MILTON MACIEL
Fim da 7a. parte:
Potira fez a mesma coisa, apontando o dedo da mãozinha delicada
para as montanhas:
– Potira Inhapuambuçu. Jaao Aramalho Inhapuambuçu?
Céus, será que ela estava perguntando se ele conhecia esse
lugar lá em cima das montanhas? Impossível! Ou será – mais impossível ainda –
que ela estava perguntando se ele queria ir até Inhapuambuçu?
8a. Parte:
Se dúvida havia,
na mesma hora ela acabou. Pois a moça fez, com o dedo indicador e o médio da
mão direita, a gesticulação típica de uma pessoa caminhando. Com o indicador da
outra mão, apontou para João Ramalho. E começou a elevar a mão direita,
mostrando que a pessoa agora subia e subia muito, numa longa escalada. Então os
dedos retomaram o movimento na horizontal, bem acima da cabeça da moça, andaram
mais um tempo e pararam. E Potira disse:
– Inhapuambuçu.
Jaao Aramalho Inhapuambuçu.
Sim! Era isso,
ela tinha sido muito clara: João Ramalho escalando a serra e andando lá em
cima, andando bastante, num evidente planalto, até chegar ao lugar onde o chefe
Tibiriçá era o cacique. E Potira, a filha do cacique, convidava João Ramalho
para ir até esse lugar. Por que seria?
O coração do
português disparou. Será que ela tinha gostado dele da mesma forma que ele
tinha gostado dela? Será que uma coisa assim era possível entre duas criaturas
tão diferentes, duas criaturas de dois mundos tão opostos? Precisava ser
prudente, estava só e desarmado no meio de centenas de gentios selvagens.
Mas o que
aquelas criaturas gentis e sorridentes, tão hospitaleiras, podiam ter de
selvagens? Elas, que o tinham recebido com a maior simpatia e liberalidade,
mostrando-se genuinamente contentes com sua presença, exceção feita, até agora,
unicamente ao mau cheiro de suas roupas e botas. Mais selvagens seriam os seus
patrícios das caravelas, que contavam apresar vários desses índios para
fazê-los trabalhar como escravos!
Mas, ainda assim,
precisava ser prudente, não conhecia nada sobre os costumes dessa gente e o pai
da moça poderia proibir que ele subisse a serra como ela sugerira a João. E, se
ele se mostrasse muito interessado em ir, o cacique poderia tomar aquilo como
uma ousadia, uma afronta, sabe-se lá o que!
Mas a surpresa
do rapaz tornou-se ainda maior quando o próprio chefe repetiu os gestos da
filha e falou em seu limitado português:
– João vai
Inhapuambuçu. Lá. Potira gosta João. João gosta Potira? Potira aisó. Potira formosa.
O português
apressou-se a responder, tentando simplificar as palavras:
– João gosta
Potira. Potira formosa. João vai Inhapuambuçu. Gosta de Potira. Gosta muito de
Potira. Potira aisó! – e essa era a sua primeira palavra intencionalmente
pronunciada em idioma tupi.
O chefe Tibiriçá
sorriu, fez um gesto de assentimento com a cabeça, e falou bem alto,
dirigindo-se agora a todos os presentes:
– João abaíba Potira. Abaíba.
A moça sorriu e
movimentou a cabeça fazendo um sim mais do que entusiasmado. E todos os índios
ali presentes se aproximaram imediatamente dela e de João Ramalho e passaram a
tocar nos braços deles, sorridentes. Era evidente que os cumprimentavam.
Abaíba? O que significaria
aquela palavra? João Ramalho ainda não sabia, mas descobriria em seguida: abaíba queria dizer NOIVO, namorado
prometido de casamento.
Enquanto ainda
eram rodeados pelas pessoas que os cumprimentavam, o português viu que várias
mulheres entravam na grande oca, trazendo diversos tipos diferentes de comidas,
frutas, carnes e peixes assados. Na mesma hora sentiu-se explodir de júbilo e
de fome. De fato, desde o almoço no navio, nada mais havia entrado em seu
estômago, exceto uma quantidade imensa de água do mar, quando começou a se
afogar.
CONTINUA
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