segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

2017: 10 ANOS DE KINDLE
MILTON MACIEL
Vêm aí a “Geração E”, o “E-book de 3ª Geração” e os “Dispositivos de 4ª Geração”


Há exatos 10 anos – apenas 10 anos! – 100% do mercado livreiro era alimentado exclusivamente pelos livros impressos. Os editores decidiam quais autores iriam publicar e distribuir às livrarias. Estas, face ao preço elevado de manutenção de seus espaços físicos, também contribuíam para que o número total de autores com acesso ao mercado fosse bastante limitado.

Aqueles que conseguissem altas vendagens iniciais conseguiriam ter novos títulos publicados pelas editoras. Os autores de menor sucesso inicial geralmente morriam na praia. Sua primeira publicação poderia muito bem ser a última.

Como a alta venda inicial não tem normalmente muito a ver com qualidade da obra, mas com a qualidade da PROMOÇÃO que a obra recebe e com um eventual grau de celebridade de que o autor já desfrute, essa cadeia mercadológica condenou à morte a carreira de centenas de milhares de autores novos, empurrando para a mesma vala comum os medíocres, os bons e os extraordinários. Incluindo-se aí, também – e tristemente – muitos autores já conhecidos e até consagrados literariamente, mas bons demais para serem sucessos de venda.

Não se pode dizer que isso é culpa dos editores, distribuidores e livreiros. Business is business. Produzir, distribuir, estocar e vender livros é um negócio, não um sacerdócio.

Exatamente por isso as grandes editoras no Brasil (digo no e não do, porque uma grande parte delas hoje é estrangeira) optaram pela publicação de grandes sucessos estrangeiros. Isso é ainda mais gritante na área do romance, na qual a quase totalidade dos títulos colocados pelas editoras à disposição dos leitores é maciçamente de autores norteamericanos.

Contudo, se pensarmos em termos mundiais, e não apenas nacionais, uma revolução começou em 2007, com a entrada em operação do Kindle da Amazon, o primeiro dispositivo de leitura de livros, jornais e revistas eletrônicos. A plataforma foi imediatamente estendida aos computadores pessoais, com o Kindle for PC, por exemplo. E tudo começou a mudar.

O mercado enriqueceu-se com a entrada da Apple e da Samsung, do Nook, do Kobo. E o grande salto quântico se deu quando o livro eletrônico chegou finalmente ao telefone celular e ao tablet.

Eu, por exemplo, tenho hoje no meu Samsung Galaxy mais de 100 livros só no Kindle. O preço médio que tenho pago por eles é 2,30 dólares, na Amazon dos EUA. Uns 30% deles foram baixados totalmente de graça. Faço parte de portais que disponibilizam dezenas de e-livros totalmente gratuitos todos os dias, muito mais do se pode ler. Posso acessá-los instantaneamente em meus dois celulares e em meus dois computadores de trabalho. A compra me toma poucos segundos, o download cerca de um minuto e mais outro tanto para abrir o arquivo (só na primeira vez), no Kindle de qualquer um desses dispositivos.

Ou seja, entre querer o livro e começar a lê-lo levo menos de três minutos, sempre pagando muito menos do que pelo livro físico (comprando via EUA; no Brasil, lamentavelmente, o e-book pode ser até mais caro que o livro físico, por razões que vou explorar em outro artigo).

Esperar, para mim, deixou de ser um problema. Não existe melhor companheiro na fila do banco ou da lotérica do que o seu celular carregado de livros. Que se abrem, cada um deles, exatamente onde você parou da última vez! Também notei que aqui em casa, depois que o pessoal passou a usar o celular carregado de e-books, aquela enorme pilha de livros e revistas no banheiro praticamente desapareceu.

Até mesmo na plataforma Kindle, você tem dias em que determinados livros são oferecidos gratuitamente, como técnica promocional para tornar o autor conhecido. Também se pode baixar amostras de livros, com vários capítulos. E pode-se ler milhares de livros quase de graça, pagando 10 dólares por mês e tendo acesso ao Kindle Unlimited. Funciona como um empréstimo de biblioteca, você pode ficar com até 10 livros no seu Kindle pessoal (na nuvem, na verdade). Se quiser baixar mais um, você tem que devolver um dos outros 10, simples assim. Tudo feito instantaneamente, ao simples digitar de seu teclado no computador ou no celular.

