terça-feira, 30 de abril de 2013

RITINHA - 6    
MILTON  MACIEL

Final da parte 5:
– Iracema. Eu já lhe falei, mas acho que você ainda estava muito grogue da anestesia que a doutora lhe deu. Mas todos me chamam de Gabi. Olhe, deixa eu lhe dizer, ou melhor, prevenir: eu sou quenga, entendeu? Puta. Não é bom para você ser vista com gente como eu. Por isso, assim que você ficar melhor, eu vou sumir daqui e da sua vida, fique tranqüila. Mas enquanto você não estiver bem, eu não pretendo arredar pé deste quarto aqui. A doutora não só deixou, mas até me pediu para passar esta noite aqui, cuidando de você. Mas depois, ela lhe dando alta, eu vou sumir, tá?

   Fazendo um enorme esforço, Ritinha balançou a cabeça para os lados, querendo dizer que não. Mais uma vez forçou-se a falar:

– Não... vá... por ... fav...  – e adormeceu de novo.

PARTE 6
   Só despertou no dia seguinte, de tarde. Abriu os olhos procurando por Gabi. Ela continuava ali, sentada na cama, com carinha de sono e cansaço. Segurava o braço de Ritinha, procurando lhe dar uma posição mais confortável para aliviar a área ofendida pela agulha por onde a garota recebia soro continuamente. Gabi a recebeu com um sorriso exultante:

– Bem vinda, amiga. De volta à vida!

– Iracema... – balbuciou Ritinha – Você está aqui! Obrigada...

– Eu não falei que ficava? E tenho boas notícias. A doutora disse que fez você dormir com sedativos, fez você apagar para se recuperar e não pensar em nada. Você está dormindo faz um dia.

– Um dia?! Puxa, mas... Ai!

– Calma, menina, não tente se virar assim. Deixe que eu ajudo. Aposto que você quer fazer xixi, não é?

– É. Mas e a dor? Será que vai doer muito? Estou com medo...

– Espere aí que eu vou buscar a doutora. Ela me pediu para ir correndo atrás dela, assim que você acordasse. Mas, antes, deixe eu dizer uma coisa: você vai comigo, quando puder sair daqui. Eu fiquei sabendo de toda a sua história esta manhã. Não se fala outra coisa por aqui. Sei que você não tem para onde ir. Pois então vai comigo. Eu tenho um quartinho pequeno, a gente se ajeita por lá.

   Dias depois, quando Ritinha teve alta, Gabi a levou consigo para o seu pequeno quarto com banheiro, alugado nos fundos de uma casa de comércio, já à beira da rodovia. Como Ritinha não podia andar toda aquela distância, do Posto de Saúde até o quarto de Gabi, esta acertou uma corrida de táxi com um motorista. Quando chegaram, Gabi abriu a porta e ajudou a amiga a entrar. Pediu que sentasse na cama de casal, a única no aposento, e aguardasse um pouco, enquanto ela ia pagar a corrida. Ritinha lamentou-se:

– Puxa, Iracema, você vai gastar o seu dinheiro por minha causa, essa corrida deve ser tão cara!...

– Não, bobinha. Até que ficou barata, eu já vou dar um jeito. Fique tranqüila que eu não demoro.

   Demorou uns dez minutos, no entanto. Voltou com cara de contrariada:

– Ô velho difícil de gozar! Pensei que eu ia ter que ficar pagando a tarde inteira.

– Gozar?! Que dizer que você... Você teve que dar pra ele? Lá no táxi? Que horror!

– Dar coisa nenhuma, bobinha. Foi um outro negócio que eu fiz nele..

– Um o que?

– É, você ainda não sabe nada, mesmo. Mas vai aprender, eu explico tudo para você, pode deixar. É uma coisa que a gente faz no homem com a boca, outra hora eu explico. Agora vamos ver como a gente faz para se acomodar as duas na cama. E vamos ver alguma roupa para você.

– Ai, Iracema, eu não tenho nada, fugi com a roupa do corpo e ela estava toda rasgada e suja.

– E eu não sei? Eu mesma botei tudo no lixo, lá no posto. Eu não queria que você tivesse que ver uma só daquelas peças, iam ser uma péssima lembrança para você. Então eu saí pelo Posto de Saúde e pelas lojas do centro e pedi roupas para você. Mas foi a doutora quem mais ajudou. Trouxe esta sandália bonita e roupas que eram da filha dela, diz que regula com você em tamanho. As sandálias ela comprou. E eu consegui o que está nessa sacola, olha aqui!

– Meu Deus, Iracema! Quanta roupa! Você é demais! Obrigada.

– Ah, os filhos de uma égua não queriam dar, não. Mas algumas lojas acabaram colaborando. E estas peças melhores aqui – estas mais caras – bem, adivinhe como eu consegui? Dou um doce!

– Não vá me dizer que...  você teve que dar também?

– Adivinhou! Fui para dentro do provador com o dono da loja, ajoelhei e paguei o preço.

– Céus!... eu nem sei o que dizer. Você foi tão boa pra mim. Que seria de mim se você não tivesse me achado caída, me socorrido? E aí você me levou para o Posto, ficou lá todo o tempo comigo. Agora me trouxe pra sua casa. E ainda pagou táxi e roupas com... com... com esse tal de... como é mesmo o nome?
CONTINUA

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