segunda-feira, 27 de abril de 2015

A PAZ NO SEU AMOR  
MILTON MACIEL

No aconchego macio do seu abraço,
Sob a luz de seus olhos, fiéis amantes,
Se dissolve em ternura meu cansaço,
Sei que amo você mais do que antes.
E eu exulto, vivendo essa benesse
Do amor que comigo amadurece.

Na maciez do seu corpo, que eu enlaço,
Para viver o melhor dos meus instantes,
Eu me abandono e, pedaço por pedaço,
Sorvo a doçura, quadrante por quadrante.
E eu agradeço, numa silenciosa prece,
Por um amor que com o tempo não fenece.

Neste mundo de quereres inconstantes,
Só você ocupa todo o meu espaço.
Só com você os meus sonhos satisfaço,
Pois sei que amo você mais do que antes.
Só você dissolve em mim qualquer estresse,
Meu coração recebe mais do que merece.


sábado, 25 de abril de 2015

NÃO JULGUE ANTES DE SABER 
MILTON MACIEL

– Tire a calcinha e deite !

A voz do homem careca era fria e imperiosa, dominadora. Lucy sabia que tinha que obedecer, não lhe restava qualquer alternativa, não tinha saída.

Viu a cabeça calva afundar entre suas coxas, sentiu o toque das mãos do homem lá, contraiu-se toda, preparou-se para o inevitável. Quando este veio, foi menos desconfortável do que ela esperava. Não opôs qualquer resistência. Com o coração em tumulto, esperou de olhos fechados, tensa, que o homem fizesse tudo o que queria fazer.

Quando enfim ele acabou, Lucy viu a cabeça calva erguer-se com um sorriso de vitória nos lábios.

– Pode relaxar, Dona Lucy. Parabéns, a senhora NÃO está grávida.

Lucy deu um grito, erguendo-se da mesa ginecológica com um único salto estabanado:

– Tem certeza, doutor?! Pelo amor de Deus, me diga que é verdade, eu não estou grávida mesmo?

– Claro que não, Dona Lucy. Acalme-se, se esse era todo o seu problema, ele não existe mais. Esse seu teste de farmácia é fajuto ou a senhora fez a coisa errada.

Como um raio Lucy enfiou a saia, apanhou a bolsa e... E então voltou-se e deu um beijo estalado naquela careca salvadora, fazendo o médico arregalar os olhos estupefato. Na pressa, esqueceu de botar a calcinha.

– Obrigada, doutor. Obrigada, obrigada. Meu anjo salvador!

Correu porta afora, deixou a clínica voando, saltou no automóvel, dirigiu em disparada, o coração mais acelerado que o motor do carro. Só então se deu conta que estava sem calcinha.

“Não estou grávida! Não estou! Não estou! Maldito teste de farmácia! Bem, pelo menos serviu pra mostrar o grande cafajeste que é o Sílvio. Desgraçado, tirou o corpo fora, me deixou na maior fria. Esse nunca mais põe as mãos, que dirá outra coisa, neste corpinho gostoso aqui. Acabou!”

Sim, que situação aquela em que ficara: como explicar uma gravidez para o marido estéril?

Suspirou aliviada. Aliviou também o pé no acelerador, começou a dirigir mais suavemente. Agora, enfim, estava conseguindo se acalmar. Filha da mãe aquele Sílvio, um amante de primeira, mas um homem de última. Covarde! Não quis assumir, deu no pé, queria que ela abortasse, não aceitou a proposta dela de viverem juntos, deixando ela do marido, o chato do Osório.

Agora estava sem um caso. Mas ela se conhecia, sabia que não seria por muito tempo. Como aguentar o panaca do Osório, sem ter um bom amante para ajudar?

Lembrou do Doutor Eurico, seu anjo salvador. Um homem calvo de meia idade, delgado, aparência máscula, voz dominadora... Imaginou aquela careca entrando entre suas coxas, mas de outra maneira muito mais gostosa. Sentiu um frêmito de excitação.

“Meu Deus, estou sem calcinha, não posso molhar minha saia branca! Preciso pensar noutra coisa.”