Se você pode ler 10 livros por mês, então paga 1 dólar por livro na prática. Há livros de não-ficção e livros técnicos em que me interessa apenas um determinado trecho ou técnica, de forma que leio e estudo só aquilo que me interessa e devolvo o livro em seguida, sabendo que eu posso baixá-lo de novo se precisar dele outra vez.

Falo isso tudo para mostrar a grande revolução que o e-book trouxe para o mundo do livro. Hoje, em média, 25% do mercado livreiro total é constituído por e-books. E, no campo do romance, esse percentual chega a atingir 40% em alguns meses. Contra zero por cento dez anos atrás!

O advento do e-book, com seu custo de produção, distribuição e estocagem muito próximo de zero, possibilitou um outro tipo de revolução: a ascensão do AUTOR INDEPENDENTE (o INDIE, como dizemos em inglês).

Subitamente um autor podia submeter seu texto à conversão em E-PUB, para todas as plataformas, exceto o Kindle e/ou ao MOBI  da Amazon (para o Kindle, conversão gratuita). Horas depois seu livro podia estar sendo divulgado em todas as grandes livrarias virtuais mundo afora. E o mais extraordinário: muitos começaram a vender! Isso encorajou toda uma legião de milhares que se converteram, ao longo desses anos, em centenas de milhares de novos autores.

E o fantástico foi que essas centenas de milhares foram acompanhados por um número de vários milhões de leitores. E, mais fantástico ainda, um impressionante número de leitores novos.

Um grande fator diferente a permitir essa rápida multiplicação do mercado leitor foi o PREÇO! E-books eram extremamente mais baratos que os livros impressos. E assim, muito leitor que não podia comprar mais do que um livro impresso por mês (às vezes nem isso), pôde adquirir muitos e-books, algo com que ele não poderia nem sonhar pouco tempo antes. E veio o acesso instantâneo a dezenas de milhares de e-books gratuitos. Não tinha como não acontecer uma revolução.

Muitos se entusiasmaram com a rápida explosão do mercado de e-books e chegaram a vaticinar o rápido fim do livro impresso. Contudo, em 2013, eu publiquei um ensaio ("O Futuro do livro impresso, do jornal e da revista num mundo cada vez mais digital") em que eu discordava disso. Afirmei que o velho livro físico ainda teria uma sobrevida respeitável. Ou seja, o seu declínio será constante, porém muito mais lento do que se vaticinava então.

De fato, já em 2104 o mercado de e-books nos EUA começou a dar sinais de saturação. Foi a vez das cassandras vaticinarem o ocaso do e-book. Ora, obviamente isso não iria acontecer, qualquer um com familiaridade com o mercado livreiro americano saberia disso. E de fato não aconteceu. O e-book segue seu movimento ascensional, apenas com uma aceleração menor.

Mas sou capaz de arriscar meu próprio vaticínio para uma nova e súbita arrancada do e-book no mercado mundial. Isso se dará quando o que eu chamei naquele livro de “Geração E” chegar à idade de poder ter acesso independente ao mercado comprador. Ou seja, tiver renda própria para pagar por seus próprios livros.

E o que é aquilo que chamei de “Geração E” no “O Futuro do Livro Impresso, etc...”? É justamente aquela geração de crianças que começou a ser ‘alfabetizada’, isto é, aprendeu a ler, com o auxílio do livro eletrônico e seus anexos. Centenas de milhões de tablets nas escolas nas mãos das crianças vão puxando uma outra fase da e-revolução.

Como o e-book tem escassos dez anos, a “Geração E” ainda não chegou à maioridade sequer.

Por isso eu me arrisco a “profetizar”: dentro de mais alguns anos – cinco provavelmente – nós vamos observar uma nova e súbita explosão na demanda de e-books no mundo todo. E essa nova fase, a que eu chamei de "Segunda Onda", vai coincidir com o que denominei de “E-book de 3ª Geração”, com uma plataforma unificada e universal e um grau de interatividade sequer sonhada hoje. Ela será acompanhada pelo que chamei de “Dispositivos de 4ª Geração”, os e-book readers flexíveis extremamente baratos e os celulares de tecnologia correspondente.

