MILTON MACIEL
Ao pressentir o triste fim de uma romança
De forma estrófica, banal, repetitiva,
Sabia eu que o que eu olhava era minha vida
Que se arrastava, vã, monótona, esquecida.
Que era eu, senão um náufrago à deriva,
Ou um demente, a girar em louca dança?
Por ser tão só, por ter perdido a esperança
E por viver sem ter qualquer expectativa,
Eu me abismava em meu sofrer, minha ferida,
A maldizer a minha vida destruída.
Assim estava, quando notei, muito ativa
A poucos metros de mim uma criança.
Ela corria entre os carros que paravam
Num sinaleiro, por um tempo diminuto.
Pedia esmolas, com a mãozinha levantada
E a recolhia quase sempre sem ter nada.
E. mesmo quando a xingava algum bruto,
Ela sorria para todos que passavam.
Eu mal a via, os meus olhos se fecharam,
Sentei, vencido, sobre o banco de uma praça
E esqueci a menininha que esmolava.
Quando os abri, eis que ela ao meu lado estava
E era tão meiga, tão pequena, era uma graça,
Que, ao olhá-la, as minhas lágrimas secaram.
Ela sorriu-me e seu sorriso era um encanto
E ela mostrou-me contente suas mãozinhas.
Eram pequenas, delicadas, encardidas
E pareceu-me ver ali duas feridas.
Nas duas mãos ela ostentava moedinhas
E então, correndo, afastou-se do meu banco.
Logo em seguida ela voltou para o meu lado
E, triunfante, ofereceu-me o que trazia
Em sua mãozinha direita: Era um sorvete
Que eu recebi, como do céu fosse um banquete.
E compreendi que sacrifício ela fazia:
Suas moedinhas para ver-me consolado!
Então olhei para seus pezinhos descalços,
Seu vestidinho roto em vários pedaços.
Pois, mesmo assim, todas as moedas do seu dia
Ela gastara para trazer-me alegria.
Então colhi a menininha nos meus braços
E vi que os meus problemas todos... eram falsos!
Tudo mudou, naquele dia, para mim,
E uma criança evitou meu triste fim.
Hoje eu sou muito feliz, estou casado,
Duas mulheres fabulosas ao meu lado.
Reconstruí a minha vida afetiva
E a menininha... é nossa filha adotiva!
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