MILTON MACIEL
– Deixe eu lhe
dizer algo sobre os Almeida. Os Almeida não são gente séria. Se você der
confiança pra eles, eles vão logo lhe pedindo dinheiro emprestado. E aí, sabe
como é...
– Os Almeida não
pagam as suas contas?
– Pagam sim.
Quem nunca paga as suas contas são os Bastos. Os Almeida só não pagam o
dinheiro que pedem emprestado, o resto eles pagam direitinho.
– Quer dizer que
eu não devo emprestar dinheiro para os Almeida e nunca vender nada fiado para
os Bastos. É isso?
– Isso mesmo,
meu rapaz, você é novo nesta vila maldita e eu me sinto na obrigação de
prevenir você contra o pessoal safado que mora por aqui.
– Puxa, eu lhe
fico muito agradecido. E tem mais gente que eu deva evitar?
– Claro, tem os
Leitão, por exemplo. Sabe, os Leitão fazem jus ao nome de família.
– Como assim?
–Ora, meu rapaz,
os Leitão são uns porcos, eles não tomam banho. Nem mesmo as meninas Leitão,
quando são novas, se lavam direito. Depois de mais velhas, então, é uma
calamidade. Se bem que não seja tão séria como os Rodrigues.
– Esses
Rodrigues também não se lavam, então?
– Claro que se lavam.
Até demais. Os Rodrigues são asseadíssimos. Mas são todos uns trambiqueiros de
marca maior. Tudo o que eles lhe oferecem é falsificado ou contrabandeado. Aí
quando você está com a mercadoria que comprou deles, aparece um fiscal, o Tato
Rodrigues e autua você. Toma a sua mercadoria. Se você reclamar, ele telefona
para o delegado Antão Rodrigues, que ameaça você com prisão. Então eles
recuperam a mercadoria e vendem para outro incauto de novo.
– Meu Deus, mas
esta vila tem muita gente mau-caráter, então!
– Como, tem
muita gente mau-caráter, meu jovem? Como você pode dizer isso, se não conhece o
pessoal todo?
– Bom, o senhor
desculpe, mas pelo que o senhor estava falando. Por favor não se ofenda...
– Ora, esta vila
tem muita gente mau-caráter, essa é boa! Meu jovem, esta vila SÓ tem gente
mau-caráter! Não escapa nenhum!
– Mas isso é alarmante! Quer dizer que tem
gente ainda pior?
– Ora, é claro,
tem os Soares, que vendem leite adulterado com uréia e soda cáustica. Os Brito,
que têm um centro espírita fajuto e uma igreja protestante. Quando um deles
prospera, eles fazem ataque com o outro e convertem as pessoas outra vez,
cobrando novos dízimos. E tem as Rocha, que exploram o puteiro local.
– Não me diga
que até no puteiro tem problema!
– Bem, depende
do seu gosto, meu rapaz. As seis meninas da casa são todas travecões. Inclusive
uma das irmãs, o Lalau Rocha.
– Deus do céu!
Mas que coisa tenebrosa. Agora só falta o senhor me dizer que tem gente ainda
pior nessa vila.
– Certamente que tem, meu jovem! Veja os
Olivença por exemplo.
– Também são
trambiqueiros?
– Ora, rapaz,
não diga uma barbaridade dessas. Os Olivença são honestíssimos nos negócios!
– Ainda bem.
Enfim uma família que se salva nesta vila tão esquisita.
– Se salva nada,
meu rapaz! Os Olivença são a família mais fofoqueira de toda a vila. Só vivem
falando mal dos outros e fazendo intrigas. Inventando calúnias. Os Olivença são
terríveis. Nunca acredite num Olivença! Nunca!
– Puxa, estou
chocado. Acho que vou repensar muito bem minha idéia de continuar negociando
por aqui.
– Faz muito bem,
meu rapaz. Muito bem. Nessa vila ninguém presta mesmo.
– Bem, pelo
menos tem o senhor, que está me avisando disso tudo. O senhor é uma pessoa
correta, considero-o meu grande benfeitor. E nem sei seu nome ainda. A quem
devo agradecer por toda esta ajuda desinteressada?
– Jairo
Olivença, meu rapaz, para servi-lo.
– Olivença?! Mas
o senhor mesmo me disse que os Olivença...
– São os maiores
fofoqueiros, intrigantes e inventores de calúnias de toda esta vila maldita.
Nunca acredite num Olivença, meu rapaz! Eles mentem o tempo todo!...
E, apertando a
mão do rapaz embasbacado, o velho Jairo Olivença partiu rapidamente, pois
estava vendo uma pessoa diferente que saía da rodoviária. Certamente outra
pessoa de fora. Precisava se apressar para lhe apresentar em primeira mão todos
os podres da gente falsa daquela vila maldita.
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