sexta-feira, 15 de março de 2019

AURÉLIO NÃO TEM BUCETA (que não é palavrão!)
MILTON  MACIEL
(Cap. 19 do livro 'COMO É CARO SER MULHER" - Milton Maciel, 3a. ed. IDEL, 2018, à pg 91)

Que Aurélio não tenha buceta pode parecer óbvio, pensarão muitos, por tratar-se, evidentemente de um homem. Mas não é a qualquer Aurélio que quero me referir aqui. É ao Buarque de Hollanda, o Pai dos Burros, o dicionário Aurélio. Esse Aurélio não tem  buceta porque a grafia correta, em idioma português, é boceta – com O.

Nós é que temos o costume de, ao falarmos, trocar muitas vezes o o pelo u, mormente se o coitado do o é a última letra: ensino vira ensinu, caderno vira cadernu, e assim por diante. Da mesma forma, bochecha vira buchecha, boceta vira buceta e por aí vai. Logar virou oficialmente lugar, inclusive. Com o tempo, o mesmo vai acontecer com a dita cuja.

Então fica comprovada minha primeira afirmação: Aurélio não tem buceta.

Vamos agora à segunda: Buceta não é palavrão; Aliás, também não é nome feio. Senão vejamos:

Para mim palavrão e anticonstitucionalissimamente, é oftalmotorrinolaringologista ou, pior ainda, a maior de todas as palavras registradas em dicionário de português (Houaiss) até hoje, a maior palavra de nosso idioma, um termo técnico com 46 letras, que descreve o portador de um tipo de silicose: 

pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico.

Pois o pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico é um coitado que desenvolveu uma silicose por inalar repetidamente fumaça com cinzas de vulcão. Vai ver cansou de cheirar pó, não fazia mais efeito.

Ora, convenhamos que pneumoultramicroscopicossilicovulcanoconiótico é mesmo um palavrão! Lembra até um daqueles enormes vocábulos que, em todo o planeta Terra, só podem existir em idioma Alemão – vocábulos que, para serem pronunciados até o fim, exigem que o pobre mortal tenha que parar para tomar fôlego pelo menos umas quatro vezes, se não quiser cair duro, roxo, cianótico ou, quiçá, até mesmo para-vulcanoconiótico.

Boceta é palavrinha, é pequena e é delicada, com 6 letrinhas, não tem a nada a ver com o gigantismo de um oftalmotorrinolaringologista, de pantagruélicas 28 letras, um inegável, um ineludível palavrão.

Por outro lado, o machismo dominante de nossa cultura pespegou-nos a peça de que boceta é nome feio. Discordo. Para mim nome feio é Valdicrêisson, Anderssocreitão, Um-Dois-Três-de-Oliveira-Quatro, Hermenengarda Filisbinda, até mesmo o inocente nissei T. Oku Kaganawara.

Já boceta é linda.  Tanto como inocente palavra, não afetada pelos machismos e falsos-moralismos da cultura hipócrita, quanto na sua estética exterior da parte física feminina, mormente quando envolvida por seus naturais pelos, capazes de esconder eventuais excessos. Aí ela é o Delta de Vênus e seu inconfundível formato de escuro triângulo tem inspirado os artistas pelos séculos sem fim.

Ora, é fundamento da Filosofia, na Estética, que “belo é aquilo que se deseja”. Pois se mais de 3 em cada 4 homens e mais de 1 em cada 4 mulheres passam a vida inteira atrás de um (ou vários!) Deltas de Vênus, como conceber que ele não seja lindo, se é assim tão desejado?

Boceta etimologicamente parece provir de bouceta, uma pequena bolsa ou caixa. Ou seja, é uma bolsinha. Em Portugal ainda é comum que se use a expressão Caixa de Pandora e, mais raramente, Boceta de Pandora, para designar o recipiente do qual Pandora deixou escapar todos os males que afligem a humanidade.

O mito grego de Pandora tem paralelo no de Eva e a Serpente, de origem sumeriana. Em ambos o mesmo nojento machismo dos religiosos da Antiguidade (não muito diferente do dos fanáticos religiosos de hoje) dá um jeito de colocar a culpa na mulher por todos os males humanos.

Quando Zeus (Júpiter, para os usurpadores romanos) empreendeu sua longa guerra contra seu pai Kronos (Saturno, para os romanos usurpadores), todos os Titãs, da mesma estirpe de Kronos, aliaram-se a ele. Com exceção de um só: o Titã Prometeu. Ele preferiu trair sua estirpe e manter-se aliado de Zeus, porque tinha o dom da profecia, sabia ver o futuro. E, nesse futuro, ele viu Zeus vencedor.

