MILTON MACIEL
Final da parte 5 - – E a acusação qual é? – perguntou o sargento, mais à vontade, tentando mostrar sua autoridade e seu conhecimento da lei.
Bastião perdeu a paciência com a ousadia do homenzinho.
– Ora, ora,
mecê num si faça di ingraçadinho! Intão num sabe o qui esse fio duma égua
disgramado feiz, não?!
– Sei! Sei!
Sei!! Sei, sim, seu moço, não se exalte! Eu sei, sim, perguntei por perguntar,
é dever do meu ofício, sabe? Afinal, estou no lugar do Dr. Delegado. Mas eu
sei, ele comeu os tampos de um menina de menor, tem que ser preso mesmo.
– Minina essa
qui acuntece di sê nossa parenta, num sabe? – foi a vez de Jeremias encarar o
sargento com cara de poucos amigos.
– Sim, sim,
eu fiquei sabendo de tudo. Por favor, os senhores sentem aqui, que eu vou
providenciar os documentos para lavrar a prisão do mequetrefe agora mesmo.
– Num carece,
seu sargento delegado – afirmou o filho mais novo. – Isso o sinhô faiz dispois.
Agora nóis qué vê é a cela dos prisionero. Quantos home tem preso hoje aqui?
– Bem, o
senhor compreende, não é? A gente só tem uma cela e tem preso demais nela. Eu
peço desculpas se não vou poder colocar o prisioneiro de vocês numa cela só
dele – e o sargento se desculpava em mil mesuras.
– Ara, ara,
mas quem é qui qué uma cela só pro bandido? Pois si nóis tá aqui é pra bota ele
na jaula cum os otro preso, si é!
– Ah, os
senhores querem que ele fique na mesma cela com os outros? Ah, bom, nesse caso,
não tem problema nenhum.
E o esperto sargento começou a rir. Estava
entendendo qual era a intenção dos Timbó. Agora ficava claro porque o tinham
trazido ali, vestido daquele jeito, de noiva.
Osmar, o artífice por trás da luminosa idéia,
tomou a si a condução da cerimônia nupcial que se seguiu:
– Pois nóis
tem aqui a noivinha prá casá. Mas o sinhô ainda não disse quantos são os marido
dela qui istão na cela.
– Ah, mas são
seis homens, seu moço. Será que esse número é bom para a sua idéia?
Osmar olhou para os parentes, viu os olhos de
João Boto se arregalarem ainda mais, puro cagaço!
– É, acho qui
tá bom pra começá. Pois intão vamo levá a noivinha pra casa dela!
O sargento abriu a porta de grade, retirando
o grosso cadeado. Os outros presos olharam a cena surpresos, mas começaram logo
a rir, ao reconhecer João Boto naquelas roupas de noiva. Aí reconheceram Dito
Timbó e perderam a vontade de rir. Ficou a curiosidade. Osmar sentenciou:
– Ói qui
filicidade pr’ocês esta tarde: Ocês tá tudo na mão faiz um tempão, mais agora
nóis tá trazendo pr’ocês uma noivinha – e empurrou João Boto para dentro da
cela, onde os outros homens o receberam com gargalhadas, beliscões no traseiro
desnudo e tudo o mais a que uma noivinha tinha direito na tarde gloriosa de
suas núpcias com seus maridos.
Que
Dona Flor, que nada! Gulosa, a noivinha ia encarar logo seis maridos, todos de uma só vez.
Sargento Elias ria às bandeiras despregadas.
Dobrava-se de tanto rir, chegava a perder a fala e a respiração, os olhos
cheios de lágrimas. Sim, senhor! Quando é que ia poder imaginar uma coisa
assim, tão insólita? Pois não é que um jagunço, um jagunço que era o mais
famoso e o mais temido matador de toda a região, lhe trazia aquele desordeiro
ali, pronto para ser preso? Um matador – aliás, um não, quatro ao todo – bandido matador dando uma de policial, prendendo
bandido descabaçador e fazendo entrega em domicílio, direto na delegacia, mas
que mundo era esse, meu Deus?! O que mais faltava inventarem?!
Pois a resposta estava ali mesmo: bandido
doutor, fazendo castrar cirurgicamente bandido estuprador, com cuidados e
requintes de assepsia. Mais essa, Senhor! E a execução final do plano, então:
tirar as calças do homem (homem?), vesti-lo de noiva, desfilar com ele pela
cidade e, por fim, entregá-lo como noivinha a seis maridos de má catadura,
prisioneiros eviden-temente famintos de mulher.
CONTINUA
CONTINUA
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