IRACEMA:
VIRGEM E DOS LÁBIOS DE MEL?!
Um desse dias aí, por total acaso, caiu nas
minhas mãos um livro de um autor novo, um tal de José de Alencar, de quem eu
nunca tinha ouvido falar. Mas um caboclo que estava na birosca do Alves me
garantiu que o sujeito é cearense, que é amigo do Raimundo Fagner e que é primo do Pé Torto, o Cidão Alencar,
que foi centro-avante do Fortaleza. O Cidão, para quem não lembra, foi o cara
que fez o Fortaleza perder a decisão para o Ceará dois anos atrás, quando
chutou um pênalti para fora. Ganhou o apelido de Pé Torto e ganhou a porta de
saída do clube. Ah, e também ganhou e estrada e fugiu, que o pessoal do
Fortaleza queria corrigir o pé torto dele usando uma peixeira, para arrancar o
dedão fora. E, como ninguém controla turba exaltada, o Pé Torto ficou com medo
que os caras quisessem cortar mais coisas e se mandou para o Acre. Mas lá também
não tem descanso, porque cearense é que nem gaúcho, sempre tem um monte deles em
qualquer cidade deste mundo de meu Deus.
Mas o que o desastrado do Pé Torto está
fazendo aqui? Ah, sim, ele entrou porque o caboclo da birosca do Alves me disse que ele é primo do tal Zé Alencar, o
escritor. Bom o livro do cara – Iracema – tem uma história até que razoável, as mocinhas
devem gostar. Isso se entenderem a linguagem do sujeito, porque ele escreve
enfeitado pra burro, tem cada palavra mais esquisita! Na certa é daqueles que
escrevem com um dicionário do lado, só pra enfiar palavra maluca e curtir com a
cara do leitor.
Bem, só que o Zé Alencar andou escrevendo
umas bobagens. Na certa ele ouviu passarinho cantar, mas não soube onde. Algum
gaiato contou pra ele a história da Iracema e ele não entendeu direito. Ou, com
a mania que o cara tem de florear tudo, resolveu limpar a barra da índia.
A começar pela coisa da Iracema ser virgem.
O cara entendeu tudo errado. Como é que ela pode ser virgem no ramo de negócios
dela? O gaiato deve ter falado que a Iracema é DE virgem, porque esse é mesmo
signo dela. Já a Mercedita Gorda, que é a espanhola sócia dela no castelo, é de
Leão. O cara só tá certo quando escreve que a Iracema é bugra. Isso ela é
mesmo, conheci a dita cuja muitos anos atrás, quando ela era uma índia mais
novinha, ainda tinha os peitos em pé e se virava na casa da Zélia Bunda Louca.
Aí, quando a Zélia se aposentou, a índia tinha um coronel forte, um tal de
Belmiro, que era um matador de aluguel muito bem sucedido. E o cabra comprou o
bordel pra índia. E pra Mercedita, que ainda não era gorda e era cacho dele
também.
Agora, essa história da Iracema dar mole
pra português, pra brasileiro, pra turco mascate, pra todo mundo enfim... bom
isso sempre foi a alma do negócio dela, não é? Tá certo que hoje em dia, com a
velhice, com o barrigão, os dentes e os peitos caídos, mas nem garimpeiro que
está no maior atraso, meses e meses no mato sem mulher, tem coragem de se aventurar
por ali.
E é daí que vem a tal história dos lábios
de mel. Tá na cara que o gaiato contou tudo errado pro Zé Alencar, só de
gozação. Mas também, eu é que não culpo o cara. Quando é que ele podia imaginar
que aquele cearense maluco ia botar isso num livro pra mocinhas, não é mesmo?
Ou então vai ver que foi o Zé que não quis escrever a verdade, justamente
porque o livro é pra mocinhas que não têm preguiça de ler com o dicionário do
lado.
Mas eu não tenho compromisso com esse
escritor novo, nem com a velha Iracema. Tenho compromisso é com a verdade.
Então eu vou contar a história verdadeira dos lábios de mel, doa a quem doer. Quem
me contou a verdade foi a Mercedita Gorda, que ainda dá um bom caldo, numa
noite de muita batida de limão, depois da nossa função no quarto dela. Ela tava
muito tocada, muito doidona, e deu com a língua nos dentes. Me falou que a
Iracema, como não consegue mais homem nenhum, nem de graça, nem ela pagando,
começou a usar uma fórmula mágica das índias velhas da tribo dela, para se
aliviar.
A Mercedita me contou que a Iracema passa
mel lá nas partes baixas desativadas, nuns tais de lábios. E aí só fica
esperando que as formiguinhas lava-pés sintam o cheirinho do mel e subam. Então
a bugra fica horas trancada no quarto ou no banheiro, na maior gemeção, diz que
chega a sair zonza, quase desmaiada. A Mercedita diz que o barato não é dado
pelos pezinhos das formigas fazendo cócegas, mas pelas picadas que elas dão,
toda vez que Iracema se mexe de propósito, para assustar as bichinhas. Tu vê!
Bem, eu contei esse segredo e a coisa se
espalhou. Pois a Iracema até gostou, porque agora ela não precisa mais se
esconder para usar suas formigas. Tá conversando com a gente, entornando as
suas batidas de pinga com jurubeba uma atrás da outra, e tá na maior
descaração, no maior geme-geme ao mesmo tempo, revirando aqueles olhos de
catarata. E onde quer que ela vá, tem sempre um carreiro de formigas atrás
dela. Eita índia velha arretada!
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