quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013


O CERCO – 16  Novela Histórica 
MILTON  MACIEL 

Resumo do cap - 15 – Vérica retorna para o alojamento das sacerdotisas triunfante e feliz com sua iniciação sexual com Meroveu, que deixou exaurido e desacordado. Kyna a espera com uma infusão que impede que uma mulher engravide. Depois sua mãe e sua avó lhe dizem como se comportar com Meroveu nos próximos dias. Alana começa a mostrar a Vérica que é possível adquirir domínio sobre a energia sexual descontrolada. E Kyna vai tratar Meroveu, caso contrário ele pode ficar desacordado por até dois dias.

O INSIDIOSO INIMIGO (e suas surpresas)

Assim que conseguiu se aquietar e debelar um pouco o fogaréu de desejo que ardia em sua natureza intensa e inquieta, Vérica lembrou que tinha um assunto muito delicado e sério a discutir com suas colegas. Pois foi só então, já depois de meio dia, que ela literalmente caiu em si e conseguiu se desligar um pouco da incrível experiência daquela madrugada e manhã. E começou a se sentir culpada por ter deixado de lado um assunto tão importante.

Então, assim que Kyna regressou dos aposentos de Meroveu, depois de tê-lo medicado longamente, Vérica dirigiu-se às duas sacerdotisas:

– Avó, Mãe, eu tenho um revelação grave para fazer a vocês. Com a euforia do que me aconteceu esta manhã, acabei esquecendo e isso não é bom.

– Humm... Traição! Sim, isso é muito grave mesmo, criança.

– Sim, Avó, vejo que, como sempre, não é preciso gastar muitas palavras com vocês.

– Não é preciso mesmo, minha filha. Sua avó e eu temos a visão também para isso. Assim como você, também. Afinal, a cena que nós estamos vendo agora, só o estamos fazendo porque você teve a visão dessas duas mulheres primeiro.

– Isso mesmo, Alana. Mas vamos tratar de dar mais nitidez a essa visão. Vamos usar a água sagrada. Criança, prepare o tripé.

– Imediatamente, Avó!

Poucos minutos depois as três sacerdotisas, reunidas ao redor do tripé, viram a superfície da água sagrada turvar-se e o vapor começar a subir turbilhonante. Em questão de segundos as imagens de três mulheres começaram a se formar, cada vez mais nítidas. Então, tal qual aparecera para Vérica fugazmente, a cena das duas mulheres mais jovens com os soldados, os dois que estavam de sentinela na muralha norte, voltou a se desenrolar com  nitidez e profusão de detalhes, no meio do vapor.

Efetivamente as mulheres haviam seduzido os soldados ainda antes que eles subissem para suas posições na muralha. Depois, infringindo o regulamento, os dois homens as receberam na calada da noite. As mulheres lhes levaram vinho e rapidamente se desnudaram e fizeram amor com eles, ali mesmo dentro das ameias. Quando o vinho com narcótico terminou de fazer efeito, coisa de meia hora aproximadamente, cada mulher apunhalou pelas costas o homem que havia atendido. Depois, em conjunto, juntaram suas forças e arremessaram um homem de cada vez do alto da muralha. A razão de usarem tanta força foi procurar precipitá-los o mais afastados da muralha que pudessem, para que os corpos não caíssem no fosso da muralha, onde fariam muito barulho ao atingirem a água. Caindo depois do fosso, a grande camada de capim gigante amorteceria a queda e o ruído seria muito menor.

As três sacerdotisas deixaram que os vapores se dissipassem e que a água se acalmasse. Então focalizaram suas mentes na superfície agora tranqüila, que funcionava nessas condições como um espelho perfeito. Confirmaram no espelho a visão do rosto de cada uma das mulheres, agora uma de cada vez, detidamente, para que pudessem fixar na mente cada um dos mínimos detalhes do que viam. As três mulheres estavam completamente identificadas. Bastaria agora que as procurassem no meio da população civil.

A terceira mulher, que parecia mais velha, deixou as sacerdotisas celtas um tanto perplexas. Não havia dúvida que as primeiras duas mulheres assassinas eram visigodas. Mas a terceira, que identificaram como a cabeça pensante do grupo, surpreendeu-as plenamente. Primeiro porque ela era HUNA. E segundo, porque ela era ELE! E terceiro porque ele era um...

– Um eunuco! – a exclamou Vérica, excitada – E é um huno!

– Criado pelos hunos, Vérica. Mas foi uma criança dos ostrogodos. Foi escravizado e feito eunuco quando criança. Serviu aos hunos como servo e como objeto sexual. Foi criado para ser mulher. E aprendeu um pouco das feitiçarias rudimentares dos hunos. Não chega a ser perigoso nesse campo, mas se torna perigoso porque sua mente foi dominada totalmente por seu tutor, que me parece não ser huno, mas romano. Hoje ele age como um fanático e um assassino.

– Devemos eliminá-lo imediatamente, mãe. Cortar o mal pela raiz. Vamos procurá-lo já? 

– Não, Alana, minha filha. Sinto que devemos agir com mais cautela com essa criatura. E que devemos deixá-lo com uma certa liberdade de ação, para que possamos nos inteirar de sua maneira de agir, seus contatos externos e...

– Contatos externos, avó?! Esse homem é um espião que consegue se comunicar com os hunos lá fora?

– Certamente que sim, menina. Como acha que eles combinaram o ataque que nos abortamos na noite  passada? Aliás, que você abortou, pois foi você que os viu antes que atacassem e foi você que os botou para correr com suas flechas gigantes.

– Ah, sim, eu! E onde fica o fogo grego de vocês, suas danadas?

– Bom está certo: Suas flechas e nosso fogo! Mas foi sua sensibilidade e intuição que nos salvaram a todos das flechas incendiárias dos hunos, que poderiam ter causado um terrível estrago nesta fortaleza. O mais importante foi você tê-los pressentido antes e visto depois, na escuridão da noite.

– E graças à sua raiva e à sua cabeça-quente, sua desmiolada. Foi isso que nos salvou, afinal. Se você não tivesse corrido feito uma louca para a floresta, não teria voltado de lá no tempo certo de descobrir a presença dos hunos. Bendita esse sua cabeça de fogo grego, minha filha!

– Está vendo, Mãe! E Avó! Nem sempre esta menina explosiva e cabeça-quente está errada!

– Minha filha, você vai aprender, quando a maturidade lhe chegar, que a cabeça-quente está SEMPRE errada. O que aconteceu é que a Deusa testou você, sabendo qual seria sua reação previsível, isto é, de maluca. E ele a fez retornar na hora certa para que você pressentisse e visse os inimigos avançando. E isso nos salvou de um grave problema na fortaleza.

– Então foi a Deusa?!... – E Vérica arregalou os olhos, enquanto pensava na informação que a avó lhe passara nesse instante. Foi Alana quem lhe respondeu:

– Sim, minha filha, você não deixou sequer que nós a consolássemos, partiu como um raio dizendo que não ousássemos segui-la. E, nessa reação de raiva e descontrole fulminantes, você deixou de ouvir toda a instrução que a Deusa nos deu, durante a consulta que lhe fizemos. Se nos tivesse ouvido civilizadamente, não teria passado por um terço do sofrimento que passou.

– Mas... mas como assim, Mãe? O que mais havia para eu saber?

– Mais tarde sua mãe e eu lhe diremos tudo, se você não sair correndo para o mato de novo. Mas agora temos que voltar ao nosso trabalho com as mulheres visigodas e o eunuco ostrogodo dos hunos.