Quando isso de fato se concretizou, Zeus resolveu recompensar o aliado, dizendo-lhe para pedir o que bem entendesse. Ora, Prometeu o que fez, pegando o novel chefe dos deuses olímpicos pela palavra, foi pedir a Zeus que livrasse de punição a seu irmão Titã, Epimeteu. Zeus havia condenado todos os Titãs, exceto Kronos e Rea, seus pais, ao banimento para o Tártaro, nas entranhas da Terra (Gaia). Apanhado pela palavra, Zeus ficou furioso, pois queria de toda forma se vingar de Epimeteu.

Contudo, já que era forçado a perdoá-lo, arranjou outra forma de puni-lo. A forma foi ardilosa e... belíssima. Pois foi então criada uma mulher “artificial’ (o mito não é muito claro quanto a este artificialismo, posto que Pandora era uma perfeita mulher, uma obra prima de Hefesto). Essa mulher, de incrível beleza, foi oferecida por Zeus a Epimeteu como esposa, como prova de que não havia mais ressentimentos.

Só que Pandora chegou trazendo consigo uma boceta (é a outra!). Essa boceta de Pandora era um misterioso repositório, dentro do qual havia algo guardado que NUNCA poderia ser revelado. Ou seja, Pandora JAMAIS poderia abrir a boceta. O mito aproveita para aludir à proverbial curiosidade humana, é claro que a travestindo de curiosidade feminina. E o que acontece é que Pandora não resiste e, um dia, bem escondida, ela abre uma pontinha de sua boceta.

E aí acontece a desgraça, tal qual planejada por Zeus: de dentro da bolsa, (ou caixinha, ou vaso, conforme a versão) saem todos os males que vão afligir a humanidade: a intemperança, a ambição, a cobiça, os ciúmes, a velhice e a doença. Pandora fecha a boceta rapidamente e lá ainda fica a Esperança: a última que sai, por isso a última que morre.

Ou seja, deram um jeito de botar todas as culpas numa boceta (em duas, para sermos mais exatos) pelos males dos homens. Da mesma forma culparam a coitada da Eva de ser uma tapada, que é enganada pela Serpente (Lilith), cedendo – também por causa da curiosidade. Aí ela tentou o homem e o desgraçou, resultando daí a expulsão do Paraíso. Ou seja, a boceta é culpada pelos males dos paus!

Ah, sim podemos dizer pau, sem problemas. Afinal, isso é coisa de homem, é coisa de macho. Não é palavrão! Começa que tem só 3 letras. Depois, pau é pau; é pedaço de madeira, antes de mais nada. Nem pode ser arrolado como nome feio, veja só!

Então o establishment machista fixou a coisa assim: pau pode, boceta não pode. Pau não é nome feio, boceta é nome feio. Pau não é palavrão, boceta é palavrão. E o pior é que fizeram as mulheres acreditar nisso! Ou seja, os cretinos machistas, que foram os que impuseram isso, vivem correndo atrás delas, quando não vai por bem vai por mal, e elas têm que acreditar que a coisa é feia, que é palavrão, que é inferior. Pois o Freud não inventou até a tal da inveja do pau, veja se pode! E as histéricas, lembram? Hister= útero. Psicologia machista, um portento do início do século passado. Que depois evoluiu, é justo reconhecer.

Então está na hora de encerrar este texto. O Aurélio não tem, mas ainda vai ter, a língua evolui. Não é palavrão, nem é nome feio. Na verdade, é Delta de Vênus, tem a beleza do desejado, fora a beleza anatômica em si. Então que as mulheres tenham orgulho de suas bocetas e parem de falar aquilo alilá em baixoxana, xoxota, periquita, pixirica e outros substitutivos que são, de um modo geral, palavras menos bonitas e soam mais como desculpas por serem portadoras de uma.

E não precisa falar vulva. É um nome mais sem graça ainda. Boceta tem vulva e vagina, é completa e é digna. E é bonita, como uma criação perfeita de Deus que é. Chega de hipocrisia! Fim de papo!

