MILTON MACIEL
Fim da 13a. parte:
– Mas que ideia, João!!! Pra que nós quer as terra onde eles
tá? Terra não é de ninguém. Hoje nós tá aqui, caça, pesca, planta. Daqui pouco
tempo terra fica fraca, nós caçou muitos bicho, pescou muito peixe, ficou menos
comida. Então o que nós faz? Vai-se embora, pega outra terra um pouco mais pra
lá, onde tudo tá novo e abundante.
– Mas... E esta aldeia, por exemplo? Vocês abandonam tudo o
que construíram?
– Claro que abandona, João. Não serve pra mais nada. Nós
abandona e a aldeia vira tapera.
– Tapera?
– Sim, tapera quer dizer aldeia abandonada. João vai ver
muita tapera lá em cima, de Paranapiacaba até Piratininga tem muita.
14a. parte:
– Então vocês
não tomam as terras dos tupinambás e nem as aldeias deles!
– As terra nós
não toma, mas as aldeia, nós bota fogo.
– Ai, Jesus!
Então vocês queimam as aldeias dos inimigos. Mas por quê?
– Ora, porque
eles queima as nossa aldeia quando eles ganha.
– Por Deus, não
estou a entender nada dessas guerras de vocês! Não são guerras de conquista, as
terras não lhes interessam, as aldeias muito menos, então por que raios vocês
brigam?
– Pra se vingar,
João. Nós vai guerrear com eles pra se vingar.
– Mas se vingar
do que, criatura?
– Se vingar
porque eles invade nossas terra e, quando ganha, queima nossas aldeia e leva os
prisioneiro.
– E por que eles invadem as vossa terras,
então?
– Ora, pra se
vingar, é claro, porque nós invadimo a terra deles, queimamo aldeia deles,
pegamo prisionero.
– Santa guerra
mais doida essa de vocês! Guerra de vingança pelos dois lados?
– Sim, por que
mais nós ia brigar? Pra se vingar, é claro! E pra ver quem é o mais forte, o
mais valente.
– E o mais
forte, o mais valente, é quem ganha a guerra, pois pois?
– Mais ou menos.
Depende.
– Hom’essa! Mas
depende do que?
– Depende de
quem faz mais prisioneiro, quem pega mais homem bom, guerreiro corajoso do
inimigo.
– Muito louco,
isso! E o que vocês fazem com os prisioneiros, afinal, se eles são tão
importantes?
– Ah, nós trata eles muito bem, dá muita comida
boa, muita bebida. Depois, no dia da festa, nós mata eles e come.
– O QUE??? Comem
o prisioneiro? Vocês são canibais, então?!
– Não, João.
– Como não. Quem
come carne humana é canibal, antropófago.
– Nunca consegui
dizer esse nome difícil. Mas canibal é quem come homem pra matar fome, pra se
alimentar. Nós só come pedaço de homem muito valente, pra comemorar vitória. E
pra honrar o inimigo que a gente mata e come.
– Honrar??! Será
que eu entendi direito? Mas que honra pode haver em ser comido?
– Grande honra,
João. Quer dizer que nós, que é inimigo dele, reconhece que ele é guerreiro
muito corajoso, que nós quer comer pedaço dele pra ficar corajoso e valente
como ele, compreende?
– Não, juro que
não! Isso é impossível de aceitar, que dirá de compreender.
– Mas se João
conhece prisioneiro nosso, vai compreender tudo. Nós tem um prisioneiro aqui,
aquele que tá comendo ali naquela rede, tá vendo?
– Aquele ali?! Mas como que ele pode ser
prisioneiro, se está solto, à vontade, comendo. E rindo e brincando com os outros.
Isso é loucura demais! Se ele é prisioneiro, porque ele não foge então, se está
solto?
– Fugir, João?! Mas isso grande vergonha, nosso
prisioneiro é homem valente, nunca vai fugir, ninguém tem que ficar cuidando
dele.
– Mas eu juro
que não entendo por que razão esse estrupício não foge. Não tem amor à vida?
– Vida sem honra
não é vida, João. Ele já passou grande vergonha quando foi capturado. Agora
quer recuperar sua honra, no dia em que morrer e for comido.
– Recuperar sua
honra? Mas, mas... Isso é arrematada sandice, Deus do céu!
– Ele grita com
nós tudo na hora que vai morrer, quando um chefe importante bate com borduna na
cabeça dele. Ele grita que seus companheiro vai tudo vingar a morte dele, que é
pra nós ficar com medo, que eles vai atacar a gente e levar muito prisioneiro
pra matar e comer.
– E então?
– Então ele leva
pancada forte na cabeça, morre na mesma hora, sem sentir nenhuma dor. E aí as
mulher corta e assa as carne. E ele vai embora muito feliz, porque teve morte
de herói de verdade. E porque sabe que os companheiro dele, mais dia, menos
dia, ataca nós e vinga a morte dele.
– E isso
acontece mesmo?
– Sempre.
– Sempre?! E
você diz isso com essa calma toda... E aí, o que vocês fazem?
– Ora, nós vai
lá, ataca eles de surpresa, ganha a guerra, trás outros prisioneiro pra
comemorar. Não é simples?
– Ai, Jamari, Jamari. Isso mais parece um jogo,
um esporte. Não parece uma guerra, onde morrem muitas pessoas.
– Mas morrem
muitas pessoas! Nós perde guerreiro, inimigo também perde, muitos fica ferido.
Mas quem leva a melhor, pega logo um ou mais de um prisioneiro e foge correndo.
Aí a guerra acaba.
– Acaba?!
– Sim, acaba até
começar de novo. Não é simples? O bom é que, desse jeito, a gente não se mata
quase, as tribo tudo continua tudo cheia de gente; e as aldeia que são queimada,
se constrói outras em poucos dias...
– E vocês podem
continuar se vingando uns dos outros eternamente...
– Isso, agora
João compreendeu!
– E comendo um assado de gente também...
– Sim, mas de
gente não, que nós não é canibal. De guerreiro inimigo valente, de herói
inimigo. É só isso que nós come.
CONTINUA
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