2017: 10 ANOS DE KINDLE
MILTON
MACIEL
Vêm aí a “Geração E”, o “E-book de 3ª Geração”
e os “Dispositivos de 4ª Geração”
Há exatos 10
anos – apenas 10 anos! – 100% do mercado livreiro era alimentado exclusivamente
pelos livros impressos. Os editores decidiam quais autores iriam publicar e
distribuir às livrarias. Estas, face ao preço elevado de manutenção de seus
espaços físicos, também contribuíam para que o número total de autores com
acesso ao mercado fosse bastante limitado.
Aqueles que
conseguissem altas vendagens iniciais conseguiriam ter novos títulos publicados
pelas editoras. Os autores de menor sucesso inicial geralmente morriam na
praia. Sua primeira publicação poderia muito bem ser a última.
Como a alta
venda inicial não tem normalmente muito a ver com qualidade da obra, mas com a
qualidade da PROMOÇÃO que a obra recebe e com um eventual grau de celebridade de
que o autor já desfrute, essa cadeia mercadológica condenou à morte a carreira
de centenas de milhares de autores novos, empurrando para a mesma vala comum os
medíocres, os bons e os extraordinários. Incluindo-se aí, também – e tristemente
– muitos autores já conhecidos e até consagrados literariamente, mas bons
demais para serem sucessos de venda.
Não se pode
dizer que isso é culpa dos editores, distribuidores e livreiros. Business is business. Produzir,
distribuir, estocar e vender livros é um negócio, não um sacerdócio.
Exatamente
por isso as grandes editoras no Brasil (digo no e não do, porque uma
grande parte delas hoje é estrangeira) optaram pela publicação de grandes
sucessos estrangeiros. Isso é ainda mais gritante na área do romance, na qual a
quase totalidade dos títulos colocados pelas editoras à disposição dos leitores
é maciçamente de autores norteamericanos.
Contudo, se
pensarmos em termos mundiais, e não apenas nacionais, uma revolução começou em
2007, com a entrada em operação do Kindle da Amazon, o primeiro dispositivo de
leitura de livros, jornais e revistas eletrônicos. A plataforma foi imediatamente
estendida aos computadores pessoais, com o Kindle for PC, por exemplo. E tudo
começou a mudar.
O mercado
enriqueceu-se com a entrada da Apple e da Samsung, do Nook, do Kobo. E o grande
salto quântico se deu quando o livro eletrônico chegou finalmente ao telefone
celular e ao tablet.
Eu, por
exemplo, tenho hoje no meu Samsung Galaxy mais de 100 livros só no Kindle. O
preço médio que tenho pago por eles é 2,30 dólares, na Amazon dos EUA. Uns 30%
deles foram baixados totalmente de graça. Faço parte de portais que
disponibilizam dezenas de e-livros totalmente gratuitos todos os dias, muito mais do se pode ler. Posso acessá-los
instantaneamente em meus dois celulares e em meus dois computadores de
trabalho. A compra me toma poucos segundos, o download cerca de um minuto e
mais outro tanto para abrir o arquivo (só na primeira vez), no Kindle de qualquer
um desses dispositivos.
Ou seja, entre
querer o livro e começar a lê-lo levo menos de três minutos, sempre pagando muito
menos do que pelo livro físico (comprando via EUA; no Brasil, lamentavelmente,
o e-book pode ser até mais caro que o livro físico, por razões que vou explorar
em outro artigo).
Esperar,
para mim, deixou de ser um problema. Não existe melhor companheiro na fila do
banco ou da lotérica do que o seu celular carregado de livros. Que se abrem,
cada um deles, exatamente onde você parou da última vez! Também notei que aqui
em casa, depois que o pessoal passou a usar o celular carregado de e-books,
aquela enorme pilha de livros e revistas no banheiro praticamente desapareceu.
Até mesmo na
plataforma Kindle, você tem dias em que determinados livros são oferecidos
gratuitamente, como técnica promocional para tornar o autor conhecido. Também
se pode baixar amostras de livros, com vários capítulos. E pode-se ler milhares
de livros quase de graça, pagando 10 dólares por mês e tendo acesso ao Kindle Unlimited. Funciona como um
empréstimo de biblioteca, você pode ficar com até 10 livros no seu Kindle
pessoal (na nuvem, na verdade). Se quiser baixar mais um, você tem que devolver
um dos outros 10, simples assim. Tudo feito instantaneamente, ao simples
digitar de seu teclado no computador ou no celular.
