quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

NO CAIS, O AMOR ESPERA 
MILTON MACIEL

Os dois seios alvos, no seu peito arfante,
anseiam pelos lábios febris do seu amante,
que o mar arrebatou pro Novo Mundo.
E o sonido cavo, no seu peito ardente,
é mais um soluço, que num de repente,
Irrompe como vindo de um pélago profundo.

As duas mãos vazias, aves desnorteadas,
atônitas se agitam, sonham ser tocadas,
pelas mãos ausentes do seu bem-amado.
Mas ele se foi, roubou-o a caravela,
no Tejo ele acenou, a despedir-se dela,
Foi para os Brasis, a definir seu fado.

Há mais de um ano, abisma-se ali, ela.
No cais de Lisboa, espera a caravela,
que arrastou seu homem pelo inferno aquoso.
Américo Vespúcio e Gonçalo Coelho
levaram seu amado, no seu destrambelho,
para arrostar perigos do Mar Tenebroso.

Cada nau de velas brancas que aponta no Tejo,
faz seu corpo estremecer, agoniado arpejo,
na esperança de que o rio devolva sua vida.
Por centenas de dias ela espera, aflita,
que o mar e o rio terminem a sua desdita,
que a volta do amado cure a sua ferida.

Hoje, mais uma vez, a espera deu em nada.
Outra vez amanheceu no cais, com a madrugada;
Chegaram duas naus, seus escaleres aportaram.
“Vêm dos Brasis!” bradou bem alto um marinheiro.
Ela estremeceu, até descer o homem derradeiro,
mas seus anseios, mais uma vez, se esboroaram.

Nenhum deles era ELE. Mais um dia... frustração.
Os olhos ardendo de lágrimas e sono... exaustão!
Adormeceu ali mesmo, sobre uma pedra do cais.
Sonhou que ele chegara; e, amoroso, ele a chamava.
Entreabriu os olhos. Deu um grito: Sim, ELE VOLTAVA!
Era ele que a abraçava e dizia: “Não parto nunca mais!

Amada: sofri ataques de índios, traições e emboscadas,
Picaram-se animais peçonhentos, tive pernas fraturadas,
Malignas febres buscaram tirar-me a vida mais de uma vez.
Mas juro-te, amor, nada disso doeu-me mais que tua ausência!
E, se sobrevivi, foi em ti que encontrei força e resistência,
pois eu tinha que voltar e esposar-te, por nossa honradez.

Do bendito pau-brasil, está nossa nau toda abarrotada,
ganhei muitos ducados, valeu cada dia da empreitada,
pois só agora tenho eu condições para ser o teu marido.”
Ela tremia inteira, sua alma flutuava feliz e encantada.
Quatrocentos dias de angústia, enfim, recompensada.
Valera cada dia de espera: Estava de volta o seu querido!


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