As três voltaram a sentar ao redor do tripé. Kyna tomou da vareta, aspergiu, da água sagrada, finas gotas sobre as vestimentas de cada uma das três sacerdotisas e todas retomaram a concentração ritualística por mais meia hora.

Quando terminaram, Kyna foi a primeira a falar:

– Pobre menino! Os hunos transformaram uma alma boa num fanático assassino. Mas eu lhes digo que isso é muito mais um acorrentamento mental do que maldade propriamente dita. Ele age por patriotismo e age impulsionado para o mal pela mente perversa que o controla. Pois nós vamos agir de uma maneira diferente com essa criatura. Não vamos eliminá-lo. Vamos curá-lo e libertá-lo de seus grilhões mentais. E então vamos ver como agirá sua verdadeira natureza.

– Mas isso não é perigoso, Avó?

– Perigoso é quase tudo na vida, minha querida. Não é isso o que importa. Mas agora vamos sair, sim, para localizar as três pessoas. Só não vamos fazer nada ainda. Nós precisamos que todas elas pensem que sua ação não foi ainda percebida.

– E os corpos das sentinelas que elas jogaram no capinzal rente ao fosso? Logo, logo eles serão descobertos. Assim que os soldados começarem a ter um mínimo de organização e comando, eles vão procurar pelas sentinelas, responsabilizando-as pela não descoberta dos hunos.

– Só que não vão encontrar os corpos, não é mãe?

– Não, filha. Nesta manhã, enquanto todo mundo descia atabalhoadamente para combater o incêndio, as nossas amigas terminaram seu trabalho.

– Sim! Sim, Avó, agora eu posso ver também. Elas os jogaram no fosso, com pedras amarradas para submergi-los. As duas mulheres e um homem mais alto, que as ajudou. Ué, quem será essa quarta personagem?

– Ora, é a terceira personagem, criança. O nosso eunuco vestido de homem.

– Ah, então é assim que ele se disfarça!

– Sim, filha, um homem comum no meio dos outros. Temos quase mil civis aqui dentro. Ele pode se apresentar como quiser: camponês, servo, comerciante, qualquer coisa que não exija uma aparência muito máscula, como seria forçoso num soldado, por exemplo.

– Então, Mãe, o que temos que observar é duas mulheres entre todas as outras e um homem entre todos os outros?

– Sim, querida. E nós os reconheceremos com toda a facilidade, não é?

– Claro que sim, Mãe. Eu jamais esquecerei essas três fisionomias.

– Pois então vamos, minhas filhas. Já é hora de localizarmos essas três pessoas. Mas não esqueçam que nós podemos identificá-las facilmente, mas elas não podem perceber, em momento algum, que foram descobertas por nós. Sejam, portanto, discretíssimas. Ah, a propósito, para que lado vocês acham que devemos ir?

– Muralha leste! – foi a resposta simultânea, em uníssono, de Alana e Vérica, que, já na porta, voltaram-se para a direção escolhida. Kyna, com um sorriso de satisfação, limitou-se a segui-las. Mas se retardou um pouquinho, enquanto seu sorriso passava da satisfação para o enigmático, e ela pensava: Ah, essas jovens! Ainda têm tanto que aprender!...
E lhes falou então:

– Vão na frente, preciso dar mais uma olhada no rei Meroveu. Logo depois eu as alcanço em frente a muralha leste, mais exatamente na fonte de água, não é? É ali que você sabem que vão encontrar as duas mulheres. Estou certa?

– Certíssima , Avó! – e as duas saíram sorrindo, de braços dados, andando celeremente em direção à fonte.

Kyna esperou que elas sumissem de vista, voltou ao alojamento e destrancou a porta. Depois, deixando-a assim, visivelmente destrancada saiu andando calmamente pela rua. Ao cabo dos primeiros duzentos metros, deteve-se e ficou encostada à parede do estábulo dos cavalos. Não tinha dúvida nenhuma: um vulto escondido atrás de uma coluna de trabalho a estava observando no momento em que ela havia saído.

A sumo-sacerdotisa ficou esperando calmamente até que sentiu que era o momento certo de voltar a se movimentar. Então caminhou devagar de volta ao alojamento. Quando chegou, a porta estava fechada. E a pessoa que esperava estava lá dentro. Kyna abriu a porta lentamente, sem fazer qualquer ruído e entrou. O homem alto, de cabelos negros cacheados, que estava abaixado remexendo seus antigos documentos egípcios, não a percebeu. Kyna deu mais dois passos e falou:

– Ermanaric, eu o esperava, seja bem-vindo.

O homem levou um susto enorme. Ergueu-se tremendo visivelmente e encarou a grande sacerdotisa. Era uma criatura de uma beleza impressionante. Seu rosto tinha traços delicados e perfeitos, que caberiam bem tanto em um rosto feminino quanto num masculino. Os olhos eram negros e densos, os cabelos se espalhavam em cacho pretos de rara perfeição e simetria, que caiam naturalmente sobre seu ombros. O corpo era esguio e rijo e, sob a túnica de caimento justo, parecia muito mais feminino que masculino. No nariz delicado, de ponta afilada, as duas narinas pulsavam rápidas, traduzindo o nervosismo de que estava tomado. E não era para menos: ninguém, mas ninguém mesmo que estivesse vivo hoje sabia que a bela mulher huna Hilduara tinha um dia sido chamada, quando ainda era um menino muito pequeno, pelo nome ostrogodo de Ermanaric.

Kyna percebeu o estado tenso do homem – ou mulher – à beira de ter um desmaio. Adiantou-se mais alguns metros e ajudou-o a sentar num banco forrado. Então retirou de um bolso interno, em sua veste sacerdotal, um pequeno frasco e aproximou-o do nariz de Ermanaric. Este teve um estremecimento e pareceu voltar à consciência plena, o que lhe permitiu dirigir-se à sacerdotisa:

– Como... como sabe? Como pode saber? Há trinta anos não tenho mais esse nome... – e precisou parar, novamente, para conseguir respirar.

– Trinta anos atrás transformaram você na menina Hilduara.

Ermanaric/Hilduara nada disse. Apenas baixou a cabeça e começou a chorar 

CONTINUA

AS RE-DONZELAS 
MILTON MACIEL 

Ataliba caminhava decidido e a sua decisão mais assente era que não iria trabalhar naquela quinta-feira, por respeito a um grande santo, cuja efeméride seria comemorada na segunda seguinte, quando seria feriado. Como pode um bom cristão trabalhar em uma quinta-feira, se na segunda seguinte tem feriado religioso importante? Falta de respeito da grossa, de piedade, de compostura!

Santo que merece feriado não é qualquer santinho do pau oco, é santo dos grandes, elevada hierarquia, potestade do céu. Como não se sentir desfeiteado o santo, se as pessoas não se compõem, não se preparam desde cedo para ao grande dia? E olha que santo afrontado pode ser muito perigoso. Não só não concede mais nada, mas se aborrece de vez e não deixa nenhuma súplica do vivente chegar ao céu, que dirá ser atendida. Uma desgraça...

Pois bem, Ataliba fazia a sua parte. Pouco se lhe dava se os outros não fizessem as deles. Feriado de santo na segunda? Pois ele se adiantava e entrava em preparação desde hoje, noite de quinta, de lua cheia, de ar oloroso, de morna brisa. Contrição de verdadeiro temente, de cristão de fé. Fé em que santo, mesmo?

Bem, isso não vinha muito ao caso, como é que ele ia saber? Ataliba não era um homem religioso, não entrava em igreja, não tomava bênção a padre. O que ele gostava mesmo era de feriado. Para Ataliba qualquer feriado já era um dia santificado. Imagina então se fosse um dia de santo no duro! Ou seria de uma santa? Bem podia ser, afinal Ataliba não sabia mesmo o nome da excelsa criatura.

