DIÁRIO DE UMA DIETA ATRIBULADA
Ou De como Emagrecer para Entrar num Vestido
MILTON MACIEL
POSTAGEM DE ANIVERSÁRIO: hoje, dia de São João,
nosso blog completa seu primeiro ANO de vida. Com
22 036 acessos até o amanhecer deste dia.
MUITO OBRIGADO, LEITORAS E LEITORES.
Encontrei ontem o diário ultra-secreto da Maria Regina. Passei a noite toda lendo. Indiscrição? Claro que é! Mas quem disse que eu sou discreta? E também com tudo o que aconteceu, vocês vão acabar me dando razão. Eu li tudo e vou fazer mais: vou mostrar pra todo mundo. No fim vocês vão me dar razão. Vejam só, vou mostrar aqui só algumas páginas, as mais interessantes, por que a xaropada é muito grande:
23 de Novembro. Querido diário, estou tão feliz! A Mariana me convidou para ser madrinha no casamento dela. Eu, madrinha, que maravilha! Puxa, justo a Mariana, tão pernóstica, tão metida a besta. Não, Meu Deus, que que eu estou dizendo! Não, a Marianinha é muito querida, imagina, me convidou para ser sua madrinha. Ela é um amor.
24 de Novembro. Querido diário, hoje eu tive que fazer aquilo. Tive, sim, não teve jeito. Pois é, subi numa balança! Droga, levei um susto, claro, depois de tanto tempo... Bem, eu admitia para as pessoas que estava acima do peso ideal. Quanto? Ah, uns dois quilos. Não, uns cinco talvez. Mas elas pareciam não acreditar, olhavam de um jeito tal que eu me sentia um baleia, como se tivesse dez quilos de excesso. Bem, então com a história do casamento, do vestido, sabe como é, eu tive que subir na balança. E sabe o que a desgraçada me disse: que eu estou com quinze quilos a mais. Quinze! Por isso é que eu não gosto de balança. Eu odeio balança!
27 de Novembro. Querido diário, estou animada de novo. Depois da depressão do encontro com a balança, fui à costureira e escolhi o vestido que ela vai fazer pra mim. Um arraso! Tá na cara que eu vou ficar mais bonita que qualquer outra, até que a própria noiva. Fiquei super animada. Tanto que corri para o médico e consegui ser atendida na hora, de tanto que eu fiz chantagem, que ia me matar, que estava em depressão profunda, não vou contar o resto que eu tive que fazer, mas ele me atendeu na hora. Vou entrar em dieta! Vou perder logo, logo, esses malditos quinze quilos.
1 de Dezembro. Querido diário, estou animada. Hoje é o meu quarto dia de dieta e eu estou me sentindo ótima. Acho até que vou me pesar. Estou ansiosa. Mas o médico disse pra esperar uma semana. Vais ser difícil. Eu odeio esperar!
2 de Dezembro. Querido diário, difícil é fazer essa dieta! Ontem não resisti, tive que dar uma quebradinha. Mas foi só de noite, na pizzaria com a turma. Só quatro pedaços, e olha que era rodízio. Mas hoje estou de volta ao rigor. Espartana! Eu sou forte. Tenho força de vontade!
4 de Dezembro. Querido diário, estou arrasada. Subi na maldita. Perdi peso, sim. Sabe quanto: 500 gramas! Só meio quilo depois de uma semana comendo capim e peito de frango grelhado, coisa mais insossa e horrorosa! Uma semana sem botar um chocolate, um docinho que fosse, na boca e aquela ingrata me apronta uma dessas... Eu odeio balança!
11 de Dezembro. Querido diário, a coisa vai mal. O casamento é em 14 de Janeiro. E eu tenho que estar esbelta para entrar naquele vestido maravilhoso. Ontem foi o dia da primeira prova. A costureira fez como eu pedi, bem nas medidas do manequim que eu sei que vou ter na semana do casamento. Resultado; não entrei no vestido, é claro! Saco! Pra piorar, aquela velha azeda ainda resolveu me dar lição de moral. Me esculachou, disse que eu devo estar tapeando a dieta. Quatro-olho desgraçada! Como era a segunda semana de dieta, subi de nova na maldita, só pra desfeitear aquela insolente. Pois é, eu estou dois quilos mais magra! Dois quilos! Velha nojenta...
14 de Dezembro. Querido diário, hoje tive uma recaída. Também, vi o Rodolfo com a nova namorada dele! Foi a primeira vez. Fiquei arrasada. Eu precisava de algo urgente pra esquecer. Entrei na primeira confeitaria que achei e me entupi de sorvete e torta, fiquei uma duas horas lá dentro, comendo e chorando escondida. Ainda sobrou um pouco de torta, trouxe pra casa. Hoje não tem dieta! Estou arrasada de novo. Eu odeio o Rodolfo!