Pensou no Osório.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

O POETA E O GUASCA - Parte 9  - FINAL
MILTON MACIEL

Foi só então que aqueles dois
Perceberam, finalmente,
Que o tempo todo havia UMA
Maria Helena somente!

No sofá os dois sentaram,
por longo tempo silentes.
Para dentro de si olharam,
Dos seus dramas mais conscientes.
Dramas terríveis aqueles,
Brincava o destino com eles!

EPÍLOGO:

O mais estranho foi que, após alguns minutos de pensarem em si e na mulher que amavam, cada um deles passou a pensar no sofrimento do outro. Era-lhes fácil demais a empatia. Sofriam o mesmo padecer e cada um tinha a alma sensível de um poeta. E haviam gostado demais um do outro também. Após alguns minutos, sem nada falar, os dois levantaram quase ao mesmo tempo, olharam-se nos olhos, apertaram-se as mãos e depois, timidamente de início, aqueles dois homens se abraçaram. Discretas lágrimas chegaram aos olhos deles, sendo rapidamente limpadas.

Então o poeta carioca contou ao poeta gaúcho que Maria Helena, que se formava esse ano em Letras na PUC do Rio de Janeiro, era sua aluna. Que ele se apaixonara por ela há mais de dois anos, mas que ela fora bem clara com ele desde o começo: amava outro homem. Notou o quanto ouvir isso custava ao gaúcho, que empalidecia e crispava todo seu semblante: Então havia um terceiro, que ganhara o amor da musa de ambos.

O carioca andou até o ponto onde tinha sua valise e retirou de dentro dela um livro de sua autoria, que deu ao gaúcho. Ali, dobrada, guardava uma carta de Maria Helena. Segurou-a na mão, estendeu-a ao outro e voltou a falar:

– Aí dentro dessa carta está o nome do homem a quem ela ama. Vejo que você não quer olhar, mas insisto que leia, vai lhe fazer bem.

E o gaúcho leu:

“Meu querido amigo e professor:

Sei o que o senhor está sofrendo por minha culpa, acredite. Eu também amo alguém há muito tempo e o meu é também um amor sem esperança. Amo esse homem desde que nós éramos crianças e crescíamos juntos. Ele era o filho do capataz da nossa fazenda no Rio Grande. Depois eu fui estudar em Porto Alegre, mas voltava sempre à fazenda e nosso amor adolescente foi lindo.

Mas a vida se encarregou de nos separar. Meu amor virou capataz no lugar do pai que faleceu, parou de estudar ainda no nível ginasial e eu decidi fazer faculdade de Letras. E tomei a resolução mais difícil da minha vida: Deixei meu amor no Sul e praticamente me refugiei no Rio de Janeiro. Nosso dois mundos são irreconciliáveis. Ele nasceu e cresceu com a incumbência de ser um macho gaúcho. Eu sou uma formanda de Letras e sou uma feminista convicta, não aceitarei jamais um homem mandando em minha vida.  Quero ser professora e escritora, me tornar uma artista na literatura.

Meu querido quer ser capataz e estancieiro um dia, para isso sei que junta quase todo o dinheiro que ganha trabalhando para meu pai, que gosta demais dele. Eu também gosto demais dele, eu o amo profundamente, a tal ponto que não consigo namorar mais ninguém e que vou perder a grande oportunidade da minha vida, de ter um homem como o senhor como marido.

Me perdoe, não posso aceitar o seu pedido, sou honesta demais para enganá-lo ou para lhe dar falsas esperanças. Não pretendo voltar ao Rio Grande por muito tempo, não quero ver o único homem que amei e amo em minha vida. Por isso meu pai tem que vir ao Rio de Janeiro, se quer me ver. Temos esse apartamento no Leblon, é fácil para ele vir e ele vem com frequência, é viúvo desde muito antes de eu vir para cá.

