quinta-feira, 28 de março de 2024

 VOCÊ ESCREVE MAL. E DAÍ?

Isso não é desculpa para não ser um bom escritor.    

MILTON MACIEL


Você escreve mal? Ótimo! Ao menos você escreve! Escrever mal é o ponto de partida para escrever bem. Aliás, falando nisso, lembra daquela sua letrinha mis­erável, dos seus garranchos ilegíveis no primeiro ano de escola? Melhorou demais depois, não foi?

 

— NÃO?! Piorou?!... — Bem, ao menos um elogio você merece: você é uma pessoa sincera!

 

Você acha ou sabe que escreve mal. Por isso desistiu de tentar ser escritor. Pois olhe, vou lhe dizer, você foi frouxo e desistiu... antes do tempo. Deveria ter perse­verado. Se você escreve mal, isso é ótimo, é sinal que está no bom caminho.

 

Está mil furos acima de quem não escreve nada. Este, sim, nunca vai escrever direito. Você, só porque escreve mal, não tem desculpa para não se tornar um bom escritor. Isso você aprende, não nasce sabendo. Como tudo na vida.

 

Mas o que fazer então? – você pode perguntar – Tomar aulas de... gramática?

Não, é muito mais fácil. Fácil e divertido:

 

1 - LEIA um livro por semana

2 - Escreva diariamente para se exercitar

3 - Estude técnica de escrita

 

Em pouco tempo você aumenta extraordinariamente seu vocabulário, sua compreensão, seu nível de conhecimentos e assimila diferentes estilos de escrita, de diferentes escritores.

 

É só isso que você precisa fazer para evoluir de um mau para um bom escritor. Ler todos os dias. E escrever todos os dias. E estudar quase todos os dias. É como o jogador de futebol, que tem que treinar todos os dias (o que equivale ao seu escrever) e assistir jogos ou vídeos de jogos todos os dias (o seu ler, seu estudar).

 

ESCREVER TODOS OS DIAS? E A INSEGURAN­ÇA?

 

Como o jogador de futebol com seus treinos diários, se eu quero tocar piano direito, tenho que estudar e ensaiar todos os dias. Um candidato a escritor tem que fazer exatamente a mesma coisa: escrever todos os dias.

 

E sem essa que é preciso esperar pela inspiração. Como disse um grande escritor americano: “Só escrevo quan­do estou inspirado. Por isso tenho que estar inspirado todos os dias à mesma hora, às 9 da manhã”.

 

É isso. A “falta de inspiração” e o famoso ”bloqueio do escritor” são apenas MEDO. Medo de não con­seguir produzir uma coisa que OS OUTROS aprovem. Trocando em miúdos, é MEDO DOS OUTROS.

 

Ora, os outros que se danem! Como gosto de dizer, eles não pagam as minhas contas. Por que eu vou ter medo deles e lhes dar tal poder sobre minha vida?

 

Quer ver uma prova clara do que estou afirmando aqui, sobre medos dos outros e necessidade de aprovação? Vá para o Facebook ou Instagram. Ali as pessoas postam coisas que elas escrevem resumidamente, postam coisa que os outros escrevem, postam fotografias e, principalmente, repostam material de terceiros. E ficam esperando. Esperando. E esperando...

 

Esperando o que, mesmo? O CURTIR de outras pes­soas. Melhor ainda, o comentário concordante ou elo­gioso, o repostar da postagem ou repostagem delas. O que é isso que fez, faz e aumenta diariamente a fortuna pessoal (64 bilhões de dólares) de Mark Zuckerberg, o dono do Facebook?

 

É a insegurança e a necessidade de aprovação e elogio dos seres humanos normais. E a vaidade e até mesmo o narcisismo, em muitos casos, dos nem tão normais assim. Isso é muito natural. Ac­ontece conosco desde que aprendemos a fazer gracin­has, quando criancinhas, para agradar os adultos.