18 de Dezembro. Querido diário. Hoje é dia de subir na maldita. Não vou. Não quero me aborrecer, me irritar com aquela filha da puta. Vou deixar para depois de amanhã, afinal tenho retorno ao médico mesmo. Puxa, vou ter que maneirar. Não, vou ter que fazer um puta dum esforço, senão o cara vai pegar no meu pé pra valer!
20 de Dezembro. Querido diário. Acabo de chegar do médico. Não preciso dizer nada, não é? Foi horrível. Três quilos em três semanas!... Se bem que eu acho que a balança dele deve estar bem errada, pelo menos uns três quilos a mais. Nas minhas contas, eu já devo ter perdido mais de cinco quilos. Amanhã vou até me pesar na maldita, só pra confirmar a minha certeza. Eu odeio balança de médico!
24 de Dezembro. Querido diário, estou firme como um rochedo, um poço de força de vontade. Subi na maldita e ela me disse que eu já perdi quatro quilos! Vitoriosa! Será? Quase um mês e quatro quilos? É, é pouco, o casamento é em 14 de Janeiro. E o pior é que hoje é noite de Natal. Eu adoro Natal. Como é que alguém pode ficar de dieta numa festa de Natal? Ainda mais com a montanha de coisas boas que a vai ter na casa da minha avó!
25 de Dezembro. Querido diário, eu odeio Natal!
31 de Dezembro. Querido diário, voltei à dieta pra valer depois daquele Natal desgraçado de comilança. Subi na maldita hoje: cinco quilos! Até que estaria razoável, não fosse pela noite que vem aí, não é? Noite de Ano Novo. Ah, eu adoro Ano Novo, foguetório, champanhe (sempre bebo demais) e aquele montão de coisa boas (sempre como demais).
1 de Janeiro. Querido diário, eu bebi demais. E eu comi demais... Eu odeio Ano Novo!
4 de Janeiro. Querido diário. Sabe o que a maldita teve a coragem de me dizer? Pois é, que eu continuo só nos cinco quilos. E o casamento é daqui a 10 dias! Estou entrando em desespero. Pra piorar, hoje foi o dia da segunda prova na costureira. Ah, nem vou contar como foi horrível. Eu me descontrolei (dei para andar muito nervosa ultimamente, nem pareço eu), xinguei a velha, falei que ela errou as medidas. Ela não disse nada, mas em compensação, durante a prova, me encheu de alfinetadas a toda hora. Desgraçada. Eu odeio costureiras!
5 de Janeiro. Querido diário, sonhei com chocolate a noite inteira. Um chocolatào macho, gostoso como só, eu mordia ele em cima, ele transava comigo por baixo, que sonho maravilhoso! Acho que passei a noite gozando duplamente. Acordei exausta, mas feliz, aliviada. Aí eu não subi na maldita, é claro. Tomara que eu tenha esse doce sonho gostoso outra vez esta noite. Vou até dormir mais cedo.
6 de Janeiro. Querido diário, essa dieta está acabando com os meus nervos! Tive outro sonho enorme esta noite, Mas em vez de ser a delícia do chocolatão, sonhei foi com a bruxa da costureira. E ela passou a noite toda me espetando som uns alfinetes enormes, pareciam agulhas de tricô. E rindo da minha cara. E como se não bastasse, o médico entrava no sonho, mandava eu tirar o vestido e ficava pegando nos meus peitos, mostrando pra costureira onde ela tinha que passar a tesoura para tirar o excesso. Acordei emputecidíssima, é claro!
7 de Janeiro. Querido diário, falta um semana pro maldito casamento. Não agüentei a pressão, estou nervosíssima, super chateada, super irritada! Estou aqui pensando quem foi que eu ainda não xinguei esta semana. Briguei com todo mundo! E, depois do sonho do chocolate, eu não consigo mais ficar sem a minha barrinha diária, recaída da braba. Caramba, eu preciso de doce! Eu preciso de comida! E sabe o que mais? Eu preciso de macho, tá! Tô numa secura danada desde que o Rodolfo se mandou com aquela magricela ossuda. Ah, se pelo menos eu tivesse o sonho com o chocolate de novo...
8 de Janeiro. Querido diário, sonhei com chocolate de novo! Mas dessa vez não foi legal. Nem bem transei, fiquei grávida. Em instantes eu estava com um barrigão gigantesco. E aí passei o resto da noite parindo tudo que é tipo de chocolate, até caixas enormes de dúzias eu pari. Foi horrível! Essa dieta esta acabando comigo! Acho que vou largar tudo...