Como o senhor sabe, também não aceito nada de dinheiro do meu pai. Já chega não ter que pagar aluguel no apartamento dele. Sou coerente com o que penso e vivo com o meu salário de revisora em jornais e editoras. É pouco, mas consigo sobreviver com dignidade e ter minhas contas rigorosamente em dia. Portanto, não é por dinheiro que não fico com o meu amor, mas porque, como lhe disse, nossos mundos são cultural e filosoficamente irreconciliáveis.

Suplico que o senhor me compreenda e aceite continuar meu grande amigo. Pode ter certeza que eu compreendo a sua dor, como tenho certeza que o senhor será capaz de compreender a minha. Ambos sofremos por amor, o senhor por amor a mim, eu por amor a Juvêncio.

Sua amiga reconhecida,
Maria Helena”

Quando terminou de ler a carta, o capataz e poeta Juvêncio tinha, sim, claras lágrimas nos olhos. Não conseguia falar, só sacudia a cabeça, incrédulo. Que coisa mais louca: eles eram três a sofrer por um amor impossível. Sim, Maria Helena tinha razão, seus mundos eram de fato inconciliáveis. Ela uma moça culta e rica. Ele um grosso sem luzes e sem educação. Era bom com bois, vacas, ovelhas, plantação e administração de bens e de pessoas. E daí?

Mas o poeta carioca não concordava com ele. Disse-lhe que viera ao sul exclusivamente para mostrar a carta de Maria Helena para o pai dela. E que o velho ficara chocado ao ver o sofrimento que vivia sua filha querida e única. Na hora falou ao professor carioca o quanto lhe ficava grato pelo gesto nobre de desprendimento e que iria imediatamente para o Rio. Faria Juvêncio seu sócio na fazenda e abençoaria o casamento de sua filha com ele.

Mas o professor lhe fez ver que isso não era a melhor coisa a fazer.

Dois dias depois do encontro dos dois homens ante a lareira, ambos embarcaram com o pai de Maria Helena para o Rio de Janeiro. O encontro de todos eles com ela foi comovente. Especialmente quando ela não pôde resistir e se atirou nos braços do seu amado, tremendo, num reencontro inesperado, depois de cinco anos de separação.

E Juvêncio ficou pela cidade. A seguir, com a orientação e os contatos do professor e a ajuda dos reais do fazendeiro, o gaiteiro gaúcho, poeta e compositor, foi lançado no mundo artístico gaúcho e brasileiro. Era bom demais, grande instrumentista, grande compositor, grande letrista, grande declamador. Foi sucesso instantâneo!

Hoje ocupa um dos lugares de maior destaque no cenário artístico nacional. Fatura alguns milhões por ano com shows e gravações. Um artista completo, como afirmou o professor naquele bendito primeiro dia!

Ah, o professor acabou se curando da paixão recolhida, casou com uma carioca legítima, mulata a rigor, e hoje é padrinho do primeiro filho do casal de amigos gaúchos. Vai com frequência ao Sul, para visitar a família em Porto Alegre, onde eles vivem e onde Maria Helena tem um programa de televisão e Juvêncio tem seu estúdio. E vai sempre visitar seu amigo fazendeiro. E ali vive insistindo com o novo capataz, dizendo que ele deve fazer seu menino mais velho aprender a tocar acordeon. 

É, parece que o moleque leva jeito...

terça-feira, 14 de abril de 2015

O POETA E O GUASCA – Parte 8   
MILTON MACIEL 
.......................................
“Maria Helena, você disse?!!
Esse é o nome de sua amada?”

“Sim meu patrão, esse mesmo,
Minha eterna namorada.”

“Pois também Maria Helena
É o nome da minha amada!

VIII

Só que a minha, como eu,
No Rio se estabeleceu.”

“Que cosa más engraçada,
Veja bem isso o senhor:
Do mesmo nome é chamada
Quem manda no nosso amor.”

“A minha mora no Rio
Na faculdade é minha aluna.”

“Também no Rio vive a minha,
É de olho azul e loirinha.
E a sua, como é que é?”

Deixe que eu lhe mostre, amigo,
Com esta poesia minha:

“Cerúleos reflexos, céus dolentes prometidos,
Preenchem órbitas de onde sempre estou ausente.
Escravo eu de promessas não cumpridas, distantes.
Esvoaçam fios de ouro, eu desespéro.
Enquanto o Redentor olha pra mim, indiferente.
E é como se eu ouvisse:
Ela ama outro! Ela ama outro!”