Ora, mas aqui um acinte à lógica se estabelece. A bem da verdade, temos que reconhecê-lo, o fato de Ataliba decidir não trabalhar nesta particular quinta-feira nada tinha de especial ou de novo. Afinal, se medirmos em quintas-feiras, Ataliba não trabalhava nesta, nem na que passou, nem nas últimas 936 quintas-feiras. Como o ano só tem 52 delas, isso perfaz exatamente 18 anos. Que é o tempo que Ataliba vive sem trabalhar.

– Opa, sem trabalhar não! Sem ter emprego ou ofício fixo, isso sim. Mas sem trabalhar, não!

Está certo, está certo, seja quem for que reclamou. Estamos escorregando sobre a verdade, falha nossa, cabeça insensível para as sutilezas do trabalho benemérito, ainda que inconstante e esporádico, do nosso herói.

Bem, mas como fica a coisa, então? Ataliba não trabalha mas... trabalha? Que raio de ocupação misteriosa é essa sua? Devagar como o andor, porque há muita sutiliza em jogo, muitos são, na verdade, os ofícios que mestre Ataliba sabe exercer, quando precisa ganhar algum. O da sedução, por exemplo, para citar apenas o primeiro dos seus honestos afazeres de muita responsabilidade.

Mas, de novo, estamos vendo as coisas – e as rotulando – com nossa pobre ótica de cientistas formais, não compatível com a genialidade do nosso personagem. Sedução, dizemos nós.

Sedução um cacete! – diria Ataliba – Solidariedade! Solidariedade com S bem maiúsculo – E a explicação que ele dá encerra toda a lógica deste mundo:

– Ora, você vê uma coroa caidaça, com ar de cachorro pidão, solitária que ninguém mais ousa passar nos peitos sabe-se lá há quanto tempo. Quem vai lhe fazer a fineza, o benefício? Quem vai lhe esquentar a cama gelada de solteirona, viúva ou divorciada? Quem vai lhe dar do bem-bom com que brincar, regalar os olhos, as mãos, a boca, fazer reverdecer a desperseguida já madura e chocha, quem sabe descobrir tardiamente o regalo de virar do outro lado?

Pois para toda essa verborragia desatada de perguntas, a resposta é uma só: Ataliba Robério das Mercês

– Este vosso criado!

Ah, coerente este Ataliba! Um criado do amor, um serviçal solícito, sempre pronto a fazer felizes suas virgens redonzelas.

Redonzelas?!!

Sim, para nosso filósofo das ruas paulistanas, as mulheres maduras desamadas tornam-se novamente donzelas. Redonzelas, portanto. Criam um cabaço novo, renascido na alma, o pior de todos os cabaços, duríssimo. Difícil de tirar, exige grande perícia, muita tática, maior técnica, indizível cortesia, incansável carinho, incomparável paciência.

Paciência, já sabemos, Ataliba tem de sobra. Toda a paciência do mundo, a paciência dos que não têm pressa, dos que não têm obrigações nem compromissos e, não os tendo, desconhecem a tirania dos cronogramas e nem mesmo relógio usam ou olham por aí. Ora, para que perguntar que horas são? Coisa mais sem sentido!

Afinal, para um verdadeiro Mestre da Vida, como nosso herói Ataliba, tempo é aquilo que você sente por dentro, tempo é algo de que você é o dono, de que você dispõe como melhor que aprouver e convier. Ataliba não é escravo do tempo e, consequentemente, de seus esbirros, os relógios, que trazem todos os outros paulistanos atropelados, angustiados, esmagados entre suas engrenagens dentadas, suíças; ou eletrônicas, chinesas.

Não, para o Sábio o tempo existe para servi-lo, constitui-se num servo muito bom, ao invés de um amo muito mau, como o é para o comum das criaturas.

Quanto a técnicas, táticas, cortesias... Bem, o melhor é ouvir algumas das próprias interessadas, das suas redonzelas redivivas, milagres de Lázaro do amor que Ataliba distribui generosamente, em profusão, às mãos-cheias. Ouçamos, por exemplo, a renomada manicure Nezinha do Brás:

“ Dívida de gratidão, seu moço, dívida difícil de pagar. Nem tudo o que eu fizer chega para retribuir o bem que ele me fez. Olhe, eu estava praticamente morta, morta por dentro, sabe? Eu estava resignada a virar uma velha, me sentindo moça por dentro, desencantada de tudo, desiludida de homem, descrente da vida. Ah, eu lhe digo, moço, que não tem coisa mais triste, mais murcha, do que mulher mal-amada. Para mim agora é Deus no céu e Santo Ataliba na Terra, meu salvador!”

Ou a respeitada Solange Sacoleira, comerciante internacional de maravilhas de paraguaia procedência:

“Que coração de ouro! E outras... coisas, também. Para mim, foi a diferença entre a morte e a vida. Me fez voltar a viver, será que é pouco?

Extraído de “ATALIBA, UM PAULISTANO FELIZ” –  Milton Maciel, IDEL 2009


quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013


O CERCO  – 15    Novela Histórica
MILTON  MACIEL 

Resumo do cáp. 14 – Depois de sua impressionante performance com o arco e as flechas com o fogo grego, Vérica se refugia numa das ameias da muralha sul. Lá passa da extrema irritação com Meroveu ao extremo desejo sexual por ele. Então ela decide que está na hora de sua iniciação e entra nos aposentos de Meroveu, Os dois desnudos, ela o faz desempenhar o papel do gamo-rei celta e tudo acontece sob sua condução. A sacerdotisa e a Deusa vão cavalgar o gamo até deixá-lo exausto e sem sentidos.

VÉRICA E O GAMO-REI

A jovem sacerdotisa Vérica manteve o controle total sobre os atos de sua iniciação sexual, do começo ao fim Instruiu Meroveu a comportar-se de uma forma obediente e passiva, a repetir com ela palavras sagradas e a proceder à semelhança do gamo-rei celta, segundo as mais rigorosas tradições iniciáticas, tanto quanto um franco poderia fazê-lo, isto é, canhestramente. Depois, quando partiu para os movimentos físicos, manteve-se o tempo todo em cima dele.

No momento culminante, quando recitando uma torrente de frases mágicas, ela conduziu aquela que seria a sua primeira penetração, sua consciência se bipartiu. Participando consciente de tudo e tudo sentindo, ao mesmo tempo ela dava passagem à própria Deusa, que vinha desfrutar daquele momento único e mágico com sua sacerdotisa. O gamo-rei foi então cavalgado por uma mulher e por uma Deusa, privilégio que poucos homens podiam ter na Terra. 

Por quase duas horas, a mulher e a Deusa se revezaram sobre Meroveu, o novo gamo-rei. E enquanto isso aconteceu, ele, sem poder entender de onde lhe vinha tanta força, manteve-se permanentemente ereto. E, cada vez que o corpo de Vérica estremecia em devastadores orgasmos, que quase a faziam desmaiar, o gamo-rei sentia esvair-se abundantemente dentro dela, tirando energia e material de uma origem completamente inexplicável para ele. Quando do último arranco da cavalgada, que levou Vérica ao último grito de prazer, Meroveu se viu completamente esgotado. Ficou num estado semi-letárgico, sem força alguma para mover sequer os braços e as pernas. Um resquício de consciência o mantinha ainda acordado e participante de uma experiência única, como jamais havia imaginado pudesse acontecer em sua vida.

