segunda-feira, 1 de abril de 2013


O CERCO – 38   Novela histórica 
MILTON  MACIEL

Resumo do cap. 37 – Kyna convence o general romano Flávio Aécio a não combater os gépides. Ao mesmo tempo, manda Hilduara ao campo dos inimigos, para conversar com o rei dos gépides, Ardaric, que a conhece muito bem. Vinda da fortaleza e andando escondida, a moça ostrogoda chega ao acampamento fortificado vestida de homem huno, conseguindo assim atingir facilmente à tenda onde Ardaric se prepara para comandar seus homens. Ela então o convence a não lutar contra os romanos e a deixar o campo de batalha com os seus. E lhe revela que agora está a serviço da grande Deusa dos celtas, sendo aprendiz de sacerdotisa.

DESDOBRAMENTOS DE UMA BATALHA  (Novo mapa abaixo)

Ardaric, rei dos Gépides, teve uma rápida conferência com os seus comandantes de divisão. Contou-lhes como os hunos haviam tramado para que eles, caindo sob ataque dos francos ripuarianos, fizessem esses inimigos, até então ocultos na floresta, ter que revelar todo o efetivo de seus guerreiros.

Isso havia custado aos gépides 20% de seu exército. Quando os comandantes se convenceram que o rei estava falando a verdade, foram todos unânimes em concordar que, tendo sido traídos pelos hunos, não deviam mais a eles lealdade alguma. Ardaric os informou que os romanos também estavam mobilizados para um acordo tácito, facilitado pela sumo-sacerdotisa celta. Eles não atacariam os gépides, se estes não os atacassem antes.

Então decidiram todos, por unanimidade, que avançariam lentamente em direção aos romanos e depois, no momento certo, voltar-se-iam para a esquerda e chegariam rapidamente à Via Agripa, por onde, tomando o rumo sul, abandonariam as planícies catalaúnicas. Dessa forma deixariam de ser aliados dos hunos e dos ostrogodos e, automaticamente, estariam celebrando um acordo tácito de paz com romanos, visigodos, alanos, francos e burgúndios.

Os comandantes não deram essa informação de imediato a seus soldados. Colocaram todos em posição de batalha e, quando os hunos e ostrogodos avançaram celeremente em direção a seus respectivos inimigos, alanos e visigodos, os comandantes gépides e o rei Ardaric comandaram um avanço estranhamente lento, de que os soldados não conseguiam entender a razão.

Avançaram assim cerca de quinze minutos, observando que os romanos vinham para eles andando exatamente no mesmo ritmo muito lento. Estranharam também que o contingente romano fosse minúsculo, formado apenas por umas poucas centúrias. O grosso do exército havia ficado parado na retaguarda.

Quando os dois exércitos estavam a menos de cento e vinte metros um do outro, Ardaric fez um aceno de mão para o chefe romano mais adiantado. Este retribuiu o gesto, como se fizesse uma saudação amistosa. Nesse momento, Ardaric ordenou a paralisação de suas tropas e o centurião romano fez a mesma coisa do outro lado.

Então Ardaric deitou uma rápida fala para grupo que lhe estava próximo e cada comandante de regimento fez a mesma coisa com os seus comandados. Minutos depois todo o exército gépide prorrompia num só grito de exultação: estavam livres da guerra, não tinham mais que enfrentar o mais terrível de todos os inimigos, a legião romana! Voltariam ilesos para casa.

Era evidente que os romanos haviam aceito o acordo facilitado pela sacerdotisa celta, porque o ridículo contingente que estava ali estacionado, a pouco mais de cem metros deles, não tinha sequer cinco manípulos, não chegava a inteirar nem mesmo uma cohorte, era um pífia fração de uma legião romana. Podiam, portanto, voltar-se para a estrada e abandonar o campo de batalha tranquilamente. Os malditos hunos que se arranjassem sem eles!

E foi o que Ardaric ordenou a todos que fizessem. Voltaram-se para a esquerda, e começaram a avançar, desta vez em marcha aceleradissima, em direção à Via Agripa. O rei fez um último aceno de mão para o centurião romano e este, retribuindo-o, comandou o imediato retorno de sua tropa para a retaguarda. 

Enquanto cortavam o campo da planície catalaúnica perpendicularmente à estrada, os gépides puderam apreciar de longe a grande aglomeração dos hunos que avançavam rápidos em direção aos alanos. Viram que estes haviam fugido para o sul e os hunos os perseguiam agora. E viram quando a legião romana em massa saiu no encalço deles, colhendo-os pela retaguarda e pelo flanco direito. De fato, sem ter que se ocupar com os gépides, os romanos estavam inteiramente livres para se dedicarem à guerra aos hunos.

Átila acabava de ser colhido entre as garras de uma tenaz! Os gépides viram que não haveria forma alguma através da qual os hunos pudesse se safar do torniquete que essa tenaz estabelecia sobre eles. Átila estava derrotado! E, consequentemente, incapaz de qualquer represália contra os gépides que o haviam abandonado em plena batalha.

Um pouco mais perto da estrada, viram o outro entrevero maciço, o dos ostrogodos, que haviam avançado contra os visigodos. Estes os haviam praticamente esperado, tendo avançado muito menos no campo.

Foi a coisa mais fácil para os milhares de gépides passarem praticamente despercebidos, longe ainda das retaguardas dos grupos engalfinhados em combate. E neles, mesmo que alguém chegasse a vislumbrar aquela estranha marcha de milhares de homens pela planície e pala estrada, nada poderia fazer, uma vez que, naquele momento, única coisa que importava era lutar pela própria pele.

Para Ardaric e seus gépides, a guerra tinha terminado. Trotando em seu cavalo ao longo da grande estrada, em direção ao sul, já tendo deixado ao longe o grande campo de batalha, o rei dos gépides tinha o coração cheio e alegria e de gratidão. Alegria por ter podido, milagrosamente, salvar todos os seus homens de um destino atroz nas mãos dos romanos. Milhares dos seus retornariam a seus lares, suas famílias, seus trabalhos. Gratidão infinita àquelas duas mulheres abençoadas, responsáveis pelo milagre: a sumo-sacerdotisa Kyna e sua aprendiz, a futura sacerdotisa Hilduara.

Com a retirada dos gépides, o exército romano ficou literalmente “sobrando”, com o que foi fácil desbaratar completamente as forças dos hunos. Dois grandes campos de batalha se formaram na planície naquela tarde:

1 – HUNOS contra todos: alanos, romanos, francos ripuarianos, burgúndios e alguns visigodos

2 – OSTROGODOS contra visigodos e francos salianos – os da cidadela, chefiados por Meroveu e Armosic.

CONTINUA: A Morte Não Poupa os Francos. Os Visigodos Perdem Seu Rei.




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