 

– Olha só, doutora, ela já sabe dizer mã-mã. Não é uma gracinha?

– Mas, minha senhora, isso é só um gugu-dadá!

– Sim, mas que gugu-dadá mais bonitinho! Ela quer dizer mamãe, eu sei. Não é uma gracinha?

 

Ou vem o pai orgulhoso:

– Baixa a fralda, filhão! Ele só tem quatro anos, mais um ano e já vai deixar as fraldas. Baixa aí, filhão, mostra pro vizinho o saco roxo. Isso aí puxou o pai, vai ser macho pra cacete!

 

Não admira que, anos depois, o marmanjo esteja po­stando frases machistas ou xingando pelo Facebook, para mostrar que tem aquilo roxo e poder receber um elogiozinho a mais da tribo dos seus iguais. Um like, um curtir, um comentário. Pelamordedeus!

 

A coisa continua infância afora. Aprendemos a mostrar o que rende aprovação e elogio. E a esconder muito bem o que resulta em desaprovação, rejeição ou castigo. O que contribui para criar o que Jung denominou nossa “Sombra”.

 

Quanto maior nosso grau de insegurança, quanto maior o nosso grau de vaidade ou narcisismo, mais vamos precisar da aprovação dos outros. Do curtir e dos comentários elogiosos. Não é uma gracin­ha?

 

É absolutamente normal, portanto, querer mostrar o que a gente acha que faz bem-feito e o que acha bonito. As­sim como mostrar nossa opinião, a favor ou contra seja o que for. Estamos em busca de apreciação e recon­hecimento, em busca de uma vitrine onde podemos nos expor e isso é apenas natural. Vale obviamente também para quem escreve.

Então, quando chega a hora de escrever e expor o escri­to à apreciação dos outros (aprovação, elogio, pelam­ordedeus!), os medos e os bloqueios se fazem sentir com facilidade. Porque agora você não está seguro de si mesmo, tem medo da rejeição, da crítica, do puxão de orelhas público que o desmontaria psicologicamente. Isso provoca os bloqueios e aborta no nascedouro a car­reira de muito bom escritor em potencial.

 

Portanto, meu amigo, não desista. Você escreve mal? Ótimo! Ao menos você escreve! Escrever mal é o ponto de partida para escrever bem. Como já disse, isso se aprende. E é mais fácil do que você pode supor.

 

 Já indiquei o caminho. Mas, primeiro, você precisa se descondicionar do medo atávico, que não só fica atravessado no meio do caminho do seu aprendizado como escritor, mas pode provocar grandes períodos de intenso bloqueio, quando você tenta escrever de novo.

 

E isso inclui não dar bola para o que dizem alguns dos seus desincentivadores maiores:

 

Grupo 1 – Os que afirmam que ninguém pode ensinar alguém a escrever bem. Que escritor tem um dom especial para a escrita, que já nasce feito. Uma espécie de geração espontânea, como os bebês, que, sabemos todos nós hoje em dia, graças à ciência, não são trazidos por cegonhas, mas nascem debaixo dos pés de repolho.

 

Bobagem. De todos os grandes músicos da história, poucos foram os Mozarts que podiam tocar e até compor aos 5 anos de idade. Mas, mesmo no caso excepcional de Mozart, houve o estímulo constante e a cobrança inclemente de seu pai.

 

Dondinho fez a mesma coisa com seu filho, no qual o pai, como futebolista profissional que havia sido, soube reconhecer um traço de talento incomum. O filho conta, em suas memórias, que chegava a chorar de raiva do pai e de dor no pé, de tanto que era obrigado, todo santo dia, a ficar em casa batendo bola contra a parede, só com o pé esquerdo, até que foi enfim capaz de jogar tão bem com esse pé quanto com o direito.

 

Moleque ainda, 16 anos, foi levado pelo pai para um time de futebol. Ali impressionou pela sua incrível capacidade. Tinha o apelido de Gasolina e virou uma espécie de moleque de recado para os jogadores adultos.