"Como é caro ser mulher" - Milton Maciel - 3a. edição, IDEL 2018 - 200 pgs)
https://amzn.to/2FeD7F5


                                                                       PANDORA

sexta-feira, 8 de março de 2019


MEU 8 DE MARÇO É PERMANENTE
MILTON MACIEL

     Minha homenagem às mulheres não tem nada a ver com o 8 de março. Ela é PERMANENTE. Nos meus romances publicados, somente três têm homens como protagonistas: Jacques Rosen, de “A Guerra de Jacques”, que já ganhou versão em francês; João Ramalho, de “João Ramalho no paraíso” e Ataliba de “Ataliba um paulistano feliz”.
     Em todos os demais, como se pode ver na foto, protagonistas são sempre mulheres. Lolita, em “Lolita de Aracaju, a mais jovem dona de bordel do mundo”; Ritinha e Gabi/Iracema, em “A Espera e a Noivinha”, que foi reescrito para a Amazon como “Escravizada” – são meus romances sobre o tema da prostituição infantil.
     Vérica, Kina, e Alana são as sacerdotisas celtas que, junto com a belíssima Ilduara (na verdade um eunuco ostrogodo), são as protagonistas que resolvem as grandes batalhas na Gália, durante a invasão dos hunos.
     A franzina Aline de Troyes é a jovem guerreira gaulesa que salva um legião romana da destruição pelo ataque dos alamanos. Um dos personagens é o general romano Flavio Jovino, o fundador de Joinville, em 354 AD.
     Larissa, que só não foi Miss Universo porque não quis, desfila sua beleza e sua transformação em líder e prefeita durante as 1088 páginas de “Lua Oculta”, onde muita gente é eliminada por dois serial killers. A impressionante Gládis de Rios, bailarina de flamenco e instrutora de autodefesa feminina, é sua coadjuvante e seu ídolo.
     Em “Os reflexos do peixe brilhante” é a professora aposentada sessentona Dahlia Riechelmann que resolve o mistério de um assassinato em Pirabeiraba.
    “Doutora Fumiko” é a jovem médica que volta do Japão aos 23 anos para tentar a reconciliação com seu avô na cidade de Bastos, SP. Um amor que vence o Não e a vida exorta.
     “A Princesinha quer dançar” conta em versos de poesia infantil a saga da princesa Samantha, quando seu rabugento pai proíbe a música e a dança em todo o reino.
     E a maravilhosa Leocádia, a “Negra Leocádia”, uma escrava, é a protagonista de um romance histórico no Rio de Janeiro colonial. Onde luzem também Tiradentes e a inconfidência mineira. E a revolução que tornou o Haiti a segunda nação independente das Américas. Leocádia ainda não foi publicada. Por incrível que pareça, aguarda ser libertada pelos portugueses. Desta vez, editores. Outra hora eu explico.
     “A Bela morde a fera” é a versão em português do precioso ensaio “Beauty bites beast”, de Ellen Snortland, na qual participo como editor e como autor do capítulo final, “O machismo oculto”.
     E “Como é caro ser mulher” é meu ensaio de economia feminista, que escrevi nos Estados Unidos e depois adaptei para o Brasil. Está em processo de tradução para lançamento em inglês, voltando a seu país de nascimento.

     Lolita é paulista de Brotas, morena de cabelos castanhos.
     Ritinha é loirinha e Gabi/Iracema é uma índia amazonense.
     As sacerdotisas celtas são ruivas muito altas.
     Aline, da cidade gaulesa de Troyes, é franzina e castanha.
     A Miss Amarante Larissa Silva é loirinha, descendente de italianos de Santa Catarina.
     Nossa professora Dahlia Riechelmann, de esfiapados cabelos brancos, é descendente direta de alemães.
     A Doutora Fumiko é nissei, está na cara.
     A princesinha Samantha, branquinha e vegana, tem cabelos modernos de cor variável, depende do mês.
     “A bela morde a fera” é um ensaio, mas escolhi para sua capa uma bela e forte guerreira africana.
    E nossa Leocádia é preta, pretíssima, brasileiríssima, filha de escravos iorubás trazidos para Bahia, mas vendida na infância para um senhor do Rio de Janeiro.
     Para terminar, a bela loira de “O filho da empregada” é uma transexual. Um menino seminarista que foge do seminário para seguir seu amante padre. Quando este é abatido por grileiros de terras, o jovem vai para a Itália e faz operação para mudança de sexo. Retorna ao Brasil para graduar-se em duas faculdades e acabar, aos 40 anos, como a Primeira Ministra do primeiro governo parlamentarista do Brasil. Faz um governo ímpar, limpa o país da corrupção, tem 90% de aprovação. É quando dois policiais corruptos da Polícia Federal descobrem que ela é (foi) homem! E que é o filho da empregada da casa onde eles cresceram. Podem ficar milionários com a revelação. E agora?

Minhas mulheres são de todas as cores e de todos os ...sexos. São as donas das minhas letras.

8/3/2019 (MM)