MILTON MACIEL
80 – UMA COMPRA COM CARÁTER
Fim do cap. 78: "– Então agora você já está entendo por que eu trouxe você. Esta fazenda já está certificada, você ganha dois a quatro anos de tempo. Basta que você corra na frente e compre esta propriedade!"
– Eu? Nossa, você tem
razão amor. Eu posso agora. Eu estou tão acostumada a nunca ter dinheiro minha
vida toda, que continuo pensando como uma semimendiga, como meu pai me obrigava
a pensar. Mas é verdade, eu posso comprar isto aqui, esta maravilha, este
autêntico tesouro que o meu amor achou pra mim. Com certeza, com toda essa
fortuna que vem para o meu nome, eu posso comprar isto aqui, por mais caro que
seja.
– Não é caro, amor. O
coitado do homem precisa vender logo, está praticamente torrando tudo. É um
preço injusto e logo, logo, assim que a notícia correr, vem um desses
fazendeiros grandes e compra isto aqui de olhos fechados. E depois, é claro,
detona tudo. Não há nenhum produtor orgânico de porte em Amarante.
– Nossa, amor, quer dizer
que, se eu comprar, eu protejo a área de algum possível predador, é isso?
– Pois é isso mesmo,
minha adorada agrônoma.
– Sim, sim, querido.
Independente do que eu vier a fazer aqui, eu salvo a certificação. E ganho essa
tremenda vantagem, como prêmio.
– Isso mesmo, amor. Foi
por isso que eu, além de trazer você aqui, já fiz uma reserva, assinei uma
opção de compra com o corretor, que é o Paulo César, que você conhece. Quer
dizer, se você quiser, a fazenda é sua, meu anjo!
– Ai, amor, amor! É claro
que eu quero, eu quero sim! Ai, como você me entende, como você me ajuda, como
você é o melhor homem do mundo, meu Celsinho adorado!
E, como fazia tantas
vezes, Larissa literalmente saltou sobre Celso, montou nele com as duas pernas
apertadas quase na cintura dele e o cobriu de beijos. O que fez sua temperatura
subir de imediato.
Então Larissa, com a sua
espontaneidade incontrolável, desceu de Celso, tomou sua mão e arrastou-o para
o carro, já arrancando as roupas de ambos. Jogou-o com força no banco de trás
do Corolla, empurrando-o pelo peito, e montou já quase nua sobre ele. Desta vez
fizeram amor sem a marca registrada de Larissa, a delicadeza. Agora ela fervia
de amor e de entusiasmo, de excitação e de gratidão. Ela tomou as iniciativas e
cavalgou-o fogosamente, como uma amazona à sua montaria.
Quando estavam no segundo
round, Celso falou, timidamente:
– Cuidado, amor, é melhor
a gente não abusar. Tem o capataz por aqui, ele pode aparecer a qualquer
momento. E aí, como é que fica?
Larissa, sem perder um segundo
de atenção no que estava fazendo, falou com a maior naturalidade:
– Ora, se ele chegar, ele
espera. A gente faz que não viu o homem e termina direitinho tudo o que tem que
fazer ainda. Agora não dá pra parar, ele que tenha paciência. Ai... Amor... Ai...
O capataz não apareceu.
Ufa, melhor assim, pensou Celso. Sua menina era espontânea demais, criança
demais provavelmente, seria bem capaz de seguir fazendo amor na frente de um
estranho, sem se importar, como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.
Melhor mesmo que o homem
não tivesse aparecido. Até porque ele sabia que Celso Teles era o comprador, que
já era o novo dono. Era melhor ir embora
logo, combinar com o corretor Paulo Cesar para refazerem a transação já em nome
de Larissa. E ele, Celso, pediria para Lucas liberar o valor suficiente de uma
das contas de Larissa que eram administradas por ele e por Lucas.
Esse valor iria
diretamente para a conta de Celso, que já havia pago à vista pela fazenda. E
seu anjinho passaria a ser a dona da única fazenda de porte do município que
tinha certificação orgânica. Ele ficou emocionado ao ver que Larissa estava
fazendo a compra sem pensar em mais nada além de proteger a área e garantir que
ela continuasse habilitada oficialmente para a produção orgânica. Que caráter,
que princípios que tinha o seu anjo!
Mas, muito mais do que
isso, ele já conseguia antever o que aquela fazenda de porte médio ia
significar para o futuro de Larissa. E, segundo garantiam Maria Amália e Gládis
De Rios, para o futuro de Amarante. Ali mesmo ia começar a carreira da futura
Secretária de Agricultura e Abastecimento de Amarante. E de sua futura
prefeita, em um tempo mais longínquo.
Voltaram para a Teles
Automóveis, com Larissa comovidíssima agora, os olhos mais claros do que nunca,
orvalhados de pequenas lágrimas de felicidade, brilhando como se tivessem luz azul
própria. Uma luz daquele azul que não podia existir...