“Cue pucha, meu patrão,
Eu não entendi foi nada!”

“Não se importe, meu amigo,
Eu já esperava por isso.
Sempre acontece comigo,
O meu texto é denso e omisso.
E o que eu escrevo, é sabido,
Nem sempre será entendido.

Mas deixe que traduza eu,
Como se fosse em francês,
O que minha mão escreveu.
Neste estranho português:

Cerúleo é azul: os olhos dela,
órbitas, cor do céu, reflexos.
Eu ausente deles, dessa janela,
Onde reverbero versos desconexos.
Onde desespero e até o Cristo
me é indiferente.
Fios de ouro: o esvoçante cabelo.Loiro!”

"Bueno, entonces me parece
Que a sua, tal qual a minha,
Tem olho azul e é loirinha."

“Isso mesmo, amigo gaúcho!”

“Só que essa por quem padece,
Pela parte que le toca,
É uma loirinha carioca.”

“Mais coincidência, meu caro!
Veja, a coisa continua:
A minha Maria Helena
É gaúcha como a sua.
As duas vivem no Rio,
Não parece um desvario?”

“Ah, é gaúcha a sua também?
E de onde que ela vem?”

“Pois é aqui desta estância,
Da qual você é o capataz
Eu vim visitar o seu pai
Um gaúcho de importância
Que é o seu chefe... 
RAPAZ!!!... 
Então você é o Juvêncio!!!”

“Deus do Céu, BARBARIDADE!!!...”

Foi só então que aqueles dois
Perceberam, finalmente,
Que existia apenas UMA
Maria Helena. Somente!!!

No sofá os dois sentaram,
por longo tempo silentes.
Para dentro de si olharam,
De seus dramas mais conscientes.
Dramas terríveis aqueles,
Brincava o destino com eles!

Não era um destino qualquer:
Amavam a MESMA mulher!


CONTINUA...  Como o poema é ainda muito longo, vamos publicar, na sequência, somente um resumo em prosa da parte restante, Assim respeitamos o cansaço do leitor. (MM)

segunda-feira, 13 de abril de 2015

O POETA E O GUASCA – Parte 7 
MILTON MACIEL
................................................................
“Seja qual for o tormento que tua juventude suporta,
Deixa-a que se alargue, essa santa ferida
Que os negros serafins te fizeram no fundo do coração:
Nada nos torna tão grandes como uma grande dor.
Mas, sendo por ela atingido, não creias, ó poeta,
Que tua voz aqui embaixo deva permanecer muda.
Os mais desesperados são os cantos mais belos,
Conheço deles imortais que são puros soluços.” 
(Alfred de Musset)

VII

“Muito obrigado, meu patrão
Por se preocupar comigo
Facilitar a compreensão...
Esse é um gesto mui amigo!
Pois reconheço, afinal:
Sou pouco mais que um bagual.”

“Não é verdade, poeta,
Você é um artista de fato.
E a sua arte, completa,
Me deixou estupefato.
Por isso reconheci:
Você é mesmo um De Vigny.

Sorte minha que escutei
O seu canto solitário.
No mesmo instante pensei:
Que artista extraordinário!
E você foi o meu cantor,
Pois sofro da mesma dor.”

“Lhe agradeço, meu patrão
Vosmicê é bom demais.
Então, no seu coração,
Também hay os mesmos ais?
Uma ingrata le abandonô,
Como aquela que me deixô?” “

“Isso mesmo, camarada.
Sofro um amor impossível.
Por um outro apaixonada,
Ela é a mim insensível.
Pra minha infelicidade,
Só tenho dela amizade.”

“É cosa triste, sim senhor.
É duro não ser amado,
Quando a gente sente amor.
Mas, bah, é duro esse fado!
Há anos vivo essa sina,
Por causa dessa menina.

