domingo, 14 de abril de 2013


QUEM  NOS HÁ DE LER – 3a. parte 
MILTON  MACIEL

E NO BRASIL, COMO FICAMOS?
 (ver gráficos abaixo, no fim do artigo)

A situação no Brasil é sui generis e merece uma análise à parte. Aqui a trajetória do e-book seguirá um caminho mais íngreme. Porque existe uma enorme demanda reprimida para livros em geral e os editores podem contar com o aumento do número de leitores para livros de papel pelos próximos anos. E, com as componentes físicas e psicológicas (vícios de comportamento comercial do Brasil Colônia) que ocasionam o malfadado “custo Brasil”, muitas empresas que entraram no segmento de e-books o fizeram também para garantir a venda de seus estoques de livros impressos.

Ou seja, manobrando de forma que os preços dos e-books fiquem muito altos e baixando preços de livros físicos, elas podem garantir uma sobrevida para este mercado, coisa que, lá fora, já não é mais possível fazer. Há vários casos de distorções absurdas no Brasil, onde o preço do e-book é mais alto que o do livro impresso correspondente. No site de uma livraria, eu vi o e-book a 42 reais (!!!) e o mesmo livro, impresso, a 19 reais. É evidente a intenção da manobra. Isso implicará forçosamente num avanço mais lento do e-book no Brasil.

Contudo esse é um processo artificial e não-sustentável. Essas grandes empresas, inclusive a própria Amazon do Brasil, terão apenas um tempo limitado para usá-lo. Esse procedimento, no meu entender, pode deixar os editores de livros de papel relativamente tranqüilos no Brasil, dá-lhes uma espécie de sobrevida, por algo da ordem de até sete anos, não mais. Depois, será o mesmo que está acontecendo nos EUA, com os livreiros sendo as primeiras vítimas.

Um outro fenômeno, típica e lamentavelmente bem brasileiro, pode ser também observado: muitos empresários entraram no negócio exclusivo de e-books, porém com os velhos vícios comerciais brasileiros, dos quais o pior é a ganância da ilusão do 100% de lucro. As empresas, de um modo geral pequenas no seu início, adotam comportamentos idênticos aos dos editores tradicionais de livros impressos, quando a realidade dos custos para uns e outros é completamente diferente. E acabam se tornando, também, empecilhos ao deslanchar mais acelerado do livro eletrônico no Brasil.

Contudo também esse tipo de abordagem ao mercado do e-book tem seus dias contados. Hoje em dia ficou muito fácil organizar lojas eletrônicas e divulgá-las amplamente pelas infovias. Qualquer um pode fazê-lo. Autores e grupos de autores se organizam, dominam a conversão e-pub (arquivos de texto convencional, como .doc (word) ou PDF convertidos em arquivos que os dispositivos e softwares de leitura de e-book podem entender). E, em seguida, entram no mercado, com orientação de profissionais de marketing, competindo para valer com as empresas mais gananciosas de e-books e, também, com os setores de livros eletrônicos das grandes redes de livrarias.

À medida que os bons autores consigam se comunicar com seus nichos específicos de leitores, eles passarão a viver – e muito bem – de suas vendas diretas ou de vendas feitas através de livrarias virtuais “alternativas”, tanto faz se eles vendem e-books ou livros físicos. Mas recomendo que aprendam desde cedo a dar preferência ao e-book, para entregar um produto muito mais bem elaborado a seu leitor, por uma fração do preço do livro impresso convencional.

Eu mesmo passei por essa revolução, após estudar mercado editorial de livros físicos e eletrônicos nos Estados Unidos, durante os últimos quatro anos. Com consequência passei a construir uma plataforma que me permite viver do que escrevo sem depender mais de editoras e livrarias, deixando-me a liberdade de optar por usá-las ou não em cada caso específico. O blog onde os leitores estão lendo este texto agora é uma das peças importantes dessa plataforma, que tem diversos outros recursos envolvidos em sua montagem.

