EU
SEI OS SEUS PIORES SEGREDOS
MILTON
MACIEL
Ei, pessoa! É, você mesmo, pessoinha, que
está lendo isso aqui! Você, sim. Eu descobri os seus segredos mais incômodos,
sabia? Pode crer! Você já vai ver. Como?
Quem sou eu? Ora, você já vai ver também, não tenha pressa, não apresse o rio.
Bem, de qualquer forma, eu sou o cara
que sabe os seus piores segredos. Inclusive aquele mais brabo, que ninguém pode
saber, mas ninguém mesmo, senão você se ferra total, pessoa. Quer ver o que eu
sei?
Pois então pára tudo. Não, é tudo mesmo!
Pára tudo e pensa pra valer nesse seu podre mais brabo aí. Não, eu sei que você
tem um monte, mas é o pior deles, o mais cabeludão, é: AQUELE!!! Agora pensa no medão que você tem que alguém
fique sabendo disso. Pensa bem, pessoa! Está pensando? Imagina então se alguém descobre
e começa a espalhar ISSO por aí, joga no ventilador. Acaba com você! Pois acontece
que EU sei tudo!
A sua sorte é que comigo o seu segredo
cabeludo está protegido. Eu não conto nada pra ninguém. Sou capaz do mais completo
e abismal silêncio. Aliás, por causa disso, eu mesmo me dei dois apelidos: Túmulo Fechado e Sepulcro Caiado.
Que sorte a sua que fui eu quem descobriu
essa coisa horrorosa. Francamente... Você, hein? Quem diria! Pessoinha, em você
existe um feio lobo por baixo dessa pele bonitinha de ovelhinha. Mas a mim você
não engana, não. Agora eu sei de tudo. Mas, como já afirmei, sorte sua é que eu
sei guardar um segredo. É, não só você, mas todas as outras pessoas que eu
flagrei, estão mais do que seguras comigo. Segredo total. Absoluto!
A menos, é claro, que uma pessoa não saiba
reconhecer, não saiba demonstrar gratidão por esse meu proceder idôneo, essa
minha canina lealdade para com uma pessoa pecadora e portadora de um segredo
aviltante. Explico melhor: Já houve até quem equivocadamente pensasse que eu
sou um chantagista qualquer, desses chantagistazinhos miúdos e baratos de
periferia, que cobram pra não revelar segredinhos torpes de alcova, de viadagem
ou de desfalques, de fofoca de comadre ou de cabeleireiro.
Argh! Eu tenho nojo dessa gente baixa e
rasteira! Chantagistazinhos chinfrins! Aliás, eu tenho nojo de tudo que não
tenha classe e um bom tamanho. Por isso mesmo eu só opero na descoberta de
segredo brabo pra valer. Dos maiores! E de gente importante que nem tu,
pessoinha. Gente que tem, além de importância e nome a zelar, uma sólida
retaguarda financeira.
Não, não se assuste, já falei que eu não
sou chantagista. Imagine, longe de mim a idéia malévola de lhe extorquir
dinheiro em troca de manutenção do seu segredo. Nunca, eu tenho a minha ética e
dela não me afasto um milímetro. Eu não cobro nada para manter o seu horrível
segredo absolutamente secreto e protegido. Fique tranqüila, pessoa.
Agora, eu agradeço e aceito a gratidão das
pessoas que eu protejo da execração pública ou de parte de pessoas amadas, de pessoas
cornas amadas, familiares, empregadores, fiscais federais, etc. Não posso
impedir que pessoas realmente generosas – como você, pessoa, tenho certeza –
queiram demonstrar a sua enorme gratidão pela proteção que eu garanto a seus
tenebrosos segredos. Nesse caso, elas, pelo geral, me fazem impressionantes e
significativas doações espontâneas, que eu não sou capaz de recusar, por medo
de vir a ferir suas suscetibilidades.
O meu Camaro amarelo, por exemplo, foi
doação de uma dessas pessoas imensamente reconhecidas. Eu descobri o segredo de
sapatagem dela e não contei pra ninguém, mas pra ninguém mesmo. É, quando eu
digo ninguém, é porque é ninguém e fim de papo. Nem o arqui-tri-corno do marido
dela ficou sabendo. Afinal, lembram? – eu sou o famoso Sepulcro Caiado! E isso que ela traía o marido com a irmã dele e
com a namorada da irmã dele, ao mesmo tempo. Você, por acaso, ficou sabendo
quem ela é? Claro que não, eu não contei até hoje.
