MILTON MACIEL
43 – O AMOR EXPLODE!
– Ninguém sai desse prédio, ou eu mato esta menina. Não arrisquem, eu mato mesmo!"
Saiu no jardim e foi rebocando a garota. Mas, subitamente, sentiu como
que umas agulhadas nas costas. Sua arma caiu, duas manchas vermelhas surgiram
em sua camisa. Então se deu conta que o ruído que tinha ouvido era de tiros
distantes. Tiros distantes, mas que tinham acertado suas costas. Desabou no
chão.
Então o desgraçado surgiu das sombras do jardim! Era aquele filho da
puta que tinha atirado nele! Na mão, ainda fumegante, ela tinha uma arma com um
cano muito longo. Não! Era uma arma normal com um silenciador!
A loirinha, agora solta, deu um grito e se jogou nos braços do homem:
– Chefe!!! – E desmaiou.
Todos os que estavam dentro do prédio saíram rapidamente, ao perceber
que a situação estava resolvida. Celso Teles havia surgido do inesperado, do
nada, e prostrara o bandido com dois tiros certeiros. Aliás, certeiros demais!
Um em cada ombro, em zona não-letal, suficientes para liquidar com as
pretensões do bandido, que jazia gemendo e sangrando no chão.
– Como é que vocês deixaram este escroto escapar?! – Celso Teles parecia
furioso, enquanto segurava Larissa inerte em seus braços, aspirando seu suave
perfume. Essa era a parte boa daquele imbróglio, era a primeira vez na vida que
a tinha assim, totalmente entregue em seus braços. Só mesmo deste jeito! – pensou, amargurado.
Nicanor respondeu, os olhos baixos, muito envergonhado:
– Foram elas, chefe. Elas apareceram na sala, não cumpriram o combinado.
A gente se distraiu com elas por um momentinho só, o sujeitinho tinha uma arma
pequena escondida na perna. Fez Dona Larissa de refém.
– Muito bem, Dona Gládis! E então?
– Perdão, perdão, jefito! Foi
mal. Eu não aguentei esperar mais, achei que a coisa já tinha terminado, os
barulhos já tinham acabado. Desci correndo, se precisassem de alguma ajuda, eu
podia dar. Gritei para todas elas ficarem lá. Mas a Fofinha, não sei por que, veio atrás de mim, só notei quando ela
entrou na sala depois de mim.
– E aí o bandido agiu muito rápido, um cara esperto e ligeiro. A partir
desse ponto, eu não podia expor a vida de Dona Larissa. O cara podia se
assustar e atirar. Pensei que ele podia estar sob efeito de drogas, é muito
comum esses caras fazerem isso, pra ter coragem. E aí, não raciocinam de jeito
normal, são muito mais perigosos.
– E os outros?
– São mais dois. Estão embrulhados para presente, é só dar de regalo de
boas-vindas para o novo delegado, o Dalmo está tomando conta deles armado. E o
senhor vai gostar de saber que o que está dormindo o sono dos justos é ninguém
menos que o Ramiro Toco. Só que está bem estropiado, acertei a cara dele com
muita raiva.
– Ramiro Toco! Mas isso é mesmo bom demais, o homem de confiança, o
número um da quadrilha de Valdemar Silva! Meus parabéns, Nicanor, você foi
eficiente e perfeito como sempre. E parabéns para todos vocês também.
Anselmo falou, rindo muito:
– Também, o Toco já estava pronto pra invadir a fortaleza, já ia começar
a comer a gatinha cabeluda aí. Ela não é uma gracinha, chefe? Até eu estou
pensando em pegar essa cabeludinha aí à força.
A gargalhada foi geral e só aí Nicanor se deu conta que não tinha tirado
a peruca longa ainda. Arrancou-a com raiva a atirou-a na cara de Anselmo, que
se dobrava de tanto rir.
Celso entrou também na brincadeira, para desanuviar. Estava muito
chateado com o quase rapto de sua fadinha. O que poderia ter acontecido com
ela, se aquele maldito tivesse conseguido fugir, carregando seu precioso fardo?