E, com esse resto de consciência, ele avaliou que nunca, em todos os seus inúmeros casos com mulheres, vivenciara algo assim. Nunca tivera múltiplos orgasmos, coisa que sabia ser muito fácil para as mulheres e impossível para os homens por óbvias razões. Contudo, a cada vez que sua parceira vivera a plenitude do gozo, ele também a vivera e isso era totalmente impossível de compreender. Nenhuma mulher, por mais experiente que fosse, mesmo cortesãs, havia feito amor com ele com tanta perícia e intensidade. Com tanta profundidade, podia dizer também. Mas aquela quase menina, virgem e inexperiente, superara todas elas em tudo. Meroveu viveu uma espécie de êxtase, uma profunda comoção e uma sensação de que saía do nível terreno para chegar ao campo do divino. Nessas cogitações estava, sem condições de sequer abrir os olhos, quando o sono o dominou completamente.

Meroveu sentiu-se primeiro afundar como que para dentro da cama, depois foi como se seu corpo começasse a flutuar e a subir. Abaixo de si, a uns dois metros, podia ver seu mesmo corpo, igualmente nu, imóvel sobre a cama. Então todo o ambiente foi inundado por uma luz branca e intensa, que o envolveu como se fosse ofuscá-lo. E, subitamente, à sua frente, Meroveu viu, pela primeira vez na vida, o rosto resplandecente da Deusa. Imediatamente sentiu-se cair vertiginosamente na cama, integrando-se de novo ao corpo, que estava em estado de completo torpor, de desmaio total. Todo e qualquer resquício de consciência esvaiu-se completamente. Aquela havia sido sua grande prova. Poderia ter morrido ali. Mas era forte e havia agradado à Deusa. Sobreviveu.

Vérica, em pé ao lado da cama, já composta com sua túnica sacerdotal, a tudo assistiu calada. Quando percebeu o desmaio do rei, deixou o aposento e caminhou calmamente para o alojamento das sacerdotisas. Sim, estava realizada! E por sua própria iniciativa. Finalmente estava livre da vergonha de ser uma virgem.

E a experiência havia sido maravilhosa. Nada que, nem de longe, se assemelhasse a uma dor. Pelo contrário, sentira somente prazer, uma onda de vários ciclos sucessivos de um prazer imenso, arrebatador, enlouquecedor. Desmanchara-se em gozos. Desde o primeiro instante, quando começara a contemplar o corpo do macho nu. E depois, quando tomara em suas mãos aquelas partes dele que ela não conhecia. E, finalmente, quando as usara e direcionara para dentro de seu próprio corpo, então o tempo todo havia oscilado entre o maravilhoso e o enlouquecedor.

Caminhava contente, sentindo-se leve como uma pluma, feliz, inteiramente feliz pela primeira vez em muitos anos. Agora era uma mulher como as outras! Nenhuma delas, a partir de agora, a poderia olhar com desdém pelas costas, por sabê-la ainda virgem. Livrara-se para sempre de sua incômoda e vergonhosa virgindade e, ao mesmo tempo, fizera-o transformando aquele franco tosco, momentaneamente, no sucedâneo de um gamo-rei. Assim, ela o havia deflorado também. Com certeza, esta fora para ele uma experiência de iniciação sexual, tanto quanto o fora para ela. Mesmo sendo um rústico, um mero homem franco, ele não poderia deixar de sentir todas as sensações e conseqüências de fazer amor com a própria Deusa. Estava contente que ele tivesse sobrevivido. Ela havia gostado demais dos jogos do amor e agora haveria de forçar o seu gamo-rei a servi-la muitas e muitas vezes. Por dia, se ele agüentasse!

Aquilo era imensamente melhor do que o que conseguia por conta própria, com suas mãos e sua imaginação. Era inimaginável, só mesmo vivendo a plenitude do que vivera para poder aquilatar isso agora. Não, não podia mais pensar em eliminar Meroveu. Agora entendia que precisava dele. E precisava tão ardentemente que, enquanto caminhava, veio-lhe o desejo de retroceder e tornar a montar nele por muito mais tempo. Mas, reconheceu, Meroveu estava completamente fora de combate, sem sentidos e, muito provavelmente não recobraria a consciência por muitas e muitas horas.

Vérica cogitou se isso não levaria o pânico aos seus homens. Provavelmente seria melhor que ela ou uma de suas parentas o fosse tratar em seguida. Mas logo reconheceu que ela não seria a pessoa indicada. Se o visse ali, novamente nu à sua disposição, não pensaria duas vezes e, se o revivesse, seria apenas para forçá-lo a se submeter de novo à sua enorme vontade de sexo. E isso poderia colocar a saúde e até mesmo a vida dele em risco. Pediria ajuda a Avó.

Quando entrou nos aposentos das sacerdotisas, não as encontrou dormindo, como imaginara. Sua mãe, que orava ante a efígie da Deusa, levantou-se e veio acolhê-la entre os braços. Com um longo beijo, Alana lhe disse:

– Bem vinda, irmã e filha. Agora você é inteiramente uma de nós.

Kyna surgiu, radiosa de felicidade, da outra peça da habitação, com um cálice fumegante nas mãos. Levou-o à altura dos lábios de Vérica e disse:

– Tome, criança. Neste momento você precisa desta infusão. Não é vontade sua, muito menos o é da Deusa, que você fique grávida agora. Seu gamo-rei não foi um legítimo gamo celta e não pode, por isso, levá-la a conceber, já na primeira injeção do líquido da vida, uma filha para ser sacerdotisa da Deusa, como sua continuadora.

Vérica sorveu, encantada, todo o conteúdo quente do cálice de uma só vez. Ah, como era bom que existissem Kyna e Alana em sua vida! Quem mais podia entendê-la completamente, ler seus pensamentos e desnudar sua alma, como aquela duas mulheres maravilhosas? Como era bom saber que não poderia jamais ter segredos para com elas. E, enquanto as olhava com os olhos umedecidos pela comoção, o reconhecimento e a gratidão, pensou se algum dia seria capaz de amar outra criatura no mundo como amava aquelas duas mulheres divinas à sua frente. Alana lhe respondeu aos pensamentos:

– E nós amamos também você demais, nossa divina criança – que hoje se fez mulher.

– Sim, SE fez, literalmente –  disse Kyna, rindo divertida – Aposto que o seu gamo rei não deve ter tido mais iniciativa do que um saco de cevada.

E todas prorromperam numa gostosa gargalhada. Vérica se sentia triunfante, uma mulher, não mais um virgem inútil! Estava orgulhosa de si, feliz demais consigo mesma, com sua iniciativa, com sua capacidade de conduzir com perfeição toda uma longa vivência para a qual não tinha a menor experiência prévia. Alana, contudo, após alguns minutos, em que a deixou saborear mais um pouco os louros da vitória, falou-lhe:

– Bem, bem, mocinha, agora chega. Vá tomar um banho outra vez, não a queremos por aqui com cheiro de macho. Eu vou com você, tenho que lhe ensinar algumas coisas a respeito de como você vai se higienizar a partir de hoje. E como vai se livrar dessas coisas que os homens vão esguichar dentro de você. Aliás, se depender de você agora, pobre Meroveu!

– É mesmo, filha. Essa aí vai transformar o pobre gamo franco numa constante cavalgadura. E, por falar em Meroveu, já vou indo tratar dele, senão o coitado não acorda nem hoje e nem amanhã. Quando a Deusa faz amor com um homem, se não o leva à morte por exaustão completa, pode deixá-lo inerte por dois ou mais dias. Já imaginou o efeito disso sobre o moral das tropas francas? Vou restituí-lo de volta à vida o mais rápido que eu puder, ainda hoje com certeza.

