MILTON
MACIEL
E NO
BRASIL, COMO FICAMOS?
(ver gráficos abaixo, no fim do artigo)
A situação no Brasil é sui generis e merece uma análise à parte. Aqui a trajetória do
e-book seguirá um caminho mais íngreme. Porque existe uma enorme demanda
reprimida para livros em geral e os editores podem contar com o aumento do
número de leitores para livros de papel pelos próximos anos. E, com as
componentes físicas e psicológicas (vícios
de comportamento comercial do Brasil Colônia) que ocasionam o malfadado
“custo Brasil”, muitas empresas que entraram no segmento de e-books o fizeram
também para garantir a venda de seus estoques de livros impressos.
Ou seja, manobrando de forma que os preços
dos e-books fiquem muito altos e baixando preços de livros físicos, elas podem
garantir uma sobrevida para este mercado, coisa que, lá fora, já não é mais
possível fazer. Há vários casos de distorções absurdas no Brasil, onde o preço
do e-book é mais alto que o do livro impresso correspondente. No site de uma
livraria, eu vi o e-book a 42 reais (!!!) e o mesmo livro, impresso, a 19
reais. É evidente a intenção da manobra. Isso implicará forçosamente num avanço
mais lento do e-book no Brasil.
Contudo esse é um processo artificial e
não-sustentável. Essas grandes empresas, inclusive a própria Amazon do Brasil,
terão apenas um tempo limitado para usá-lo. Esse procedimento, no meu entender,
pode deixar os editores de livros de papel relativamente tranqüilos no Brasil, dá-lhes
uma espécie de sobrevida, por algo da ordem de até sete anos, não mais. Depois,
será o mesmo que está acontecendo nos EUA, com os livreiros sendo as primeiras
vítimas.
Um outro fenômeno, típica e lamentavelmente
bem brasileiro, pode ser também observado: muitos empresários entraram no
negócio exclusivo de e-books, porém com os velhos vícios comerciais
brasileiros, dos quais o pior é a ganância da ilusão do 100% de lucro. As
empresas, de um modo geral pequenas no seu início, adotam comportamentos
idênticos aos dos editores tradicionais de livros impressos, quando a realidade
dos custos para uns e outros é completamente diferente. E acabam se tornando,
também, empecilhos ao deslanchar mais acelerado do livro eletrônico no Brasil.
Contudo também esse tipo de abordagem ao
mercado do e-book tem seus dias contados. Hoje em dia ficou muito fácil
organizar lojas eletrônicas e divulgá-las amplamente pelas infovias. Qualquer
um pode fazê-lo. Autores e grupos de autores se organizam, dominam a conversão
e-pub (arquivos de texto convencional, como .doc
(word) ou PDF convertidos em arquivos que os dispositivos e softwares de
leitura de e-book podem entender). E, em seguida, entram no mercado, com
orientação de profissionais de marketing, competindo para valer com as empresas
mais gananciosas de e-books e, também, com os setores de livros eletrônicos das
grandes redes de livrarias.
À medida que os bons autores consigam se
comunicar com seus nichos específicos de leitores, eles passarão a viver – e
muito bem – de suas vendas diretas ou de vendas feitas através de livrarias
virtuais “alternativas”, tanto faz se eles vendem e-books ou livros físicos. Mas
recomendo que aprendam desde cedo a dar preferência ao e-book, para entregar um
produto muito mais bem elaborado a seu leitor, por uma fração do preço do livro
impresso convencional.
Eu mesmo passei por essa revolução, após
estudar mercado editorial de livros físicos e eletrônicos nos Estados Unidos,
durante os últimos quatro anos. Com consequência passei a construir uma plataforma que me permite viver do que
escrevo sem depender mais de editoras e livrarias, deixando-me a liberdade de
optar por usá-las ou não em cada caso específico. O blog onde os leitores estão
lendo este texto agora é uma das peças importantes dessa plataforma, que tem
diversos outros recursos envolvidos em sua montagem.
