sábado, 5 de janeiro de 2013


Série OS POEMAS DA SOMBRA No. 2:  TRÔPEGO PASSO
MILTON  MACIEL    

 2 - A Sombra e os Relacionamentos

I looked and looked and this I came to see:
That what I thought was you and you,
Was really me and me 
Autor desconhecido

Olhei e olhei e isto eu pude ver:
Aquilo que eu pensei que era você e você,
Era realmente eu e eu.

(LOGO APÓS O POEMA, TEMOS O TEXTO EXPLICATIVO SOBRE A SOMBRA NOS RELACIONAMENTOS)

TRÔPEGO PASSO
Milton Maciel

Trôpego passo meu, em meio à multidão,
Onde me levas, assim lasso e cambaleante?
Haverá sina pra este meu andar errante?
Alcançarei mais do que a poeira deste chão?

Se mal me arrasto pelo passadiço angusto,
É que, perdido, meu percurso é desatino.
E, quando penso ter chegado a meu destino,
O que encontro é só meu leito de Procusto.

Nele eu suporto a mais terrível das torturas,
Que é recordar seu olhar frio e indiferente,
A me dizer que o seu desprezo é permanente
E que, à frente, só terei penas mais duras.

Estou prosternado neste tremedal tremendo,
Vendo que a vida se me esvai a cada instante,
Você, de mim, a cada dia mais distante,
E eu, sem você, a cada dia mais sofrendo.

Ah, e pensar que o findar das minhas penas
Ocorreria a um simples gesto seu... apenas!

(*) LEITO DE PROCUSTO: esse Procusto era um criminoso sádico de Elêusis, Grécia antiga. Ele recebia hóspedes em sua casa e lhes dava uma cama para dormirem. Então, se o hóspede fosse maior que a cama, amarrava-o e cortava-lhe os pés. Se fosse menor, esticava-o com cordas, num suplício horrível. Sempre tinha como se divertir, pois, na verdade, tinha dois quartos de hóspedes com camas de tamanhos bem diferentes. Teseu matou-o: amarrou-o atravessado em uma de suas camas e o fez caber, cortando-lhe as pernas e a cabeça (romântico isso, não? Ao menos os sádicos devem achar). Leito de Procusto passou para a literatura como sinônimo de ambiente de torturante sofrimento.

 SOMBRA, RELAÇÃO E PROJEÇÃO

Um dos campos onde A SOMBRA se manifesta mais intensamente é o dos RELACIONAMENTOS. Este é o típico ambiente psicológico onde funciona livremente o mecanismo denominado PROJEÇÃO. O nome não poderia ter sido mais bem escolhido. No processo psicológico de Projeção, tudo se passa como se nós passássemos uma tinta branca na outra pessoa, evitando ver como ela é realmente, e ligássemos nosso projetor sobre essa nova tela, projetando ali as imagens que queremos ver.

Essas imagens são de duas categorias gerais. Podemos chamá-las, para simplificar, de Meus Defeitos e de Minhas Necessidades.

Meus Defeitos

A Sombra costuma nos pregar esta peça: nós projetamos em outra pessoa com quem nos relacionamos nossos defeitos e nossas piores qualidades, aquelas que, exatamente, NÃO QUEREMOS acreditar que sejam nossas. Então atraímos (ou nos sentimos atraídos por, o que dá no mesmo) alguém que terá esses defeitos e más qualidades. A Sombra nos leva a escondermos essas qualidades negativas de nós mesmos e escalamos um outro para vivenciá-las através da relação conosco. Então passamos a representar um ato de teatro na vida, no qual vamos ser forçados a trabalhar esses mesmas qualidades negativas através de nossas relações amorosas, familiares e até mesmo profissionais.

Minhas Necessidades

Aqui o jogo de Projeção é ainda mais sutil e, via de regra, muito mais desgastante, respondendo pela quase totalidade daquilo que aprendemos a chamar de DESILUSÕES amorosas. Nesse caso, depois de passar a tinta branca sobre a pessoa (isto é, depois de ignorarmos solenemente os sinais que ela nos dá sobre a sua realidade fazemos isso sempre que nos APAIXONAMOS!), nós projetamos sobre ela não mais qualidades negativas nossas, mas qualidades positivas pelas quais ansiamos, que nosso inconsciente sinaliza como necessárias para nós. Nossas Necessidades, em resumo.

Só que essa pessoa NÃO TEM essas qualidades! Nós é que a encarregamos de representar esse papel, que lhe damos todos os sinais do que queremos que ela tente representar para nós. A moça gosta de flores, de poesia, de Pablo Neruda, de Centro Espírita, de cachorrinhos, de ginástica rítmica. Ela projeta esses anseios num cara é mais do funk, do MMA, agnóstico, odeia bichos e acha esse negócio de flores a maior frescura. Mas, na fase de conquista, todos nós procuramos apresentar só o nosso lado bom. Então toca mandar flores, pedir pro amigo escrever os cartões idiotas, comprar livro de Neruda e decorar umas curtas passagens naquela língua do Peru (Neruda é do Chile, seu idiota!)  uma barra! e agüentar aqueles cachorros nojentos babando na mão.

É claro que uma situação assim não pode se manter por muito tempo. Ninguém pode ser personagem o tempo todo. Um dia o cara cansa, tira a maquiagem e a roupa de herói, cai no funk, fala que odeia Neruda e cachorro, não necessariamente nessa ordem,  e ainda reclama do quanto de dinheiro que botou fora na florista. DESILUSÃO! Que é apenas o caminho de volta da Ilusão.

Mais adiante na série, vamos enfocar este mesmo assunto com mais profundidade.  (MM)




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