– Ah, mãe, é melhor que capriche ainda mais nos sortilégios e nas poções, reforce bem o homem, porque esta aqui, com todo o fogo que tem, agora que aprendeu o caminho da cama do rei, pode exauri-lo tanto ou mais do que a Deusa. Pobre Meroveu! Eu e que não queria estar na sua pele!

E as sacerdotisas mãe e avó prorromperam em nova gargalhada, enquanto Vérica se sentiu corar energicamente. Depois deu de ombros. Ora, aquela duas! Sabiam de tudo, sabiam que era verdade mesmo!

Outra trégua inesperada

Os dois dias que se seguiram foram isentos de combates. Tanto para os francos quanto para Meroveu.

Para os francos, porque os hunos estavam em estado de choque, aparvalhados com a nova arma mortífera dos francos, aquele terrível fogo branco que viajava nas flechas gigantes da mulher inimiga e se espalhava velozmente, provocando explosões e incêndios devastadores. Se uma só pessoa do inimigo, uma mulher ainda por cima, podia provocar tanto estrago, o que não aconteceria quando muitos, senão a totalidade, dos arqueiros francos os atacassem com flechas incendiárias daquele mesmo horrível tipo desconhecido?

Para Meroveu, foram dois dias de trégua porque Kyna e Alana foram taxativas. Como sacerdotisas da Deusa, usaram sua autoridade para proibir Vérica de se aproximar sequer do homem em convalescença. Não conseguiriam se impor se fossem apenas a mãe e a avó da moça, conheciam Vérica de sobra e seu caráter forte e intempestivo. Quando queria uma coisa!...

Mas eram sacerdotisas, eram suas superiores hierárquicas e, contra isso, não havia nada que a jovem pudesse fazer. Teve que ficar se roendo de desejo e de impaciência, com aquele conhecido fogo a consumi-la agora com muito mais intensidade. Foi preciso que Alana passasse com ela praticamente o mesmo número de horas que Kyna estava passando com Meroveu, para restaurar no rei a consciência e um mínimo de forças, que lhe permitissem se locomover com relativa autonomia.

Nessas horas Alana ficou literalmente doutrinando Vérica a respeito do controle das energias sexuais, da imensa força que elas representavam, da sua capacidade de transmutação e elevação, com o que uma iniciada podia adquirir poderes extraordinários. Explicou-lhe que muito da força que ela e Kyna dispunham era proveniente dessa transmutação. Que elas tinham aprendido as técnicas de autocontrole e que tinham tido que dominar seus próprios impulsos ardentes de desejo.

– Vérica, minha filha, minha irmã na Deusa: todas nós já passamos por isso, por esse deslumbramento, essa sofreguidão aparentemente incontrolável, esse desejo de macho e dos gozos imensos que eles nos podem proporcionar, quando devidamente domados e usados para nosso prazer. É realmente algo incomparável. Mas isso não é tudo, minha filha. Existe muito mais prazer a conquistar, mas dentro da alma, não somente no corpo. Esse prazer só vem quando você se torna capaz de AMAR um homem de verdade. Então o foco do prazer se desloca do corpo para o espírito e o gozo é ainda maior, incomparavelmente maior, porém não mais vinculado à sensação física de orgasmo. Isso certamente lhe irá acontecer um dia, assim como aconteceu para Kyna e para mim. Porém não pode acontecer com nossos gamos-reis da iniciação. A esses nós apenas os usamos, para que eles nos deflorem e nos engravidem de nossas meninas sacerdotisas e nos proporcionem prazeres incomparáveis. E também os usa a própria Deusa, como você descobriu hoje. Mas nós nunca amamos nossos gamos-reis. Porém amamos depois um ou mais homens, ao longo de nossa vida, mesmo quando já ultrapassamos a idade de setenta anos. Você vai ver tudo isso acontecendo em sua vida.

– Mas, mãe, isso quer dizer que eu não vou poder desfrutar do meu gamo como estou pensando? Vou ser proibida?

– Não, minha filha, nós não somos tão insensíveis assim. Também nós já passamos por essa fase de arrebatamento e explosão, de descoberta do prazer extremo que nos pode dar um homem viril e submisso. Nós podemos extrair todos os deleites deles e você vai poder fazer o mesmo com o gamo que conquistou. Só que isso vai ter que ter um limite no tempo, não pode durar demais, senão o homem não agüenta e sua saúde, tanto física, quanto mental, se deteriora rapidamente. Nesse caso, nós passamos a funcionar como se fôssemos verdadeiros vampiros e isso é contra a grande Lei, percebe?

– Sim, mãe. Mas o que eu faço, então?

– Daqui a dois dias você pode voltar a usar seu gamo-rei, mas terá que fazê-lo com mais autocontrole, usando as técnicas que eu e sua avó vamos lhe ensinar. Mas sim, você pode desfrutar dele, pode ter muito prazer, pode fazê-lo até uma vez por dia no início. Depois, com o que vamos lhe ensinar, com o que vamos lhe dar para beber, com o creme que vamos lhe dar para introduzir em você mesma, você verá que esse fogo terrível, pior que o fogo francês, vai se acalmar. E também tem mais uma coisa, Vérica: o fato de nós não sentirmos amor por nosso gamo-rei faz com que nós nos cansemos dele depois de um tempo mais ou menos curto. Mas por enquanto, esqueça isso tudo, espere só dois dias e pode desfrutar do seu servo submisso o quanto ele agüentar.

– E como eu saberei quando devo parar?

– Quando você sentir que está começando a ter que passar energia da Deusa para ele, para que ele possa continuar nos jogos de amor. Aí, se você continuar para ter o seu prazer, você o deixará exaurido e extenuado. Então estará infringindo a Lei e terá que enfrentar as conseqüências. E você deve imaginar que não há gozo ou prazer neste mundo que possam justificar tal sacrifício, não é?

– Sim, mãe, compreendo. Prometo que vou aprender a me controlar. Mas, por favor, ensine-me!...
CONTINUA

O ABATE DE CANGURUS NA AUSTRÁLIA  E A ADIDAS
MILTON  MACIEL

Várias postagens nas mídias sociais dizem textualmente “A Adidas está matando milhares de cangurus na Austrália para fazer sapatos”. Isso é incorreto.

(Para se entender o que aqui se diz, é necessário ler até o fim, sem preguiça, e chegar aos valores numéricos lá expostos).

Longe de mim defender a ADIDAS – que não tem minha simpatia por outras razões – do que quer que seja, mas a realidade é bem diferente. Quem originou essa matéria, que vem sendo repostada nas redes sociais, sem maiores análises críticas, por pessoas sensíveis e de boa vontade, não tem conhecimento suficiente sobre a Austrália e sua economia. E não conhece bem economia agrícola, minha aérea, de um modo geral. Ou tem outras razões para fazer o que fez, sabe-se lá!  

Existe na Austrália uma INDÚSTRIA DO CANGURU, assim como existe do gado bovino e do ovino.

   Aceito que pessoas sejam contra a matança de cangurus para fins de aproveitamento humano. Mas antes vamos olhar os pezinhos delas, suas bolsas e malas, suas despensas e geladeiras. Aqui no Brasil, por exemplo, onde criamos um bovino para cada ser humano (somos os maiores exportadores mundiais de carne bovina), temos, em consequência dos abates internos, um gigantesca industria do couro e uma correspondentemente grande indústria calçadista. (Veja os números no final, não deixe de fazê-lo)

 Aqui também matamos cabras, ovelhas, porcos, peixes, jegues, tartarugas, coelhos, capivaras, codornas, faisões e muitas, muitas galinhas e frangos. BILHÕES DELES! Sim, eu disse BILHÕES, não foi erro de digitação.

