam fartos estoques
de peixes, sapos, rãs, enguias e jacarés.
Aqui no Brasil, como em
qualquer outra parte do mundo, pode-se dizer que os seres humanos já comeram de
todas as espécies de animais que se moveram sobre a Terra, após a existência do
gênero Homo. Simplesmente todo e
qualquer animal que teve o infortúnio de cruzar com os humanos em seu caminho,
acabou em sua barriga, da larva ao elefante, do piolho à baleia.
Os índios Tupis e Guaranis
tinham uma dieta muito mais rica e variada. Comiam o mesmo tipo de carne de
caça e pesca abundante, citado acima. Contudo, sendo habitantes da faixa
litorânea, não só se alimentavam também de peixes de mar e mariscos, como
também faziam uso moderado do sal, que sabiam extrair da água do mar. Como
condimento, usavam vários tipos de pimentas nativas e certas ervas aromáticas.
A dieta era extremamente
rica numa ampla variedade de frutas silvestres, com especial destaque para o
caju, a goiaba, o araçá, o ananás, a mangaba, a pitanga, o pequi, o cacau e o
coco. Além dessas, de acordo com a região em que viviam, tinham a seu dispor um
verdadeiro banquete de outras frutos: abiú, jambo, guariroba, grumixama, açaí,
cupuaçu, guaraná, jaboticaba, gabiroba, camu-camu, carambola, guaraná, baru,
jambolão, butiá, guabiju, licuri, jaracatiá, murici, pindaíba, murumuru, cagaita,
sapoti, maracujá, pitanga, marajá, fruta-de-ema, banana-de-macaco, marôlo,
araticum-cagão, taperebá, cariota-de-espinho, pau-alazão, para citar apenas
algumas.
Aliás, esta relação aqui
apresentada é apenas uma pálida amostra das mais de trezentas diferentes espécies de frutas nativas do país. As matas
ofereciam esse banquete permanente de enorme diversidade, algo inexistente nos
dias de hoje, quando um reduzidíssimo número de frutas, boa parte não-nativas (em itálico), ocupa o nosso paupérrimo cardápio:
banana, maçã, laranja, limão, goiaba, caju, coco, tangerinas, manga, morango, pêra, uva, pêssego, mamão, melão, melancia, abacate, maracujá, abacaxi e figo.
Mas, apesar de serem cerca
de duas dúzias as espécies de frutas mais comumente consumidas agora,
dificilmente todas elas chegam a
fazer parte do cardápio anual dos brasileiros. Vê-se, assim, que a perda de
biodiversidade é extrema, quando comparamos as dietas primitivas com as
contemporâneas.
A banana passou a ter uma grande importância na alimentação indígena,
por causa de sua rápida propagação pelo território brasileiro, mas a banana não
é uma fruta nativa do Brasil, como o são todas as outras acima citadas,
incluindo o cacau, o que pode causar
estranheza a algumas pessoas que acreditam, por exemplo, que o cacau
originou-se apenas da América Central.
Quanto à atividade agrícola
propriamente dita, além do cultivo primitivo da mandioca, os indígenas mais
aculturados plantavam também o milho, conhecido como abati entre as tribos litorâneas. Contudo, uma coisa chama a
atenção: embora já com hábitos de agricultores, mesmo assim a maior parte das
tribos ainda não tinha abandonado totalmente o costume nômade de seus ancestrais caçadores-coletores. Não se fixavam à
terra por mais do que quatro anos, em média, abandonando um lugar sempre que
viam diminuir ou a fertilidade do solo ou a disponibilidade de caça e pesca
abundante e, portanto, extremamente fácil.
Quando os colonizadores
portugueses chegaram ao Brasil pela primeira vez, em 1500, havia provavelmente
5 milhões de índios no Brasil. Hoje, eles estão reduzidos a menos de 10% dessa
quantidade original. Nos primeiros
tempos, apesar de muitas escaramuças, o convívio com os brancos foi relativamente
pacífico, enquanto estes se preocuparam apenas com o extrativismo de
pau-brasil. Mas, quando os portugueses começaram a introduzir suas lavouras, os
índios passaram a ser vistos como entraves à posse da terra necessária aos
cultivos, pois resistiam ao avanço dos agricultores. Também passaram a ser
vistos como potencial mão-de-obra barata – ou seja, escravos para as lavouras.
Mas os índios resistiram
sempre, não se submeteram; eram guerreiros valentes e não sobreviviam se
submetidos ao cativeiro nas roças. Ante o potencial bélico muito superior dos
invasores, preferiram migrar do litoral para o interior, embrenhado-se nas
selvas de difícil acesso aos colonizadores. Isso levou os colonizadores a
buscar mão-de-obra escrava na África, iniciando-se assim o longo e doloroso
processo de captura e transporte de centenas de milhares de africanos para o
Brasil. Era a agricultura cobrando seu
alto e permanente preço da escravização.
CONTINUA
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