Se você pode
ler 10 livros por mês, então paga 1 dólar por livro na prática. Há livros de
não-ficção e livros técnicos em que me interessa apenas um determinado trecho
ou técnica, de forma que leio e estudo só aquilo que me interessa e devolvo o
livro em seguida, sabendo que eu posso baixá-lo de novo se precisar dele outra
vez.
Falo isso
tudo para mostrar a grande revolução que o e-book trouxe para o mundo do livro.
Hoje, em média, 25% do mercado livreiro total é constituído por e-books. E, no
campo do romance, esse percentual chega a atingir 40% em alguns meses. Contra
zero por cento dez anos atrás!
O advento do
e-book, com seu custo de produção, distribuição e estocagem muito próximo de
zero, possibilitou um outro tipo de revolução: a ascensão do AUTOR INDEPENDENTE
(o INDIE, como dizemos em inglês).
Subitamente
um autor podia submeter seu texto à conversão em E-PUB, para todas as
plataformas, exceto o Kindle e/ou ao MOBI da Amazon (para o Kindle, conversão gratuita).
Horas depois seu livro podia estar sendo divulgado em todas as grandes
livrarias virtuais mundo afora. E o mais extraordinário: muitos começaram a
vender! Isso encorajou toda uma legião de milhares que se converteram, ao longo
desses anos, em centenas de milhares de novos autores.
E o
fantástico foi que essas centenas de milhares foram acompanhados por um número
de vários milhões de leitores. E, mais fantástico ainda, um impressionante
número de leitores novos.
Um grande
fator diferente a permitir essa rápida multiplicação do mercado leitor foi o
PREÇO! E-books eram extremamente mais baratos que os livros impressos. E assim,
muito leitor que não podia comprar mais do que um livro impresso por mês (às
vezes nem isso), pôde adquirir muitos e-books, algo com que ele não poderia nem
sonhar pouco tempo antes. E veio o acesso instantâneo a dezenas de milhares de
e-books gratuitos. Não tinha como não acontecer uma revolução.
Muitos se
entusiasmaram com a rápida explosão do mercado de e-books e chegaram a
vaticinar o rápido fim do livro impresso. Contudo, em 2013, eu publiquei um
ensaio ("O Futuro do livro impresso,
do jornal e da revista num mundo cada vez mais digital") em que eu
discordava disso. Afirmei que o velho livro físico ainda teria uma
sobrevida respeitável. Ou seja, o seu declínio será constante, porém muito mais
lento do que se vaticinava então.
De fato, já
em 2104 o mercado de e-books nos EUA começou a dar sinais de saturação. Foi a
vez das cassandras vaticinarem o ocaso do e-book. Ora, obviamente isso não iria
acontecer, qualquer um com familiaridade com o mercado livreiro americano saberia
disso. E de fato não aconteceu. O e-book segue seu movimento ascensional, apenas
com uma aceleração menor.
Mas sou
capaz de arriscar meu próprio vaticínio para uma nova e súbita arrancada do
e-book no mercado mundial. Isso se dará quando o que eu chamei naquele livro de
“Geração E” chegar à idade de poder ter acesso independente ao mercado
comprador. Ou seja, tiver renda própria para pagar por seus próprios livros.
E o que é
aquilo que chamei de “Geração E” no “O Futuro do Livro Impresso, etc...”? É
justamente aquela geração de crianças que começou a ser ‘alfabetizada’, isto é,
aprendeu a ler, com o auxílio do livro eletrônico e seus anexos. Centenas de
milhões de tablets nas escolas nas mãos das crianças vão puxando uma outra fase
da e-revolução.
Como o e-book
tem escassos dez anos, a “Geração E” ainda não chegou à maioridade sequer.
Por isso eu
me arrisco a “profetizar”: dentro de mais alguns anos – cinco provavelmente – nós
vamos observar uma nova e súbita explosão na demanda de e-books no mundo todo.
E essa nova fase, a que eu chamei de "Segunda Onda", vai coincidir com o que denominei
de “E-book de 3ª Geração”, com uma plataforma unificada e universal e um grau
de interatividade sequer sonhada hoje. Ela será acompanhada pelo que chamei de “Dispositivos
de 4ª Geração”, os e-book readers
flexíveis extremamente baratos e os celulares de tecnologia correspondente.