Atenção quem está reclamando da matança dos cangurus: Você usa sapato de couro, tênis com aplique de couro, banco de carro de couro, usa bolsa de couro, come carne de boi, de frango e de outros animais? Come ovos e consome laticínios? Se a resposta é SIM, perdeu a moral para falar dos australianos. Agora, se é vegano roxo (e deixo claro que eu não sou), aí pode falar, na moral!

Agora a VERDADE sobre a INDÚSTRIA do canguru na Austrália:

A população desses animais vem sendo mantida constante, nos últimos 25 anos, ao redor da média de 25 milhões de animais (o país tem também 27 milhões de bovinos, um quase nada perto do que nós temos aqui no Brasil). Não há risco de extinção dos cangurus. A matança autorizada A EMPRESAS E PESSOAS ESPECIALIZADAS e controlada pelo governo é de 8% da população de cangurus por ano - 2 milhões dos 25 milhões de animais, as pequenas variações anuais ocorrendo mais em função das secas.

Ora, havendo o abate desses 2 milhões, existirão dois milhões de COUROS, que serão curtidos e industrializados (são couros pequenos, quando comparados com os de boi). O que a Adidas e os demais fabricantes de calçados fazem é só aproveitar esses couros disponíveis na indústria local do canguru. Aqui no Brasil, as fábricas fazem o mesmo com couro de boi, de jacaré e até de peixe.

Portanto, NÃO É VERDADE, QUE UMA FÁBRICA DE CALÇADOS MATE CANGURUS. E uma só fábrica, ainda por cima! Seria como afirmar, aqui no Brasil, que a SAMELLO ou uma única outra fabricante de calçados, de Franca ou de Novo Hamburgo, mata bois para fazer sapatos. Ridículo.

O que pega aqui no Brasil e na Europa, é que o canguru é um bichinho fofinho que a gente só conhece de zoológico e de filme infantil. Mas para os australianos a realidade é totalmente diferente. Os cangurus se reproduzem em liberdade, como animais silvestres e com tanta prolificidade, que é feito um controle populacional pelo abate calculado de menos de 10% da população total por ano. No Brasil começa a se ver isso no Rio Grande do Sul, onde já vem sendo autorizados pelo IBAMA  abates de um grande número de javalis e porcos selvagens que, oriundos do Uruguai, reproduzem-se com tal facilidade que se tornaram uma séria ameaça a lavouras e a seres humanos, pela sua extrema agressividade.

Para os australianos, é essa caça controlada ao canguru que gera a indústria correspondente, com toda a sua cadeia de produtos, subprodutos e empregos diretos e indiretos. São dois milhões de animais, cuja carne é apreciada e consumida pelos australianos; e dois milhões de couros que são industrializados a aproveitados, pela indústria calçadista inclusive, pela Adidas inclusive.

Podemos morrer de dó do canguru abatido, do filhote que pode morrer à míngua. Mas porque não morrer de dó do bezerrinho que, meses depois, você estraçalha nos dentes na forma de picanha e costela na sua churrascaria favorita? E que dizer do seu filé, sua lingüiça, seu queijinho prato, seu ovo frito? E do bezerrinho desnutrido na marra para virar VITELA?

 Todo abate é, sem dúvida, um ato de crueldade contra o animal. Mas só tem moral para falar isso de boca cheia (desculpe o trocadilho) o VEGANO. Desde que, coerentemente, não use nada de couro também.

Você está falando mal da Adidas e dos australianos? Os australianos matam 2 milhões de cangurus por ano, esses malvados. Pois então deixe eu lhe dar os números do Brasil, referentes ao ano de 2010:

ABATE TOTAL  (IBGE, Nov. 2011)

BOVINOS – 30 milhões de animais 
PORCOS -    33 milhões de animais
FRANGOS -   5 BILHÕES de animais

E mais:
COUROS – 35 milhões de unidades
LEITE – 22 BILHÕES de litros
OVOS -   2,5 BILHÕES  de dúzias

CANGURUS – 2 milhões de animais (Ah, esses bandidos australianos! São uns desumanos, não são bonzinhos como nós, os suaves e gentis brasucas, que não sacrificamos os nossos animaizinhos para comer, usufruir e exportar, que não formamos entre os maiores gigolôs de bicharada deste mundo!).

E olhe que alguém pode começar, no Facebook da Austrália, uma proposta de boicote aos calçados e tênis feitos no Brasil, por extrema crueldade contra os nossos animaizinhos. Afinal, só em bovinos, matamos quinze para cada canguru deles. E bois de 15 arrobas ou mais, nada comparáveis aos coitados dos cangurus, pequenos e magrelos.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013


O CERCO -14 
MILTON  MACIEL

Resumo do cáp. 13 – Vérica retornava de sua noite de agonia dentro da floresta, quando descobriu que os hunos estavam se esgueirando por cima do fosso da planície, usando cordas. Descobriu também que as sentinelas sobre a muralha foram apunhaladas e jogadas para o chão, em frente à muralha norte, com a possível intenção que caíssem no fosso de água da muralha. E visualizou mulheres como as responsáveis pela traição. Depois escalou a muralha sul e se encontrou com suas parentas sacerdotisas. Vérica correu para o alto da muralha norte com seu grande arco e as outras duas prepararam o FOGO GREGO. Antes que os hunos pudessem se aproximar para lançar suas flechas incendiárias sobre a cidadela adormecida, Vérica os surpreendeu com suas mortíferas setas gigantes, com o fogo grego. Explosões e fogo colocaram os hunos em fuga desordenada, amargando mais uma derrota e muitas baixas.

UMA NOITE DE ÓDIO E AMOR

Meroveu, apesar de extasiado ante tudo o que acontecera, estava mortalmente preocupado com o incêndio que grassava no capim gigante próximo ao fosso, de ambos os lados. Aquele capim com suas touceiras enormes, era uma importantíssima arma de defesa da cidadela. Era imprescindível que seus homens combatessem aquele incêndio imediatamente. Chamou seu lugar-tenente, Armocic:

– Leve todos os homens com você, inclusive os civis que estiverem por aqui também. Levem todos os baldes, ânforas vazias, barris, tudo enfim que puderem encontrar aqui dentro para juntar água nos alagados. Formem correntes humanas, precisamos apagar esse incêndio. Não é preciso temer os hunos, que já correrem de volta para sua base.

– NÃO! – Gritou, alarmada, a sumo-sacerdotisa Kyna. – Não se pode jogar água para apagar o fogo grego. A água só serve para espalhá-lo ainda mais.

– Como, Kyna. Você está dizendo que esse fogo não pode ser apagado com água? Isso é impossível!

– Claro que é possível, Meroveu! Você é que não sabe de nada!

O rei surpreendeu-se com o tom agressivo de Vérica. O que teria acontecido?

Alana olhou pra Vérica com ar de reprovação e de compreensão ao mesmo tempo. Pobre criança! Era evidente que conseguira metabolizar seu ressentimento com a ordem da Deusa transferindo sua raiva para a pessoa de Meroveu. Achou melhor intervir.

– Rei Meroveu, nessa mistura que chamamos fogo grego, há um material que, em presença de água, se inflama ainda mais.

– Pelos deuses! Como isso é possível? É magia?

– Não, meu senhor, é ciência. Uma ciência muito antiga, que nos chegou preservada de maneira iniciática e oculta. Essa fórmula que usamos hoje é um dos pouquíssimos conhecimentos de uma monumental ciência química muito antiga, que chegou aos gregos através dos egípcios e, a estes, através de cientistas que migraram fugindo da destruição de uma grande civilização, situada no mar oceano do ocidente, depois das colunas de Atlas.