Por aí você vê como você pode ficar
tranqüila, pessoa. Seu horrível segredo está em boas mãos. E eu não quero nada,
absolutamente nada de você como condição para ficar em silêncio. Pode
acreditar.
Agora, em contrapartida, eu espero não ter
com você mais uma decepção traumatizante. Já chega a de ter descoberto sua
barbaridade. Você, hein, quem diria?! Mas não vou ter, não, é claro que você
não é do tipo capaz de cometer uma ingratidão horrorosa com o seu protetor
aqui, não é mesmo? Com toda certeza você vai querer me presentear
espontaneamente com um mimo delicado qualquer, sem exageros por que eu sou um
moço tímido e fico logo sem jeito quando as pessoas querem me dar coisas de
grande valor.
Eu me contento com pouco. Pra você ver como
isso é verdade, vou até lhe dar uma ajuda e indicar umas coisinhas que eu
gostaria de ganhar ou de que estou precisando. Por exemplo, eu apreciaria muito
um gesto de gratidão consubstanciado (Hehê, português supimpa! Sou dos bons
nisso também.) em algo simples e pouco espalhafatoso, como uma macinho modesto
de notas de cem reais, totalizando não mais do que cem mil (convém que não seja
menos do que isso também, questão de volume, sabe como é?). Ou um plano de
viagem de volta ao mundo em 60 dias da Porcellatur, que é mais ou menos nesse mesmo
valor modesto também.
Agora, precisar, precisar mesmo, eu não
estou precisando de nada. É que eu sou um cara simples de todo, humilde como
poucos. Só se a pessoinha achar por bem me presentear com um título de sócio
remido do Paulistano, para a família, não é?
Ah, você quer saber como é que eu descobri
o seu segredo? Ora, eu digo, eu não tenho segredos, não sou como você. Pra
começo de conversa, eu tenho contratadas cinco agências de detetives. São as
melhores do país, sabe. Sim, claro que são caríssimas. Mas sabe como é, eu
tenho essa enorme felicidade de ser sempre contemplado com tantas demonstrações
de gratidão das pessoas que protejo, que dá para pagar as agências com uma
fração apenas do que recebo.
Mas as minhas melhores fontes não me custam
quase nada. Como a quase totalidade das pessoas que eu investigo para proteger,
preocupado com o sigilo total sobre as vidas delas, são mulheres, eu faço
consultas espirituais pedindo que me informem se uma determinada fulana é digna
de confiança e do meu amor, minto que quero casar com ela. Se for casada, digo
que ela vai largar o marido. Se for muito velha, digo que tenho um fraco pela
terceira idade. Ou mesmo pela quarta, se for o caso. O fato é que funciona. Por
uma miserinha tipo 50 ou 100 reais, saio de lá com a ficha completa. Como foi
no seu caso, pessoinha simpática.
As santas criaturas que me garantem o meu
trabalho benemérito são Pai Tutufum e Mãe Cigana. É fazer a pergunta e lá vem
chumbo grosso. Como é difícil encontrar uma pessoa sem podres, hoje em dia! Uma
única vez aconteceu, uma tal de Neuza
Osório, de quem os dois guias espirituais só falaram coisa boa. Nunca mais
esqueci esse nome. Tenho ódio dela até hoje, daquela inútil que não prestava
pra nada, pelo menos pra mim.
Mas é isso, pessoinha. Você já pode
imaginar o que Pai Tutufum me contou a seu respeito, não é? Pois é. Ele
entregou você totalmente pessoa, me contou sua vida todinha, desde que você
tinha sete anos e já estava começando a aprontar. Aí ele deu o serviço completo
e até eu fiquei de cabelo em pé quando soube DAQUILO!
Mas você pode ficar tranqüila e confiante,
pessoinha. Minha boca é um túmulo, já disse, eu sou o Sepulcro Caiado, lembra? De mim ninguém jamais vai ficar sabendo
essa indignidade. Eu sou seu protetor. E sou o grande amigo das pessoas que,
como eu, sabem valorizar esse sacrossanto valor humano que é a GRATIDÃO, como
deve ser o seu caso.
Sim, porque se não for, bem... EU ODEIO
PESSOAS INGRATAS!
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