 

Mas começou a treinar junto com estes e uma coisa logo chamou a atenção de todos: ele treinava mais do que qualquer um dos doutros. Luzes do campo desligadas, ele ainda ensaiava cobranças de faltas sob a escassa luz do luar e da rua distante. Ele educou o seu talento, maximizando-o.

 

 Pouco depois o mundo maravilhou-se, quando ele surgiu com o nome de Pelé.

 

Grupo 2 – Os que dizem outra bobagem: que aprender a escrever se aprende só escrevendo. Você coloca uma folha ou tela em branco à sua frente, espera a inspiração e sai escrevendo. Não vá atrás disso, você vai acabar se decepcionando e desistindo sem necessidade. Você aprende a escrever da mesma forma que aprendeu a ler e a escrever na escolinha. Alguém ensinou a você. Mas só conseguiu fazê-lo porque você quis aprender. Agora é a mesma coisa. É preciso que você queira aprender. E aí você procura quem pode ensinar a você. E quem pode?

 

Em primeiro lugar, os outros escritores. E, para apren­der com eles, você só precisa LER. Mas ler muito, como quem quer mesmo aprender a escrever direito, escrever como eles escrevem.

 

É fácil, seu consciente e seu inconsciente trabalham juntos, você aprende e tam­bém assimila por osmose. Além de fácil, é divertido. E, claro, instrutivo. Você cresce muito mentalmente. 

Artigo completo publicado na REVISTA ESCREVER 

http://www.revistaescrever.com.br/educa%C3%A7%C3%A3o/7-voc%C3%AA-escreve-mal-e-da%C3%AD-2.html

quarta-feira, 27 de março de 2024

 Alimentar sua inteligência e sua emoção, divertir-se com humor e ironia. Ou tomar um copo de chopp?

Leia um ebook no seu celular, tablet, computador ou no seu Kindle. Baixe e comece a ler em menos de dois minutos. Leia sentado, deitado, caminhando, na fila do banco, na sala de espera, correndo na esteira.

Tudo isso pelo mesmo preço de um mero copo de chopp em qualquer bar! O chopp vira curtos minutos de prazer e depois vai-se embora para sempre no seu xixi.

O livro vira longas horas de prazer e depois fica para sempre em sua mente e memória, como conhecimento, cultura e motivação.

Conheça e escolha em

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segunda-feira, 25 de março de 2024

 A DÍVIDA DA PROSTITUTA

Autoria desconhecida

    Em uma pequena cidade turística, caiu uma chuva torrencial por vários dias, deixando a cidade praticamente deserta. Há tempo que a crise vinha assolando este lugar ... Todos tinham dívidas e viviam à base de crédito. 

 Por sorte, chegou um milionário com muito dinheiro, entrou no pequeno hotel e pediu um quarto, colocando no balcão R$ 1.000,00 em dinheiro vivo.

 Enquanto a recepcionista foi mostrar os quartos para o homem escolher, o dono do hotel pegou o dinheiro e saiu correndo para pagar a sua dívida de 1000 reais com o açougueiro.
 
   O açougueiro pegou o dinheiro e correu para pagar sua dívida de 1000 reais com o criador de animais.

 O criador pegou o dinheiro e correu para pagar sua dívida de 1000 reais com o Moinho, que fornecia alimento para os animais.

  O dono do moinho pegou o dinheiro e correu para pagar sua dívida de 1000 reais com a prostituta.

  A prostituta correu para pagar sua dívida de 1000 reais com  o dono do hotel, que ela utilizava para levar seus acompanhantes.

  Nesse momento o milionário voltou com a recepcionista e informou que não gostou de nenhum quarto. Pegou seu dinheiro de volta com o dono do hotel e foi embora.

   Ninguém ganhou nenhum centavo, mas todos quitaram suas dívidas. Agora toda a cidade vive sem dívidas e olha para o futuro com confiança.