– E existiu uma civilização no oceano de Atlas? Como é que nossa tradição não fala dela?

– Porque as tradições dos francos são primárias, ora bolas! – falou Vérica, com voz irritada, surpreendendo Meroveu outra vez. Kyna sorriu, balançando a cabeça de fulvos cabelos iridescentes. E Alana retomou a palavra:

– Existiu, sim, rei Meroveu. Uma civilização adiantadíssima, que dominou todos os elementos da matéria e da energia, que construiu máquinas colossais e que, por causa delas, acabou destruindo sua civilização, ao voltá-las contra si própria, através de guerras de destruição em massa.

– E o que aconteceu então?

– O continente deles afundou e eles pereceram.  Qualquer criança celta sabe isso desde bebê!

– Vamos, Vérica, não exagere, querida. Acalme-se, a batalha já acabou. Desculpe minha neta, rei Meroveu, ela está ainda inflamada pelos humores da guerra, pelo fogo da batalha. Pode-se dizer que o fogo grego subiu-lhe à cabeça, não é verdade, Vérica?

Como única resposta, a moça apanhou seu grande arco e, fazendo uma rápida semi-flexão com o joelho direito, saudou as sacerdotisas e se retirou, com uma autêntica rabanada, que fez sua vasta cabeleira ruivo-dourada estremecer e agitar-se. Nem saudou o rei dos francos, nem se dignou a dirigir-lhe sequer um olhar.

Meroveu engoliu em seco, nunca tinha visto Vérica tratá-lo assim com tal desrespeito, com hostilidade mesmo. O que teria acontecido? Então, nesse exato momento, lembrou-se da consulta à Deusa e chegou rapidamente à única conclusão possível: o óbvio havia acontecido! Sim, certamente a Deusa não só tinha negado que sua jovem sacerdotisa pudesse ter um relacionamento amoroso com ele, mas, com toda certeza, recomendara que ela se afastasse dele e o tratasse com indiferença e hostilidade. Era isso! Meroveu sentiu-se como que afundando nos alagados!... Tudo o mais perdeu sentido para ele. Precisava retirar-se dali urgentemente, tinha que ficar só, não podia mostrar fraqueza na frente das outras pessoas, dos seus subordinados, das duas sacerdotisas. Pensou desesperadamente numa desculpa, mas não encontrou nada plausível. Contudo Kyna, fazendo um gesto perceptível só para Alana, veio livrá-lo daquela situação insustentável, dizendo:

 – Rei Meroveu, o fogo continua grassando livre em seu capinzal. Leve todos os seus homens e vá apagá-lo. Só não use água. Improvise grandes maços com o próprio capim gigante e mande seus homens baterem forte na base do fogo, procurando abafá-lo. Não façam nada diferente disso e, como o dia já vem nascendo, vai ser mais fácil para vocês trabalharem. Agora vá, não perca nem mais um minuto.

Meroveu partiu numa corrida louca, agradecido pelas palavras de Kyna, que o haviam livrado de um grande embaraço. Para todos os efeitos corria para lutar contra o incêndio. Na verdade corria para isolar-se e poderia fazê-lo agora no meio de centenas de homens, pois cada um estaria cuidando de si e do fogo que combatia. A fumaça densa dificultava a respiração, rolos de chama subiam de repente e quase os envolviam, alguns tiveram dolorosas queimaduras. Mas, para Meroveu, o melhor é que todos ali tinham os olhos vermelhos por causa da fumaça. Ninguém notaria que seu rei tinha os seus ainda mais vermelhos por causa das lágrimas, que ele agora não precisava conter nem disfarçar. Ao mesmo tempo, batia nas partes incendiadas dos capins com toda força e toda raiva, o que servia para aliviar sua tensão insuportável.

Quando o sol subiu no horizonte, mais de setecentos homens, entre militares e civis, se viram sujos, suados, extenuados, enegrecidos de fuligem, terríveis. Mas vencedores! O fogo havia sido completamente extinto e a maior parte do capinzal pudera ser preservada. As partes queimadas levariam mais de seis meses para atingir metade da altura que tinham, mas ressurgiriam mais fortes e ainda haveriam de superar, no futuro, não só a altura, como o diâmetro dos colmos originais. Esse era o efeito das queimadas.

Meroveu retirou-se para seus aposentos, usou toda a água que tinha de reserva, baldes e baldes, para lavar-se e, a seguir, jogou-se nu sobre a cama, exausto no corpo e na alma. Ficou por mais de duas horas assim, de barriga para baixo, pensando exclusivamente na recusa da Deusa e na conseqüente hostilidade de Vérica. Não conseguiu cochilar, que fosse, nem por um minuto.

Nesse mesmo tempo, Vérica estava sentada no chão, numa das ameias da muralha sul, para onde batera em retirada, ao deixar as outras sacerdotisas conversando com Meroveu. Aquele idiota, querendo combater o fogo grego com água! Ignorante! Tão ignorante que suas tradições não contavam nada, absolutamente nada sobre a fabulosa Atlântida. Ora, de onde tinham os celtas, seus druidas e suas sacerdotisas, absorvido todo o conhecimento secreto que possuíam, seu domínio sobre as forças da natureza, senão de pálidos resquícios que haviam sobrado, perdidos por tantos lugares ao longo do Mar Mediterrâneo, dos conhecimentos ciclópicos dos grandes cientistas atlanteanos?

Certamente os francos ignaros, primitivos, não sabiam que um grupo diminuto desses atlanteanos havia conseguido chegar às terras do que um dia, no futuro, viria a ser o Egito. Que, quando chegaram, encontraram apenas povos rústicos, que ainda viviam em enormes habitações coletivas, dominando apenas as técnicas mais rudimentares de uma canhestra agricultura de subsistência. Graças aos poucos atlanteanos e aos descendentes deles, miscigenados já com os povos locais, houve a rápida expansão da nova cultura egípcia. Mas isso não valia a pena tentar explicar para aquele chefe estúpido, que tudo o que queria, certamente, era deitar-se com ela, fazer-lhe um monte de filhos, como era costume dos bárbaros, e proclamar-se amo e senhor da vida dela. Pois sim! Ele que esperasse! E sua mão crispou-se automaticamente sobre o cabo do seu punhal.

Mas, daí a instantes, sua memória lhe trouxe a visão fascinante de Meroveu quase nu, subindo rapidamente as escadas da muralha norte. Viu e reviu seu peito e braços musculosos, lembrou suas coxas retesadas. E aquele volume desconhecido, antevisto sob o pouco pano entre elas, que a deixava nesse instante aquecida e excitada. De repente o cabo do punhal deixou de ser o que era. Na imaginação de Vérica, ele passou a ser aquilo havia por baixo dos panos de Meroveu. Ela apertou com mais força o cabo, imaginou como deveria ser aquilo na verdade e enfiou a mão esquerda por baixo de sua túnica, em direção ao cálido ponto umedecido que clamava por uma atenção imediata. E de repente decidiu: já que o seu iniciador seria Meroveu, então teria que ser agora, nesse momento. Ela não iria esperar mais! Se aquela era a vontade da Deusa, então ela, Vérica, haveria de somar a isso sua própria vontade agora. A mão direita deixou de empunhar o imaginário objeto do seu desejo, a mão esquerda saiu de sua quente intimidade. 