E disse, rindo também:
– Eu ia compreender e desculpar você, Anselmo. Ela não
ficou um tesão, parecida com uma mulata do falecido Sargentelli?
Enquanto todos riam muito, inclusive o próprio Nicanor, Larissa começou
a recuperar os sentidos. Gládis, com sua notável perspicácia, foi a primeira a
notar isso e chegou-se rápida ao alcance do ouvido de Celso, sussurrando:
– Não solte ela, jefito! Não
solte, de jeito nenhum. Abrace a Fofinha,
abrace com tudo o que sente por ela, só não aperte, seja bem suave, suave...
Ah, espanholita querida! Estava mais do que
perdoada agora de sua imprudência. Celso obedeceu a ordem de sua companheira de batalha, mantendo Larissa
aconchegada em seus braços, totalmente envolvida, a cabecinha apoiada em seu
pescoço, o perfume cada vez mais inebriante, cheiro de pele jovem limpa, acetinada.
Notou que Larissa começou a se erguer, afastou o rosto de onde o tivera
aninhado e olhou suavemente para o rosto dele. Então se deu conta, finalmente,
de toda a situação e, ao invés de sair do abraço e se afastar, de falar
qualquer coisa, ela voltou a se aninhar no pescoço de Celso e ficou ali
completamente imóvel, como se não tivesse despertado ainda. Mas tinha as duas
joias de azul água-marinha abertas e brilhantes de lágrimas.
Para Celso era como estar no Paraíso, seu coração batia forte e
acelerado, pensou que Larissa poderia perceber, tão forte era o batimento. Mas
deixou-se ficar assim, cingindo o corpo quente da garota, apertando-a com toda
a suavidade que podia conceber. Automaticamente levou uma mão aos cabelos
loiros e sedosos. Quando deu por si, já acariciava aquela cabecinha adorada.
Todos pararam de rir e ficaram olhando para aquela cena inesperada.
Celso sentiu-se constrangido, fez menção de afrouxar o abraço. Mas a
espanholita foi mais rápida de novo:
– Bem, pessoal, chega de folga, vamos entrar todo mundo, vamos tratar de
ver como estão aqueles bandidos. E eu vou lá liberar mamita e as meninas. E o senhor, chefe, por favor continue
segurando a Fofinha, ela parece que
voltou a si, mas eu sei que não, Se soltar a Fofinha, ela vai cair e se machucar. Vamos, vamos subir, cambada.
Não temos mais nada a fazer por aqui. Ah, e, jefito, por favor, tenha paciência com essa menina, quando ela
recuperar a consciência, ela vai morrer de vergonha de ter se deixado
aprisionar pelo bandido, de ter desmaiado, sabe como ela é.
Todos entraram no prédio e a atenção dos homens saiu daquela cena de
novela, não voltaram a pensar mais naquilo, a moça Gládis havia explicado
claramente o que acontecia.
Larissa, de olhinhos abertos, aconchegada no peito e nos braços de seu
chefe, pensava sem parar nas palavras de Gládis. Era evidente que ela tinha falado
aquilo para deixá-la à vontade nos braços de Celso. Por que? Quando Gládis
fazia ou falava algo, ele estava quilômetros à frente de todo mundo. E por que
ela mesma, Larissa, não sentia nenhuma vontade de sair de dentro do abraço do seu
chefe? O que estava sentindo era uma coisa tão boa, tão maravilhosa, que ela
ficaria assim o resto da vida. Mas o que o chefe não ia pensar dela?
Celso estava trêmulo pela primeira vez, era emoção demais estar abraçado
assim com a mulher que amava tão desesperadamente em silêncio, um amor de
encantamento e de desesperança. Bendita
espanholita, devia mais esta a ela! Tinha que juntar com dezenas de outros
momentos que ela lhe proporcionara, sólidas demonstrações de amizade e carinho.
Como poderia retribuir tanta generosidade?