Então, sim,
o livro impresso vai experimentar um novo baque de vendas. Mas, mesmo aí, ele ainda
vai sobreviver. Porém a pendente da curva de venda/tiragem para baixo vai
sinalizar um preço crescente e deixá-lo mais restrito a certos nichos em que
ele permanecerá único e imbatível.
Um paralelo existe agora: música na Nuvem, música no pen drive, música no CD - e ainda temos o velho bolachão de vinil de 33 RPM sobrevivendo galhardamente. Só o velho disco quebrável de baquelite, de 78 rotações, foi totalmente para o museu. As outras 4 gerações ainda convivem entre si.
Por outro
lado, não podemos deixar de assinalar que, infelizmente, nossa geração de
adoradores de livros impressos, vai envelhecer e... desaparecer aos poucos, como é lei da vida. Ou seja, o movimento
não será só de expansão do público leitor da “Geração E”, mas o de encolhimento natural e inevitável da “Geração
P” (a que aprendeu a ler e cresceu condicionada ao livro impresso (Printed
em inglês).
Eu sou um
típico dinossauro da geração P. Não só tenho paixão pelo livro físico, como tenho
34 diferentes títulos deles publicados até hoje. Contra nenhum e-book. Até este
ano de 2017. Quando começa minha publicação de e-books de não-ficção e ficção
nos EUA, em inglês.
Mas, mesmo
nos meus livros em português, todos impressos, eu sou um Geração P um tanto
diferente, porque sou um INDIE, que aprendeu a se autopublicar e vende seus livros 90% só pela Internet e em
eventos. Só um desses 34 títulos diferentes foi publicado por outra editora. Os
outros todos publiquei-os eu mesmo. E, se eu fui capaz de fazê-lo e continuo fazendo-o, isso sinaliza
claramente que é viável, sim, é possível publicar livros físicos sem ficar preso
ao antigo esquema de editora-distribuidora-livraria.
O sistema Print on demand (impressão sob encomenda),
que nasceu com os Indie e para os Indie, nos permite isso: imprimimos livros em
menores quantidades, em função da venda que já temos garantida previamente.
Como escritores autoeditores não precisamos imobilizar grandes capitais em
grandes estoques de livro físico. Temos um custo unitário mais alto, mas um
custo operacional menor e uma margem de lucro muitíssimo mais alta.
Quando em
2013 montei em Miami meu curso “The Publishable Writer”, o que eu quis foi ensinar
a cada autor como formatar seu livro apenas com o Word e o PDF; como criar a
capa; como negociar diretamente com a gráfica no sistema print on demand e como vender o seu livro através da Internet,
através da construção de sua plataforma profissional de escritor e o uso das
redes sociais.
Quando eu
trouxe esse curso para o Brasil, em 2014, acrescentei algo a mais: ensinar o autor a produzir e imprimir o miolo do seu livro totalmente em casa, com uso de uma impressora laser barata e com
cadernos costurados com qualidade. Da gráfica deve vir apenas a capa impressa
em policromia e laminada em plástico, em cartão 300 gramas. O custo total do
livro torna-se extremamente acessível para o autor, o que viabiliza que ele
ingresse no mercado livreiro como um autor-editor independente, um legítimo Indie bem-sucedido, com um mínimo de
investimento inicial.
Na prática,
neste sistema de venda pela Internet, trabalha-se com o capital fornecido pelo
leitor. O livro é vendido diretamente a este e o autor-editor recebe o
pagamento integral, sem dar desconto algum a intermediário, antecipado.
Muito diferente
do sistema convencional, onde a venda passa pelo distribuidor e pela grande
livraria, com o editor (ou o autor, se ele mesmo for o editor) sendo obrigado a
dar descontos de 55% a 60% sobre o preço de capa. E recebendo do circuito
varejista-atacadista (ou livreiro-distribuidor) geralmente depois de 180 dias
de sua entrega dos livros – que serão, via de regra, aceitos somente em
consignação e devolvidos depois de algum tempo sem venda ativa.
Pense num
simples exemplo: Um livro com preço de capa de 30 reais, com 224 páginas, papel
pólen, capa 4 x 0 com orelhas, laminada. Custo da gráfica: 8 reais por livro,
para tiragem pequena de apenas 300 exemplares.
Na venda
direta, o frete (normalmente o porte de 5,60 reais pelo correio) fica por conta
do comprador. Eu o absorvo, porque minha margem de lucro é muito grande e o
leitor encontraria o livro a preço de 30 reais numa livraria física. Não é
justo que ele pague 35,60 pelo livro.
