segunda-feira, 15 de abril de 2013

A NOIVINHA – 10 - Conclusão  
MILTON MACIEL

Final da parte 9
– Em João Boto?! Não me diga que você já encontrou o desgraçado, Dito! É verdade ou eu, muito burra, entendi tudo errado?

– Verdade, sim. Nós já incontremo o desinfeliz i já demo um jeito nele. Esse num incomoda mais ninguém. Num tem mais pirigo di fazê mal a essa aí o a mais ninhuma outra.

– Quer dizer que vocês mataram o animal?! – Marta não cabia em si de surpresa e contentamento – O maldito tá morto?! Capado?

– Capado, sim. Morto, não. Ainda não.

PARTE 10

E então Timbó desatou a falar, no seu palavreado lento, gutural. Contou toda a história da noivinha, falou dos filhos que vieram com ele, do acerto feito com Zé Bode e o sargento. E terminou por fazer uma recomendação a Marta:

– Carece di mecê fazê uma visitinha ao sargento, num sabe? Fale em meu nome i faça uma visita à noivinha. Mecê vai si sinti di alma lavada, ah, si vai! Pena qui ocês vieram si acoitá nesta fazenda i não pudero vê tudo qui o povo da cidade viu.

– Ah, nem me diga! Como que eu queria estar lá pra ver o amaldiçoado vestido de noiva, com a bunda exposta, as coisas capadas fora, de atadura. Mas o que eu queria mais ver é esse nojento experimentando o seu próprio veneno, sendo estuprado pelos presos todos! Ah, mas que coisa mais bem feita, Dito! Deus bendiga e proteja você, Deus lhe pague! Eu sempre lhe estimei demais, Dito Timbó, nunca me esqueci de você, mas agora eu posso dizer e vou dizer pra todo o povo ouvir: eu tenho é orgulho de ter uma filha com Dito Timbó! Como eu tenho orgulho de ter deitado e emprenhado de um homem como você, Dito. Eu tenho esta outra menina e tenho os dois meninos gêmeos, menorezinhos, que estão brincando lá nos fundo agora, tudo de pai diferente. Mas ter uma cria sua, Dito Timbó, me deixa cheia de orgulho, sim senhor!

   Aquele palavreado bonito, sincero, emocionado da mulher abalou Dito profundamente. Nesse momento ele teve certeza total de que Marta falava a verdade: Ritinha só podia, de fato, ser filha dele! Aquilo tudo era novo e diferente para aquele homem duro e seco. Emoções esquisitas, diferentes daquelas que ele mais apreciava, como quando estava escondido numa tocaia ou como quando via o encomendado tombar por terra com seu tiro certeiro.

  Então era certo que Ritinha era filha sua, saída dos seus ovos, sem dúvida. Que pena que agora fosse uma puta, vergonha da família, que não desse para fazer mais nada por ela.    Mas a esta Manuela, ele haveria de dar um amparo, assim expiava sua culpa pela desgraça da outra, da qual não estivera próximo para proteger da desgraça. Nunca fizera nada por nenhuma filha mulher. Pois agora iria fazer por uma que, ironia, nem filha sua era. Pela filha verdadeira nada mais podia fazer, era uma puta de rua agora.

  Dito Timbó contemplava a mulher à sua frente. Quantos anos devia ter agora? Uns trinta, no máximo. Ela era bem novinha quando se deitara com ele, uns onze anos atrás. Daquele chamego havia nascido Ritinha, sua filha quenguinha. Marta ainda era uma mulher muito bonita. Delgada, pequena, delicada. Lembrava-se de como ela o havia impressionado muito com sua aparência de fragilidade, como se fosse quebrar ao ser tocada. E, ao mesmo tempo, tinha um gênio tão bom, tão divertida que ela era. O tipo da mulher que podia fazer um homem comum muito feliz. Um homem comum, é claro, não um pistoleiro matador como ele.

Matador não pode ter família, sempre existe o perigo de tirarem vingança em cima dos familiares dele. Por essa razão, Dito Timbó nunca deixava que nenhum xodó durasse mais do que uns poucos dias, semanas no máximo, quando a mulher era muito especial. Assim tinha sido com Marta. Por isso, quando Bastião lhe deu a notícia da carta, não teve dificuldade alguma em lembrar quem era aquela Marta. E agora, premido pelas novas emoções, tomou uma resolução extrema:

– Acho qui mecê pricisa di uma nova chance di começá tudo di novo. Tô disposto a le dá essa chance. Cate seus fio e seus teréns e venha s’imbora comigo. Eu tenho uma casa boa lá em Missão Velha, na roça, tá carecendo di uma mulerzinha assim qui nem ocê pra tomá conta dela. Aí a gente cuida dessa mocinha aqui. Sabendo qui ela é fia di Dito Timbó, home ninhum nunca vai tê corage di atentá contra ela.

   Comovida, Marta tomou a mão de Dito, cobriu-a de beijos e lágrimas. Era sua forma de dizer que sim. Depois passou a mão a Manuela. A bênça, painho! – e Manuela se fez Timbó.

FIM DO CAPÍTULO "A NOIVINHA" 
2o. capítulo do livro A ESPERA E A NOIVINHA - MILTON MACIEL - IDEL - S.PAULO
O livro pode ser obtido através do e-mail:    delphos09@terra.com.br 

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