Larissa achou que já tinha abusado demais da paciência de seu chefe, precisava
sair daquele conforto, daquele abraço gostoso, daquele aconchego que lhe dava
uma sensação de segurança tão grande. Surpreendeu-se pensando que aquela
sensação de segurança era a mesma que sentia quando mergulhava dessa mesma
maneira no pescoço de padrinho Fúlvio. Mas havia ali alguma coisa diferente
também. Alguma coisa que não tinha a ver só com segurança. Era com afeto, sim,
afeto, como sentia vir do padrinho. Então era certo que também o chefe gostava
dela, não só Gládis, não só Carmen, não só as outras moças.
Que sensação maravilhosa, seu chefe era o homem mais maravilhoso do
mundo, junto com padrinho Fúlvio. Não, não devia pensar assim, era ingratidão,
ele não podia ser mais maravilhoso que o padrinho. Mas era a coisa que insistia
em vir à sua cabeça. Celso Teles, seu chefe, era, sim, o homem mais maravilhoso
do mundo! Perto dele até padrinho Fúlvio ficava menor. E Leonzinho, então,
parecia só um moleque. Celso era o homem pleno!
Nunca tinha pensado nele dessa maneira. Mas algo estava mudado dentro
dela. E não tinha forças para sair daquele abraço, para parar de sentir aquela
coisa boa, que o homem mais maravilhoso do mundo também gostava dela, embora,
claro, fosse um gostar de um amigo mais velho e protetor, gostar de uma moleca
estabanada e chorona, uma incompetente, que acabava de aprontar mais uma,
desobedecendo as determinações do chefe e de Gládis, indo se meter onde não era
chamada, deixando-se apresar por aquele bandido que estava ali no chão.
Ah, se não fosse o genial Celso Teles, o que aquele bandido horroroso
não poderia ter feito com ela! Talvez a estuprasse, talvez a matasse. Sim, sim
ela devia sua vida a Celso Teles, precisava agradecer por isso agora mesmo.
Teve então forças para ao menos retirar a rosto do pescoço de Celso e
olhar para ele longamente. Tentou se afastar um pouco, mas ele não a soltava,
continuava a envolvê-la naquele abraço macio, suave, gostoso. Olhou bem para os
olhos dele e conseguiu falar, enfim:
– Ai, chefe, obrigada, obrigada, o senhor me salvou. Salvou minha vida.
Deus lhe pague.
Celso Teles não conseguia falar nada. Estava, com sempre ficava, como
que paralisado, porque seus olhos mergulharam fundo dentro das preciosas águas-marinhas
e ele se sentia entre embevecido e estupidificado.
Larissa voltou a falar:
– E me perdoe, também, por favor. Eu fui muito estúpida. Como sempre!
Disse isso olhando dentro dos olhos dele e esses olhos lhe diziam outra
coisa, afirmavam, acompanhados por um leve oscilar horizontal da cabeça, que
ela não era estúpida. E que ele a perdoava porque ele era amigo de verdade
dela, porque ela gostava dela!
Sem saber porque o fazia, ela abraçou-se mais a ele, apertou o abraço
mais e mais, no que foi correspondida por ele. Olharam-se ainda mais fundo nos
olhos, as faces muito juntas. E então o inevitável aconteceu. De repente ela
ofereceu-lhe os lábios, que ele roçou com receio e respeito.
Depois ela voltou a beijá-lo, desta vez com mais intensidade e calor.
Celso, maravilhado, retribuiu da mesma forma mais intensa. E quis dizer o que
sentia.
Mas Larissa fez que não com a cabeça. E, cada vez que ele tentava falar,
ela repetia o mesmo gesto e voltava a beijá-lo com paixão cada vez maior.
Alguma coisa tinha se rompido dentro dela, era como se houvesse um dique que
continha todo o seu sentimento e, de repente, por força daquele abraço, ele
tivesse se rompido.
Vivia agora uma sensação maravilhosa, descobria que amava aquele homem
que a segurava entre os braços, que o amava há muito tempo e não soubera
reconhecer seus próprios sentimentos. Era aquilo que Gládis, a sábia, a
bruxinha do bem, tinha insinuado, então! Claro como cristal puro: ela amava
Celso Teles!
CONTINUA
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