Então temos
R$ 30,00 – 5,60 = 24,40
R$ 24,40 –
8,00 (custo de gráfica) = R$ 16,40
R$ 16, 40 x
300 livros = R$ 4 920,00
No circuito
convencional, se eu for somente autor, tenho direito a 10% de comissão sobre o preço de capa. Para igualar esse 4 920 eu teria que esperar a venda de 1640 livros, que
o circuito distribuidor-livreiro me pagaria Deus sabe quando.
Vender 1000
livros no Brasil é hoje considerado um ‘sucesso’ de vendas. Triste realidade! Quando
comecei como um totalmente desconhecido escritor autoeditor, em 1997,
publicando meu livro “Como Tornar Seu Sítio Lucrativo”, a tiragem foi a padrão
da época: 5000 exemplares. Tive três reedições desse livro.
Hoje uma
edição de 1000 exemplares é considerada temerária se o autor é desconhecido. Já
se ele for o Jô Sores ou a Claudia Leite, o temerário será publicar menos de 20
mil.
Se, como
autor-editor eu insistir no sistema convencional, vou vender meu livro com 55%
de desconto sobre o preço de capa:
R$ 30,00 x 0.45
= R$ 13,50
E daí
tirando custo de gráfica:
R$ 13, 50 –
8,00 = R$ 5,50
Venda de 300
livros = R$ 1 650,00
Na venda
direta = R$ 4 920,00
Ou, por outra, para receber os mesmos 1650 reais, basta que eu venda apenas 100 livros. Só que estes eu recebo à vista antecipado. Os outros, sabe-se lá quando...
Veja que eu disse
se EU for autor e editor. Isso implica que todo o trabalho de digitação,
revisão, formatação e editoração foi feito por mim. E a criação da capa também.
É assim que eu opero.
É isso que eu ensino.
Mas se o
editor não é o autor, ele tem que pagar profissionais para fazerem todos esses
trabalhos (no mínimo revisor, formatador e capista) e mais 10% de direito
autoral para o autor; é evidente que seu custo não vai ser só o de gráfica. Ele
se verá obrigado a mandar fazer impressão de pelo menos 1000 exemplares, para ter
um custo unitário de gráfica um pouco menor (R$6,70) e para ter uma amplitude
maior de distribuição no mercado.
Acontece que
seu custo total, acrescentando-se aí as inevitáveis despesas que ele terá com promoção
e publicidade, pode chegar muito perto dos 10 reais. E sua situação seria:
R$ 30,00
(preço de capa) x 0,45 (desconto de 55%) = R$ 13,50
R$ 13,50 –
10,00 = R$ 3,50.
Se ele
conseguir vender os 1000 livros (e conseguir receber o pagamento!) dentro do mesmo
ano, terá um resultado líquido de 3 500 reais nesse livro. Não há incidência de
IPI nem de ICMS. Já o Leão...
Ora, o
editor nunca vai poder colocar os 1000 exemplares todos à venda, porque tem que
distribuir cerca de 50 ou mais livros gratuitamente no circuito de promoção do
livro e do autor.
Percebe-se
por aí por que razão uma editora só pode sobreviver se tiver MUITOS títulos a
venda por ano.
Já o Indie autoeditor, que montou uma boa
plataforma na Internet, pode trabalhar com apenas poucos títulos, que reedita e
atualiza à medida que os vende. Começa com o primeiro e vai em frente.
Eu sou um Indie nesses condições e ensino meus
colegas a passarem para ela. Tenho três dezenas de livros em papel e, portanto,
desejo ao velho livro de papel uma longa vida. Mas, como estudante perpétuo (fiz
49 cursos nos EUA) e membro ativo do mercado livreiro há mais de duas décadas,
não tenho tanta ilusão e, por isso mesmo, estou preparando meu desembarque de
mala e cuia no mercado internacional de e-books. E recomendo a meus colegas que
façam o mesmo.
Um(a) bom (boa)
tradutor(a) (felizmente consegui o melhor!), conversão para E-PUB e publicação
em todos os sistemas virtuais, upload na Amazon americana, que faz gratuitamente
a conversão em MOBI, e pronto. Em menos de uma semana você alcança o planeta
Terra inteiro (o mercado para livros em inglês é 250 vezes maior que o para
livros em português).
Fora a tradução,
tudo isso tem custo bem próximo de zero.