domingo, 13 de janeiro de 2013


UM  CACHORRINHO !
MILTON MACIEL
(Dedicado a Regina Lara Barretto *)

Eu vinha turvo, triste, néscio, a errar pelo caminho.
Mil amarguras remoendo, revoltado, a pé, sozinho.
Jogou-me ao chão a exaustão do meu corpo combalido,
Eu a afogar-me em dor atroz, derrotado,  destruído.

Raízes tortas, folhas secas, duro chão foi meu aprisco.
Tomou-me o sono, adormeci, sob a sombra de um hibisco.
Horas depois fui despertado por um lindo cachorrinho
Que me lambia e me chamava com seu latido fininho.

Era pequeno, um filhotinho, e pareceu-me tão bonito,
Que ao tocá-lo eu esqueci o quanto que eu estava aflito.
Ele pousou, então, em mim um olhar de tal beleza,
Que eu percebi que neste mundo ainda existia pureza.

Tomei-o ao colo e ele, feliz, o rabinho sacudia
E eu podia até jurar, que ao olhar-me, ele sorria.
Por quanto tempo assim ficamos, eu não posso precisar,
Mas veio a noite e levantei-me, precisava continuar.

Fechei o cenho, ao retomar minha dores, meu caminho,
Mas percebi que, atrás de mim, me seguia o cachorrinho.
Tratei em vão de o despistar, mas ele não retrocedia,
Pra onde quer que eu me voltasse, ele sempre me seguia.

Na noite escura ainda vi seus olhinhos que brilhavam
E para mim pareceu que esses olhos me chamavam.
Sentei-me ao chão e estremeci: a Lua Cheia então saía,
Ao disco imenso, no horizonte, todo o bosque ressurgia.

O cachorrinho então pulou e aninhou-se no meu colo
Enquanto eu o acolhia, acomodado ali no solo. 
Quando o luar se refletiu nos seus olhos pequeninos,
Foi como se a mim voltasse a pureza dos meninos.

E essa pureza devolveu-me o mais nobre sentimento,
Que eu esquecera no egoísmo do meu próprio sofrimento.
Vi que sofria o animalzinho, que ele fora abandonado,
Coisa em que, até então, eu não tinha nem pensado.

Seu olharzinho me pedia proteção e aconchego
E só então pude sentir que ele tinha muito medo.
Ergui-me enfim, sob o luar, e tomei novo caminho,
Entre meus braços, protegido, eu levava o cachorrinho.

Caminhando, compreendi o quanto eu estivera errado,
O sofrimento me fizera  duro, frio e ensimesmado.
Como se o mais duro penar só a mim acontecesse,
E como se fosse eu quem no mundo mais sofresse!

Só então me apercebi que eu não era mais sozinho,
Tinha agora um companheiro, no meu colo: o cachorrinho!

Caminhei a noite inteira e, ao romper da madrugada,
Eu reentrei naquela casa que um dia foi meu lar.
Outrora um ninho de amor, então fria e abandonada,
Ali vivi a dura história que me fez desmoronar.

Precisava de um lugar pra criar o cachorrinho.
A casa, pois, reformei, repintei, enchi de luz.
Ela voltou a ser um lar e ele foi o meu filhinho!
E o terreno, abandonado, em jardim então dispus.


Faz cinco anos, neste mês, que isso tudo se passou...
E, crescendo, o cachorrinho minha vida transformou.

Nunca a vida contestou
A verdade que aqui está:
Maior que o amor que eu lhe dou
Só o amor que ele me dá.

Nas noites de Lua Cheia
Sempre vamos caminhar,
Pelo bosque ou pela areia.
Então costumo pensar:

Ah, esta luz no caminho,
Esta alegria comigo!
Ao lado meu grande amigo,
Nunca me sinto sozinho!

* REGINA LARA BARRETTO, de São Paulo, faz um trabalho incrível de salvar, recolher das ruas, medicar, acolher, alimentar  e dar carinho a uma imensa quantidade de cães, beirando atualmente a fantástica quantidade de 500 animais, a quem ela chama exclusivamente de filhos. E tudo, creiam, exclusivamente às suas próprias expensas, sem qualquer tipo de ajuda pública ou privada, há mais de quatro décadas!. 



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