Se foi pro Rio de Janeiro
Cuidá da sua carreira.
Meu sonho ruiu por inteiro,
Minha vida se fez poeira.
Nunca disse se me amava,
Só que nós não combinava.

Nós fomo piazito junto,
Nós tava sempre colado.
Sempre a gente tinha assunto
Nós crescemo lado a lado.
E na escola da fazenda
Estudei com minha prenda.

Depois ela foi pra cidade
Pra continuá seus estudo
Eu sofri barbaridade,
Fiquei más quieto que um mudo.
Foi por causa dessa dona
Que aprendi a tocá cordeona.

Já que não sou de chorá,
É com a música que eu choro.
E aprendi, só, a versejá,
Que só por verso eu imploro.
Imploro na cantilena,
Que volte Maria Helena.”

“Maria Helena, você disse?!!
Esse é o nome de sua amada?”

“Sim meu patrão, esse mesmo,
Minha eterna namorada.”

“Pois também Maria Helena
É o nome da minha amada!
Só que a minha, como eu...”

CONTINUA AMANHÃ

sábado, 11 de abril de 2015

O POETA E O GUASCA – 6ª. parte  
MILTON MACIEL    (Figura: Alfred de Musset)
............................................ 
“Que nada, meu companheiro,
Eu sou é um grande chorão!
E a dor no meu coração
Eu berro pro mundo inteiro.
Eu confesso pra você:
Sou um Alfred de Musset!”

VI

“Outro Alfredo, meu patrão?
Também é poeta francês?
Ou quem sabe ele é talvez,
Poeta de outra nação?
Esse Alfredo Demissê
É bueno também por quê?”

“Sim, ele é francês também,
Poeta famoso e muito bom,
Mas verseja em outro tom,
Que, acho eu, não lhe convém.
Esse é um chorão como eu,
Mas nada ruim lhe aconteceu.”

A vida lhe foi mais mansa
Que a do outro Alfred poeta,
Quase uma festa completa,
Dessas que você não cansa.
Até a morte lhe sorrindo,
Pois ele morreu dormindo.

Mesmo assim foi um chorão,
Como se muito sofresse,
Sobre ele se abatesse
A desgraça, a solidão.
A causa do seu final?
Foi a bebida o seu mal.”

“Bueno, patrão, eu entendo
O que hay com certas pessoas:
Elas no fundo são boas,
Mas na vida vão sofrendo.
Sofrem mais com a realidade.
Têm mais sensibilidade.

A mesma dor que pra uns
É como um talho de facão,
Prá outros é só um beliscão,
Como as coisas mais comuns.
Estes soltam menos ais.
E aqueles... gemem demais.”

“Essa é a grande diferença
Entre Vigny e Musset.
Ora, certo está você,
Pra Musset a dor é imensa.
Musset sempre se atormenta,
E o estóico Vigny aguenta.

Deixe então eu lhe mostrar
A poesia de Musset,
Depois me diga você
O que ela lhe faz pensar.
Veja só este poema,
Gritar a dor é seu tema:

“Quel que soit le souci que ta jeunesse endure,
Laisse-la s'élargir, cette sainte blessure
Que les noirs séraphins t'ont faite au fond du cœur:
Rien ne nous rend si grands qu'une grande douleur.
Mais, pour en être atteint, ne crois pas, ô poète,
Que ta voix ici-bas doive rester muette.
Les plus désespérés sont les chants les plus beaux,
Et j'en sais d'immortels qui sont de purs sanglots. »

Deixe que eu traduza agora,
Fazendo uma adaptação,
Que agilize a compreensão
Pra quem é aqui de fora.
(Traduzir ao pé da letra
Nos leva a muita falseta):

“Seja qual for o tormento que tua juventude suporta,
Deixa-a que se alargue, essa santa ferida
Que os negros serafins te fizeram no fundo do coração:
Nada nos torna tão grandes como uma grande dor.
Mas, sendo por ela atingido, não creias, ó poeta,
Que tua voz aqui embaixo deva permanecer muda.
Os mais desesperados são os cantos mais belos,
Conheço deles imortais que são puros soluços.”


CONTINUA 2a. feira               Figura: Alfred de Musset