Ao chegarem, ela correu
para suas amigas, para contar a grande novidade. Gládis se fez de surpresa,
como de fato estavam todas as outras. Não disse uma só palavra para não furar,
sem querer, a historinha que Celso Teles tivesse inventado. A Fofinha tinha que ser tratada de forma
diferente, nem sempre a verdade podia ser-lhe apresentada de frente, nua e
crua. Mesmo quando era uma verdade maravilhosa de se saber, como a daquele
quase-presente de seu adorador.
Celso, por sua vez,
correu para o telefone e, de sua sala, ligou para Paulo Cesar, para combinar a
mudança dos documentos. Maravilha, tudo certo! No outro dia explicaria para sua
anjinha porque havia mandado pagar um preço bem diferente daquele que o
proprietário pedia. Ninguém como um anjo para entender isso. Ela estava
animadíssima e tranquila quanto à compra, porque ele lhe dissera que havia
assinado com o corretor uma opção de compra. Paulo Cesar confirmaria tudo
amanhã.
Marcaram o encontro para
duas da tarde, Celso fez questão de dizer que preferia passar, com Larissa, no
escritório do corretor, ao invés de esperá-lo na Teles Automóveis. Como
costumava explicar para seu pessoal, “Nós
temos que prestigiar todo profissional, é uma questão de respeito. A gente não
é melhor do que ninguém. ”
Esse era o milionário
Celso Teles, a simplicidade em pessoa. E a honestidade e o caráter, também.
Mais uma vez o comprovara horas atrás, ao fechar o negócio da compra da fazenda
que seria, agora, repassada para Lissinha.
De fato, no dia seguinte,
a caminho do escritório do corretor, Celso abriu o jogo com Larissa. Iam os
dois muito contentes no impagável fusca laranja de Lissinha, por escolha de
Celso, que, com isso, mostrava para sua anjinha o quanto gostava de tudo o que
fosse dela. Muita gente na cidade estranhava ao ver aquela dupla de pessoas
sabidamente muito ricas, andando num carrinho velho e chamativo. Ainda mais que
tinham de acostumado a ver Larissa dirigindo impressionantes SUVs enormes. E
que, mais incrível ainda, o homem era simplesmente o dono da maior revenda de
automóveis da cidade, tinha um monte de carros de luxo importados a seu dispor,
podia se exibir com qualquer Audi ou Mercedes que quisesse.
Ah,
pensavam muitos, era de homens assim que
Amarante precisava. Já pensou se esse cara vira nosso prefeito? É, sonhar não
paga imposto...
No caminho, Celso
explicou para Larissa:
– Meu anjo, a gente vai
pagar um preço um pouco mais alto pela fazenda. Mais alto do que o dono está
pedindo, compreende?
– Por que razão, meu
querido?
– Porque a fazenda vale
muito mais e o homem está torrando tudo porque precisa vender rápido. Eu não
acho isso justo. Eu sou comerciante, ganho muito nas compras que faço, mas
ganho por causa do volume das compras. Não porque eu me prevaleço da condição
desesperada do vendedor. Nunca fiz isso na vida. E nunca vou fazer. Neste caso,
o vendedor é o seu colega agrônomo e ele baixou o preço da fazenda em mais de
250 mil reais. Aí eu não aceitei o desconto, é claro.
– Meu amor, o que você
disser para eu fazer, eu faço. Se você acha que deve ser assim, assim será. E,
se eu estou entendendo direito, concordo totalmente cm você.
– Pois é, querida, a
gente tem muito dinheiro. Precisa uma vida inteira para gastar tudo, se parar
de trabalhar para ganhar mais. Então não é justo, não é ético, você se
aproveitar e espremer uma criatura para ganhar mais um pouco numa transação.
Veja, no caso desta fazenda, o coitado do seu colega não está conseguindo nem
colocar o valor do enorme esforço que ele fez para conseguir a certificação
orgânica.
Está vendendo pelo preço da terra, mais as benfeitorias, menos o enorme
desconto. Eu sou incapaz de me prevalecer dessa situação, minha moral não me
permite que eu me aproveite assim em cima de um homem correto como esse, que
investiu e valorizou tanto aquela propriedade. O que você me diz, amor? Fique à
vontade, se você pensa diferente, a gente faz do jeito que você quiser.
– Larissa parou o caro de
repente, enlaçou Celso entre seus braços, beijou-lhe os lábios com suavidade, E
falou:
– Você é o homem mais
correto deste mundo, meu amor. Há muito tempo eu já aprendi que, se a gente
quer agir direito nesta vida, é só imitar o que você faz. É verdade, eu agora
tenho uma quantidade enorme de bens, eu nem consigo imaginar direito o tamanho
da coisa toda. E eu também não quero ser mesquinha. Se a fazenda vale o que
você acha que vale, então é esse o preço que eu vou pagar. Nenhum centavo
menos.