Então, sim, o livro impresso vai experimentar um novo baque de vendas. Mas, mesmo aí, ele ainda vai sobreviver. Porém a pendente da curva de venda/tiragem para baixo vai sinalizar um preço crescente e deixá-lo mais restrito a certos nichos em que ele permanecerá único e imbatível. 

Um paralelo existe agora: música na Nuvem, música no pen drive, música no CD - e ainda temos o velho bolachão de vinil de 33 RPM sobrevivendo galhardamente. Só o velho disco quebrável de baquelite, de 78 rotações, foi totalmente para o museu. As outras 4 gerações ainda convivem entre si.

Por outro lado, não podemos deixar de assinalar que, infelizmente, nossa geração de adoradores de livros impressos, vai envelhecer e... desaparecer aos poucos, como é lei da vida. Ou seja, o movimento não será só de expansão do público leitor da “Geração E”, mas o de encolhimento natural e inevitável da “Geração P” (a que aprendeu a ler e cresceu condicionada ao livro impresso (Printed em inglês).

Eu sou um típico dinossauro da geração P. Não só tenho paixão pelo livro físico, como tenho 34 diferentes títulos deles publicados até hoje. Contra nenhum e-book. Até este ano de 2017. Quando começa minha publicação de e-books de não-ficção e ficção nos EUA, em inglês.

Mas, mesmo nos meus livros em português, todos impressos, eu sou um Geração P um tanto diferente, porque sou um INDIE, que aprendeu a se autopublicar e vende seus livros 90% só pela Internet e em eventos. Só um desses 34 títulos diferentes foi publicado por outra editora. Os outros todos publiquei-os eu mesmo. E, se eu fui capaz de fazê-lo e continuo fazendo-o, isso sinaliza claramente que é viável, sim, é possível publicar livros físicos sem ficar preso ao antigo esquema de editora-distribuidora-livraria.

O sistema Print on demand (impressão sob encomenda), que nasceu com os Indie e para os Indie, nos permite isso: imprimimos livros em menores quantidades, em função da venda que já temos garantida previamente. Como escritores autoeditores não precisamos imobilizar grandes capitais em grandes estoques de livro físico. Temos um custo unitário mais alto, mas um custo operacional menor e uma margem de lucro muitíssimo mais alta.

Quando em 2013 montei em Miami meu curso “The Publishable Writer”, o que eu quis foi ensinar a cada autor como formatar seu livro apenas com o Word e o PDF; como criar a capa; como negociar diretamente com a gráfica no sistema print on demand e como vender o seu livro através da Internet, através da construção de sua plataforma profissional de escritor e o uso das redes sociais.

Quando eu trouxe esse curso para o Brasil, em 2014, acrescentei algo a mais: ensinar o autor a produzir e imprimir o miolo do seu livro totalmente em casa, com uso de uma impressora laser barata e com cadernos costurados com qualidade. Da gráfica deve vir apenas a capa impressa em policromia e laminada em plástico, em cartão 300 gramas. O custo total do livro torna-se extremamente acessível para o autor, o que viabiliza que ele ingresse no mercado livreiro como um autor-editor independente, um legítimo Indie bem-sucedido, com um mínimo de investimento inicial.

Na prática, neste sistema de venda pela Internet, trabalha-se com o capital fornecido pelo leitor. O livro é vendido diretamente a este e o autor-editor recebe o pagamento integral, sem dar desconto algum a intermediário, antecipado.

Muito diferente do sistema convencional, onde a venda passa pelo distribuidor e pela grande livraria, com o editor (ou o autor, se ele mesmo for o editor) sendo obrigado a dar descontos de 55% a 60% sobre o preço de capa. E recebendo do circuito varejista-atacadista (ou livreiro-distribuidor) geralmente depois de 180 dias de sua entrega dos livros – que serão, via de regra, aceitos somente em consignação e devolvidos depois de algum tempo sem venda ativa.

Pense num simples exemplo: Um livro com preço de capa de 30 reais, com 224 páginas, papel pólen, capa 4 x 0 com orelhas, laminada. Custo da gráfica: 8 reais por livro, para tiragem pequena de apenas 300 exemplares.

Na venda direta, o frete (normalmente o porte de 5,60 reais pelo correio) fica por conta do comprador. Eu o absorvo, porque minha margem de lucro é muito grande e o leitor encontraria o livro a preço de 30 reais numa livraria física. Não é justo que ele pague 35,60 pelo livro.