Isso, que eu aprendi com escritores que já
o fazem há anos nos EUA, na Europa e na Austrália, pode evidentemente ser feito
por um enorme número de autores, a ponto de criar realmente uma via alternativa
de peso no mercado do livro. E isso, sem dúvida, já conta, lá fora, como um
impacto a mais sobre o faturamento de editoras de porte e de redes como a
Barnes and Noble.
Tenho ensinado o uso desses recursos
regularmente, em seminários sobre marketing de livros físicos e eletrônicos. E
tenho tido o imenso prazer de implantá-los como plataforma também para clientes
para os quais atuo como ghost writer
(escritor-fantasma, aquele que escreve e some como um bom gasparzinho, não
aparecendo jamais como autor)
Nos EUA, na Amazon o número de títulos
vendidos como e-book já ultrapassou o de títulos vendidos como impressos em
2011. Se incluirmos todos os outros concorrentes da Amazon, as estimativas é
que esse ultrapassar se dê, no TODO do mercado americano, em mais um par de
anos. Alguns setores atingirão essa marca antes, principalmente o de ficção e,
certamente, o de livros didáticos, os tais livros para crianças que só lêem em
tablets.
DEMANDA
REPRIMIDA POR LIVROS NO BRASIL
Afirmei acima que essa demanda existe. Vou
me dedicar amostrá-la agora. Para isso apanhei um gráfico numa publicação e fiz
mais dois. Neles se mostra que o brasileiro médio lê MUITO menos que seus
equivalentes argentinos, chilenos e uruguaios. Quais as razões? Em primeiro
lugar as culturais é óbvio, pois basta ler ali que temos 15% de analfabetismo
ainda, contra 3 ou 2% de nuestros vecinos.
Mas isso é só um número e diz muito pouco, pois nós temos que considerar que
podemos facilmente chegar ao dobro disso, se considerarmos o analfabetismo
FUNCIONAL – aqueles que mal e mal sabem ler e assinar o nome, mas que são
incapazes totalmente de leitura mais
interpretação – ou seja, em termos técnicos, têm alfabetização mas não têm
LETRAMENTO.
Isso se comprova por pesquisas como as da
FIPE e do Instituto Pró-Livro, que delimitam o potencial do mercado brasileiro
de leitores em 80 milhões de pessoas. Isso quer dizer uns míseros 40 POR CENTO
da população. E diz também que, à medida que a governança brasileira se torne
capaz de acreditar que o investimento mais importante de todos é em Educação e EDUCADORES,
o mercado de leitores potencias tem tudo para explodir.
Mas, enquanto isso não acontece, enquanto
um sacrificado professor acaba tendo que sobreviver com um salário de fome que
é cerca de apenas um centésimo do que custa ao país um reles deputado federal
(e existem 513 dessas ‘coisas’ neste país caolho, consumindo mais de 800
milhões por ano, um descalabro absoluto!), então essa multiplicação será apenas
vegetativa e não explodirá jamais.
Por outro lado, dentro do universo
potencial de 80 milhões de leitores (duas Argentinas, cinco Chiles, 23
Uruguais) a grande maioria NÃO PODE COMPRAR LIVROS regularmente. Não tem poder
aquisitivo para isso! O livro brasileiro, limitado a tiragens pequenas pela
exigüidade do mercado que pode pagar por ele, tem preço alto demais. E, como se
não bastasse, em cima disso ainda temos a lamentável cabeça-de-porco do salafrário
“custo Brasil”. Um círculo vicioso viciado!
Contudo, para esses leitores ávidos de ler
e impedidos de fazê-lo pelo alto custo do livro físico, há uma luz no fim do
túnel: o e-book! Mas só depois que o espírito-de-porco de muitos empresários,
que são agora donos da produção e distribuição de e-books, deixe de ser aliado da cabeça-de-porco do incompetente “custo Brasil”. O que é só uma questão de
tempo e acontecerá. Irrecorrívelmente!
Nenhum comentário:
Postar um comentário