9 de Janeiro. Querido diário, cinco dias para o casamento. Cinco quilos é tudo o que eu perdi, sofrendo como um condenado no deserto. É injusto! Será que Deus existe mesmo? Porque, olha, o que eu tenho rezado desde o começo dessa dieta desgraçada... Ah, que bom se eu tivesse mais tempo!... Por que essa assanhada da Mariana tinha que casar logo agora? Por que ela não adia essa droga de casamento? Ei, taí uma boa idéia. Se o casamento for adiado, eu tenho mais tempo pra emagrecer! Acho que vou pensar nisso. E quer saber que mais, querido diário? A culpa de todo esse meu sofrimento é da Mariana mesmo. Não sei por que essa pernóstica, essa emproada, essa nojentinha, foi inventar de me convidar pra madrinha.
10 de janeiro. Querido diário, essa Mariana é minha inimiga! Só pode ser, estive pensando muito. Sabe por que ela me convidou? Foi pra tirar uma onda comigo. Ela sabia que, se eu fosse madrinha, ia ter que entrar num vestido novo, ia ter que emagrecer. É isso, como é que eu não percebi na hora?! Burra, era só dizer não e ela que fosse derramar a maldade dela em cima de outra. Eu odeio a Mariana!
11 de Janeiro. Querido diário, já sei como me livrar desse pesadelo. Começa que já parei a maldita da dieta hoje mesmo. Chega! Vou pro rodízio de pizza de novo hoje. E vou comprar um monte de chocolate e de sorvete. O vestido pro casamento? Que casamento? Esquece, não haver nenhum casamento! Como? Ah, me aguarde, você não perde por esperar. Nem aquela desgraçada da Mariana. Ela vai ver o que e bom pra tosse. Nunca mais ela convida outra... digamos, levemente rechonchudinha pra madrinha de casamento. Eu odeio a Mariana!
12 de Janeiro. Querido diário, está feito! Já mandei a carta pro Antonio. É, Antonio, o noivo. Diário, me superei! Nunca mandei uma carta anônima tão bem feita como esta, palavra! Mas nem aquela que enrolou o Padre Augusto naquela investigação de pedofilia, que eu considerava minha obra prima. Estou orgulhosa de mim. Só quero ver se vai ter casamento agora! Olha, diário, as coisas que eu contei naquela carta deixam qualquer cafetina de bordel morta de vergonha. Carreguei nas tintas mesmo! Além de contar todos os podres da Mariana, que não são poucos, o que eu inventei de sacanagem deixa o livro da Bruna Surfistinha no chinelo. Eu sou um gênio. Agora aquela filha da puta vai se ferrar. Eu odeio a Mariana!
13 de Janeiro. Querido diário, o circo pegou fogo! Tá o maior escândalo na família. O corno do Antonio entrou aos berros na casa da Mariana, falou que não casa mais! Fiquei sabendo agora, a Gilda me ligou toda feliz com a fofoca. E aí aproveitou pra me contar mais umas da Mariana, que ela diz que ouviu da Amanda, que foi empregada na casa daMariana por uns tempos. Bem feito! Se eu soubesse antes...
14 de Janeiro. Querido diário, vai ter casamento!!! Pois o corno do Antonio acreditou em tudo o que a Mariana e a mãe dela contaram. Que é tudo mentira, que a menina é inocente, que é invenção de alguma maluca despeitada, de um espírito diabólico, um monte de besteiras mais. O cara é muito trouxa mesmo, vai ter a maior galhada da história de São Paulo, ele que se prepare. Se já começa relevando assim, aí mesmo é que a Mariana vai se servir. Corno manso! Eu odeio a mãe da Mariana. Eu odeio a Mariana! Eu odeio o Antônio! Eu odeio todos os cornos mansos, uns sem caráter, uns bunda–moles! Eu odeio casamento! Eu só amo o meu chocolate... Quero mais!...
Pois é, aí parou o diário, foi a última pagina. Quando aquela gorda doida entrou na igreja atrasada, depois que a cerimônia tinha começado, usando um vestido salmão que não fechava nas costas, na bunda, nas coxas, em lugar nenhum, com a roupa de baixo aparecendo, toda lambuzada de chocolate e gritando que odiava casamento, que odiava toda e qualquer pessoa ali presente cujo nome ela lembrasse, que odiava o padre, que odiava a Mariana e que odiava o Antônio... Céus, foi um Deus nos acuda! Seguraram aMaria Regina, que estava no maior surto, e chamaram socorro médico urgente. Ela saiu de lá em camisa de força, xingando o Antônio de corno manso, a Mariana de puta e entregando fácil, fácil quem tinha sido a autora da carta anônima.
Pois é, ela está internada até hoje. Por isso eu remexi nas coisas dela até encontrar o esconderijo secreto do diário. Não me arrependo. Agora vocês sabem quem é a Maria Regina. Estou contente. Eu odeio a Maria Regina!
A Mariana? Na Europa ainda, com o corno do marido, lua-de-mel. Ela me ligou ontem, falando que está meio de rolo com um sueco lindo, que está no mesmo hotel deles, em Gstaad. Essa Mariana! Maria Regina é que está certa: uma putinha!