E voltou a tocar o carro
em frente, até chegarem ao escritório do corretor Paulo Cesar. Ali as
explicações e formalidades foram todas apresentadas e o contrato foi assinado,
o corretor felicíssimo, não só com o fechamento do negócio, mas com o inesperado
e inacreditável acréscimo de preço e comissão. Eram incríveis aqueles dois
clientes riquíssimos! Jamais em sua vida ele havia visto algo assim: fazerem
questão de pagar o preço justo, abrindo mão de 250 mil reais!
Imediatamente após, dirigiram-se
todos no fusca para o tabelionato, onde a escritura foi lavrada no ato,
gentileza da oficial Mara, em reconhecimento à importância da compradora e seu ‘noivo’;
e em homenagem à inigualável e eterna Miss Amarante, agora a mais nova
fazendeira do pedaço. Sim, lembrou-se ela, não era só capricho de riquinha: a
moça era graduada em agronomia...
Quando voltaram para a
empresa, enquanto Larissa ia, toda vibrante, mostrar a escritura para padrinho Rondelli
e, depois, para Gládis e as outras moças, Celso atendeu uma ligação do exterior
que o fez dar pulos de entusiasmo:
– Chefe? – falou a eficientíssima telefonista Marisa Venturini,
jovem amarantense de apenas 19 anos, que cursava contabilidade à noite – Ligação
para o senhor. Chamada internacional. Don Diego Alarcon de Rivera, direto de Madri.
– Maravilha, Marisa. Passe
logo. E avise todo mundo para me deixarem sossegado no escritório até eu parar
de falar com esse camarada. Quando a ligação terminar, você avisa todo mundo
que eu estou disponível de novo.
Na meia hora seguinte
todo o estado-maior da Teles Automóveis, enquanto festejava a aquisição por sua
Fofinha da única fazenda orgânica de
Amarante, estava ligada na misteriosa ligação que corria a portas fechadas no
escritório do chefe. Todo mundo ardendo de curiosidade, por causa da ordem que
Celso havia dado à telefonista. Opa, alguma novidade muito importante estava no
ar. O que seria?
Imediatamente todos,
principalmente Larissa, começaram a bombardear Gládis De Rios com perguntas:
– Quem é esse espanhol,
Gládis? Você sabe.
– Não sei nada, dona Fofinha.
Nadinha mesmo.
– Hijita, essa carinha e esse sorrisinho eu conheço, sua danada. Vamos,
conte pra gente quem é o homem, o que está rolando lá no escritório do Celso?
– Ai, mamita! Se o Celso não falou nada para
ninguém, é porque ele quer que a coisa fique assim, ele vai revelar quando
achar conveniente. Lembram quantos anos
ele levou para contar que era o Romano do Milan? Por favor, eu não tenho
direito de fazer isso com meu jefito adorado. Perguntem para ele. Eu não sei
nada e pronto.
Era evidente que a
bruxinha do bem já sabia. Mas tiveram que se conformar, dali não sairia nenhuma
informação. Larissa foi a primeira a reconhecer e valorizar a atitude de sua
amiga e musa inspiradora:
– Muito bem, Gládis. Você
tem razão. Lealdade é uma coisa tão nobre! Vindo de você, não se pode esperar
outra coisa. Eu vou contar pro Celso a carga que a gente fez sobre você e como
você resistiu ao nosso ataque cruel. Ele vai adorar.
– Grácias, chiquita – respondeu Gládis, fazendo um afago no rostinho mimoso
de sua protegida. Tenham paciência. E tenham modos, nada de ficar crivando o
jefito de perguntas.
Celso apareceu minutos
depois, sorridente e enigmático. Nada comentou. E, por causa das palavras de Gládis,
ninguém – nem mesmo Larissa Silva – perguntou nada sobre o misterioso telefonema.
Ele imediatamente entrou no assunto da fazenda da Fofinha e do que poderia ser
feita ali, segundo as ideias da nova proprietária.
Lissinha levantou voo e passou
a falar animadamente sobre suas primeiras concepções, que estavam ainda mais para
sonhos do que para planos. Celso deu corda total a tudo isso e sugeriu que ela
trocasse ideias com Lucas, cuja presença mandou solicitar na mesma hora, Então
deixou Larissa entusiasmada a discutir possibilidades e ideias com o administrador
e pediu licença para se retirar.
Saiu todo sorridente
e caminhando como se andasse sobre nuvens. Gládis de Rios olhou para ele e
depois desviou sua atenção para a eufórica Larissa. Ah, Fofa, que bobinha! Nem se deu conta que o jefe a enrolou para poder
seguir com o seu mistério. É, mas agora grandes mudanças vão acontecer. É
melhor que a gente se prepare, Os tempos vão ser outros para todos. A hora de Celso Teles chegou!
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