Então temos R$ 30,00 – 5,60 = 24,40
R$ 24,40 – 8,00 (custo de gráfica) = R$ 16,40

R$ 16, 40 x 300 livros = R$ 4 920,00

No circuito convencional, se eu for somente autor, tenho direito a 10% de comissão sobre o preço de capa. Para igualar esse 4 920 eu teria que esperar a venda de 1640 livros, que o circuito distribuidor-livreiro me pagaria Deus sabe quando.

Vender 1000 livros no Brasil é hoje considerado um ‘sucesso’ de vendas. Triste realidade! Quando comecei como um totalmente desconhecido escritor autoeditor, em 1997, publicando meu livro “Como Tornar Seu Sítio Lucrativo”, a tiragem foi a padrão da época: 5000 exemplares. Tive três reedições desse livro.

Hoje uma edição de 1000 exemplares é considerada temerária se o autor é desconhecido. Já se ele for o Jô Sores ou a Claudia Leite, o temerário será publicar menos de 20 mil.

Se, como autor-editor eu insistir no sistema convencional, vou vender meu livro com 55% de desconto sobre o preço de capa:

R$ 30,00 x 0.45 = R$ 13,50

E daí tirando custo de gráfica:

R$ 13, 50 – 8,00 = R$ 5,50

Venda de 300 livros = R$ 1 650,00
Na venda direta        = R$ 4 920,00

Ou, por outra, para receber os mesmos 1650 reais, basta que eu venda apenas 100 livros. Só que estes eu recebo à vista antecipado. Os outros, sabe-se lá quando...

Veja que eu disse se EU for autor e editor. Isso implica que todo o trabalho de digitação, revisão, formatação e editoração foi feito por mim. E a criação da capa também. É assim que eu opero.
É isso que eu ensino.

Mas se o editor não é o autor, ele tem que pagar profissionais para fazerem todos esses trabalhos (no mínimo revisor, formatador e capista) e mais 10% de direito autoral para o autor; é evidente que seu custo não vai ser só o de gráfica. Ele se verá obrigado a mandar fazer impressão de pelo menos 1000 exemplares, para ter um custo unitário de gráfica um pouco menor (R$6,70) e para ter uma amplitude maior de distribuição no mercado.

Acontece que seu custo total, acrescentando-se aí as inevitáveis despesas que ele terá com promoção e publicidade, pode chegar muito perto dos 10 reais. E sua situação seria:

R$ 30,00 (preço de capa) x 0,45 (desconto de 55%) = R$ 13,50

R$ 13,50 – 10,00 = R$ 3,50.

Se ele conseguir vender os 1000 livros (e conseguir receber o pagamento!) dentro do mesmo ano, terá um resultado líquido de 3 500 reais nesse livro. Não há incidência de IPI nem de ICMS. Já o Leão...

Ora, o editor nunca vai poder colocar os 1000 exemplares todos à venda, porque tem que distribuir cerca de 50 ou mais livros gratuitamente no circuito de promoção do livro e do autor.

Percebe-se por aí por que razão uma editora só pode sobreviver se tiver MUITOS títulos a venda por ano.

Já o Indie autoeditor, que montou uma boa plataforma na Internet, pode trabalhar com apenas poucos títulos, que reedita e atualiza à medida que os vende.  Começa com o primeiro e vai em frente.

Eu sou um Indie nesses condições e ensino meus colegas a passarem para ela. Tenho três dezenas de livros em papel e, portanto, desejo ao velho livro de papel uma longa vida. Mas, como estudante perpétuo (fiz 49 cursos nos EUA) e membro ativo do mercado livreiro há mais de duas décadas, não tenho tanta ilusão e, por isso mesmo, estou preparando meu desembarque de mala e cuia no mercado internacional de e-books. E recomendo a meus colegas que façam o mesmo.

Um(a) bom (boa) tradutor(a) (felizmente consegui o melhor!), conversão para E-PUB e publicação em todos os sistemas virtuais, upload na Amazon americana, que faz gratuitamente a conversão em MOBI, e pronto. Em menos de uma semana você alcança o planeta Terra inteiro (o mercado para livros em inglês é 250 vezes maior que o para livros em português).


Fora a tradução, tudo isso tem custo bem próximo de zero. 


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