Vérica levantou-se com um salto felino, embainhou seu punhal, correu para sua corda de escalada, que continuava no mesmo lugar ainda e arrancou de si a túnica que usava, pois ali não havia ninguém que pudesse vê-la. Desceu nua pela corda celeremente, deixando-se desta vez cair dentro fosso que circulava as muralhas em toda a sua extensão. A água do fosso era corrente, vinha do regato que o alimentava a partir da floresta, era límpida, pura e gelada. Vérica imaginou que tomava um banho ritualístico, purificando-se e preparando seu corpo para a iniciação no amor. Ao sair do fosso, nua e pingando água, subiu com toda a facilidade os oito metros de altura da muralha sul, usando apenas a força descomunal dos seus braços sobre a corda, sem usar as pernas como apoio. Sem secar o corpo, cobriu sua nudez, vestindo novamente a túnica branca.

Molhada por fora e por dentro, correu, esgueirando-se em busca dos aposentos do rei. Sabia que ele estaria lá e que estaria só. Sentia-o, tinha plena certeza disso. Chegou à modesta porta sem ser notada por ninguém, a população em massa dormia para se refazer do susto e das atividades cansativas da madrugada.

Vérica empurrou a porta destravada e entrou em silêncio. Sobre a cama, Meroveu, completamente nu, de barriga para baixo, parecia dormir. A moça ficou deslumbrada com a visão do macho nu, melhor do que havia imaginado. Aproximou-se pé ante pé e ficou a admirá-lo. Nesse momento, Meroveu pressentiu sua presença e se virou na cama. Então, enfim, Vérica pôde ter a visão completa do que era um homem, depois de tantos anos de só imaginá-la. E também isso era melhor do que o que ela havia imaginado.

Meroveu olhava para Vérica extasiado, sentindo seu sangue ferver e sua virilidade se expandir. Vérica, sua musa, a mulher mais linda e desejável desse mundo estava ali, a olhá-lo nu, sem nenhum receio ou pudor. Com era possível isso, se a Deusa...

Não pôde pensar mais nada. Vérica com um único movimento arrancou de si a túnica sacerdotal, expondo-se magistralmente nua ao seu desejo. Mas, quando ele quis tomar a iniciativa de abraçá-la pela cintura, ela lhe deu um tapa forte no braço e outro, este bem suave, no rosto. E falou:

– Não! Fique quieto! Tem que ser do meu jeito. Eu vou instruí-lo e fazer de você meu gamo-rei.

Ato contínuo, deu-lhe um empurrão e jogou-o deitado de costas sobre a cama. E então passou a explorar meticulosamente, lentamente, tudo o que não conhecia do corpo de um homem.

Sim devia ter imaginado que seria assim. Não precisava ter qualquer medo, nunca participara desses jogos, mas sua intuição lhe ditaria cada passo, cada movimento, cada carícia, cada palavra. Sim, ela era uma sacerdotisa! Ela é que conduziria o gamo-rei e, apesar de ter ainda intacto o hímen, ela é que tiraria a virgindade daquele homem tolo e ignorante, que certamente jamais tivera na vida a ventura de deitar-se com uma sacerdotisa da Deusa. E deitar-se com uma virgem da Deusa, na primeira vez dela, era deitar-se com a própria Deusa. Nem todos os homens resistiam, alguns perdiam a vida na experiência.

CONTINUA

SER FELIZ É SABER OLHAR PARA  TRÁS -  
E saber AGRADECER. Mas é também
olhar para a frente e NÃO TER MEDO!
MILTON  MACIEL

O verdadeiro amor, por exemplo, está muito mais em ter tido a felicidade de partilhar doces e duros momentos, os altos e baixos do simples dia-a-dia; está muito mais no acumular de experiências e vivências, que constroem um passado de compreensão e tolerância, amizade e carinho, em que pese termos vivido desencantos e desilusões, arrufos e brigas, porque isso é simplesmente o NORMAL da vida.

As pessoas nem sempre percebem que ser feliz é OLHAR PARA TRÁS. Ao contrário..., elas tendem a ficar infelizes com um veneno chamado MEDO DO FUTURO, medo de perder. Só que aquilo que você já tem dentro de si não pode mais ser perdido. É tesouro. É Indestrutível. Uma relação pode acabar, o afeto de amanhã pode mudar. Mas tudo o que foi vivido não muda, está guardado para SEMPRE, per omnia secula seculorum. Portanto, ser feliz é, acima de tudo, um estado contínuo de GRATIDÃO pelo que de bom já vivemos na vida. E isso, certamente, todos nós tivemos e muito.

Quantos são os que dizem, merecidamente: EU ERA FELIZ E NÃO SABIA. Pois é, isso é bem do ser humano: não saber reconhecer um estado de felicidade que está escondido numa aparente calmaria, num dia-a-dia sem sobressaltos, sem eventos novelescos e excitantes. Foi pensando nisso que um dia escrevi um poema muito simples(*), mas que retrata essa realidade, a qual fica oculta aos olhos das pessoas no dia-a-dia de suas vidas agitadas, em que elas não se permitem reconhecer a sutileza dos bons momentos que permeiam os menos agradáveis – a porque a VIDA É ASSIM, simplesmente.

Contudo, é da natureza humana, por causa do EFEITO SOMBRA que ataca do fundo do inconsciente, dar um peso diferente aos momentos infelizes, muito maior do que o atribuído aos momentos felizes. É o mesmo fenômeno que faz os jornais e os telejornais estamparem as desgraças e os crimes, as baixarias e as fofocas, preferencialmente a outros temas. Isso vende jornal, isso faz as TV’s faturarem horrores com excrescências tipo BBB. De uma certa forma, nós estamos preparados para o que é ruim, esperamos por ele, pela mediocridade inclusive
.
As pessoas não costumam – porque ninguém lhes ensinou isso – apreciar a felicidade que está no que já passou, de onde nasce o sentimento de plenitude que se chama GRATIDÃO. Exatamente por causa desse que é, como Jung tão bem o demonstrou, o maior medo dos seres humanos: O MEDO DE SOFRER!  É por medo de sofrer que nós deixamos passar muitas das melhores oportunidades na vida. E deixamos de nos livrar de relações negativas, quer na família, no trabalho ou no amor. E deixamos de encetar outras tantas relações novas. Em suma, como ser humano, VOCÊ MORRE DE MEDO DE SER INFELIZ. MORRE DE MEDO DE SOFRER. MORRE DE MEDO DE PERDER.

Um dia Clarice Lispector perguntou a Hélio Pelegrino, o grande psicanalista brasileiro: Viver é bom?

A resposta de Hélio Pelegrino ela anotou e colocou em livro:

“Viver, essa difícil alegria. Viver é jogo, é risco. Quem joga pode ganhar ou perder. O começo da sabedoria consiste em aceitarmos que perder também faz parte do jogo. Quando isso acontece, ganhamos alguma coisa de extremamente precioso: ganhamos nossa possibilidade de ganhar. Se sei perder, sei ganhar. Se não sei perder, não ganho nada, e terei sempre as mãos vazias. Quem não sabe perder acumula ferrugem nos olhos e se torna cego – cego de rancor. Quando a gente chega a aceitar, com verdadeira e profunda humildade, as regras do jogo existencial, viver se torna mais do que bom --se torna fascinante."

(*) ODE A UMA DIA COMUM
MILTON MACIEL

Ontem não aconteceu nada,
Foi só um dia comum.

Ontem nada deu certo;
Porém, nada deu errado.
Se nada teve conserto,
Nada também foi quebrado.

Tive alegrias? Que nada!
Mas nada me incomodou.
Fiquei chateado? Que nada!
No entanto, nada mudou.

Nada de novo na esquina,
Nada fugiu da rotina.
Nada houve de horroroso...
Que dia MARAVILHOSO!!!

Miami, Jan 30, 2012