Isso, que eu aprendi com escritores que já o fazem há anos nos EUA, na Europa e na Austrália, pode evidentemente ser feito por um enorme número de autores, a ponto de criar realmente uma via alternativa de peso no mercado do livro. E isso, sem dúvida, já conta, lá fora, como um impacto a mais sobre o faturamento de editoras de porte e de redes como a Barnes and Noble.

Tenho ensinado o uso desses recursos regularmente, em seminários sobre marketing de livros físicos e eletrônicos. E tenho tido o imenso prazer de implantá-los como plataforma também para clientes para os quais atuo como ghost writer (escritor-fantasma, aquele que escreve e some como um bom gasparzinho, não aparecendo jamais como autor)

Nos EUA, na Amazon o número de títulos vendidos como e-book já ultrapassou o de títulos vendidos como impressos em 2011. Se incluirmos todos os outros concorrentes da Amazon, as estimativas é que esse ultrapassar se dê, no TODO do mercado americano, em mais um par de anos. Alguns setores atingirão essa marca antes, principalmente o de ficção e, certamente, o de livros didáticos, os tais livros para crianças que só lêem em tablets.

DEMANDA REPRIMIDA POR LIVROS NO BRASIL

Afirmei acima que essa demanda existe. Vou me dedicar amostrá-la agora. Para isso apanhei um gráfico numa publicação e fiz mais dois. Neles se mostra que o brasileiro médio lê MUITO menos que seus equivalentes argentinos, chilenos e uruguaios. Quais as razões? Em primeiro lugar as culturais é óbvio, pois basta ler ali que temos 15% de analfabetismo ainda, contra 3 ou 2% de nuestros vecinos. Mas isso é só um número e diz muito pouco, pois nós temos que considerar que podemos facilmente chegar ao dobro disso, se considerarmos o analfabetismo FUNCIONAL – aqueles que mal e mal sabem ler e assinar o nome, mas que são incapazes totalmente de leitura mais interpretação – ou seja, em termos técnicos, têm alfabetização mas não têm LETRAMENTO.

Isso se comprova por pesquisas como as da FIPE e do Instituto Pró-Livro, que delimitam o potencial do mercado brasileiro de leitores em 80 milhões de pessoas. Isso quer dizer uns míseros 40 POR CENTO da população. E diz também que, à medida que a governança brasileira se torne capaz de acreditar que o investimento mais importante de todos é em Educação e EDUCADORES, o mercado de leitores potencias tem tudo para explodir.

Mas, enquanto isso não acontece, enquanto um sacrificado professor acaba tendo que sobreviver com um salário de fome que é cerca de apenas um centésimo do que custa ao país um reles deputado federal (e existem 513 dessas ‘coisas’ neste país caolho, consumindo mais de 800 milhões por ano, um descalabro absoluto!), então essa multiplicação será apenas vegetativa e não explodirá jamais.

Por outro lado, dentro do universo potencial de 80 milhões de leitores (duas Argentinas, cinco Chiles, 23 Uruguais) a grande maioria NÃO PODE COMPRAR LIVROS regularmente. Não tem poder aquisitivo para isso! O livro brasileiro, limitado a tiragens pequenas pela exigüidade do mercado que pode pagar por ele, tem preço alto demais. E, como se não bastasse, em cima disso ainda temos a lamentável cabeça-de-porco do salafrário “custo Brasil”. Um círculo vicioso viciado!

Contudo, para esses leitores ávidos de ler e impedidos de fazê-lo pelo alto custo do livro físico, há uma luz no fim do túnel: o e-book! Mas só depois que o espírito-de-porco de muitos empresários, que são agora donos da produção e distribuição de e-books, deixe de ser aliado da cabeça-de-porco do incompetente “custo Brasil”. O que é só uma questão de tempo e acontecerá. Irrecorrívelmente!












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