quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

ERA  UMA VEZ UM NOVO-RICO  
MILTON MACIEL

– Você tem direito a três pedidos. Mas, por favor, seja sério. E seja breve.

– Ahnn? Como assim três pedidos?

– Ora, seu bebum inconveniente! Três pedidos, ora bolas. E ande logo que eu tenho pouco tempo.

Aí eu olhei bem aquele maluco, que devia ter saído deu uma festa de réveillon, todo fantasiado com uma roupa meio de bichona:

– Mas quem é você, seu maluco? Que papo mais doidão! Andou cheirando todas, é?

– Não. Mas você andou bebendo todas, sua besta. Ande, faça logo seus três pedidos que o tempo está passando?

Aí eu caí na gargalhada:

– Mas você não me disse quem é. E mamãe me falou para eu não conversar com estranhos.

– E você deu para obedecer a mamãe depois dos quarenta anos, seu idiota?

– Xi! Você me ofendeu agora! Me chamou de idiota!

– E você não é?

Tive que concordar. O cara estava certo:

– Sou.

– Ainda bem que reconhece. Mas e os pedidos?

– Mas quem é você, que sabe que eu sou um idiota?

– Tá bem, tá bem. Eu me rendo. Só um idiota para não reconhecer que eu sou um gênio!

– Humm... Não sei se você é tão inteligente assim. Mas que é muito convencido, isso você é. Um gênio... Ele se acha um Einstein! Qual é o seu QI, cara?

– Pelas barbas do Profeta! Você é burro demais ou está bêbado demais? Eu sou o gênio da lâmpada, imbecil!

– Lâmpada? Que papo mais maluco, seu doidão... Que lâmpada, cara?

– A que você chutou ali na calçada, antes de tropeçar e se agarrar no poste.

– Ah, a lâmpada do poste! Ué, mas este poste não tem lâmpada, só tem um porrada de fio.

– Não, seu palerma. A lâmpada mágica que você chutou, aquele troço que está brilhando lá no chão, dou outro lado da rua.

– Aquilo é uma lata de cerveja!

– Não, imbecil, aquilo é a minha lâmpada.

– Bom, se é sua, então vai pegar. Eu chutei aquela porra sem querer, vê se não me enche por causa disso.

– E os três pedidos? Vamos lá, por Allah, os três pedidos!!!

– Allah? Profeta??? Cara, você também foi ver o Lawrence da Arábia, não é? Pobre do Peter O’Toole, tinha que morrer logo agora que todo mundo tá passando um porrada de filme dele em tudo que é lugar...

A voz que veio a seguir, gritada, era de um sujeito que tinha perdido completamente a paciência:

– Os seus pedidos!!! Faça logo os seus pedidos!!!

Aí fui eu que me queimei. Eta, sujeitinho cacete! Ninguém grita comigo assim! Falei no mesmo tom pra ele:

– Pode ser um pedido só?

– Bem, não é regulamentar... Mas... já que você quer... Na certa é mais um daqueles que acham que basta ter muito dinheiro para comprar tudo o que querem. Um pateta mesmo.

Quando vi que o abusado tinha me chamado de pateta, eu o fulminei, encerrando de vez aquele papo pinel:

– Pois eu só quero uma única coisa: Eu quero que você pare de encher o meu saco e suma de uma vez por todas da minha frente. DESAPAREÇA DA MINHA VIDA!!!

Aí foi a vez do cara: Ele me olhou como quem não acredita no que está ouvindo e deu uma sonora, uma enorme gargalhada. E começou a se desmanchar na minha frente. Virou uma espécie de nuvem de vapor, que foi diminuindo de tamanho e, atravessando a rua, se enfiou dentro daquela lata de cerveja vazia lá do outro lado.

Eu caí na gargalhada outra vez:

– Porra! Que porcaria de vodca essa que me deram lá no Carlão. Olha eu aqui, tão doido que chego a ver um grandão que me xinga e some numa latinha de cerveja amassada...

Ainda tive a impressão de ouvir a voz do cara, vindo de dentro da lata de cerveja, lá do outro lado da rua,

– Sua vontade é uma ordem, amo! Ha, ha, ha!!! Nunca vi alguém tão imbecil em cinco mil anos...

– Ora, lata de cerveja falando!... Francamente, eu tenho é que parar de beber. Pronto, esse vai ser o meu voto pra 2014! Vou parar de beber e ver se consigo ganhar uma grana pra sair dessa pindaíba infeliz...

Mas não pude segurar a terceira gargalhada:

– Ora, francamente! Lata de cerveja falando e eu prometendo deixar de beber... Só rindo mesmo.


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