MORAL DA HISTÓRIA:
SE O DINHEIRO CIRCULA NA ECONOMIA LOCAL, ACABA-SE A CRISE.

sexta-feira, 22 de março de 2024

 

FOR UNTO US A CHILD IS BORN (Pois para nós nasce uma criança)

Georg Friedrich Händel (1685-1759)
Compositor alemão, naturalizado inglês em 1815, com o nome de George FrIderik Handel

Este coral fantástico, para mim a PERFEIÇÃO absoluta, é parte do Oratório O MESSIAS, composto em 1741, do qual também faz parte o muito mais conhecido coral “Hallelujah” (Aleluia). Aqui na apresentação absolutamente perfeita da London Symphony Orchestra, sob a regência de Sir Collin Davis, e do coro Tenebrae. Simplesmente antológica!

Acrescento a letra original em inglês (para permitir que se entenda o que o coral canta), para a qual faço uma tradução para o português. A letra não é original do libretista, mas é uma cópia fiel de Isaias 9:6-7.

FOR UNTO US A CHILD IS BORN
For unto us a child is born (Pois para nós nasce uma criança)
Unto us a son is given (Para nós um filho é dado)
And the government shall be upon his shoulders (E o governo estará sobre seus ombros)
And his name shall be called (E seu nome será chamado)
Wonderful (maravilhoso)
Counselor (conselheiro)
The mighty God (o Deus poderoso)
The everlasting father (O Pai eterno)
The prince of Peace (O príncipe da paz)

(Note-se que o inglês é do século XVIII, com alguns arcaísmos, como a forma Unto us e o uso do shall para a terceira pessoa, onde hoje se usa o will.

Handel afirmou que a composição desse enorme oratório em apenas 14 dias foi feita em um tal estado alterado de consciência que ele não podia afirmar se estava no seu corpo ou fora dele. Para quem quiser conhecer mais sobre esse fenômeno, coloquei um curto texto no meu blog, já publicado em livro com o nome COMPONDO, que pode ser acessado no endereço

:
http://miltonmaciel.blogspot.com.br/…/compondo-miltonmaciel…

quarta-feira, 20 de março de 2024

PANTANAL E POEMA DE OUTONO

Música: Marcus Viana

Sintetizador Korg e piano digital: Milton Maciel



 POEMA DE OUTONO  

MILTON MACIEL  

Tomba a folha mansamente, em seu último suspiro,
Rutilante em tons de rubro, de um brilho adamantino.
Despede-se da luz, do bosque ‘inda verde, do retiro
Em que viveu sua vida e onde cumpriu o seu destino.

Vezes sem conta tragou sol, regurgitando oxigênio,
Como fazem sempre as folhas, milênio após milênio.
Generosa supriu flores, frutos, ramos, troncos, galhos,
Até fazer de sua árvore o mais frondoso dos carvalhos.

Mas então o inevitável: eis que seu ciclo terminou
E a folha, agora velha, foi perdendo a serventia.
Foi-se o verde, escureceu, perdeu seiva, ressecou
E então, se desprendendo, alcançou o último dia.

Suave flutuou ao vento, tão tranquila a trajetória,
E chegou serena ao chão, encerrando sua história.
Estendeu-se feliz: era o final, missão cumprida.
Olhou pro céu, sorriu... e despediu-se desta vida.



segunda-feira, 18 de março de 2024

 TELMA, LOIRA, ENFERMEIRA - Miniconto

MILTON MACIEL

– Fique quietinho agora. Respire bem devagar. E não tente se levantar ainda.

Para mim, parecia que aquela voz sussurrada vinha de uma outra dimensão... Mas ela me trazia de volta ao mundo real. Entreabri os olhos e deparei com um rosto simplesmente perfeito, absurdamente bonito, como eu nunca tinha visto na vida.

A dois palmos de mim, emoldurados entre cabelos loiros e brilhantes, dois olhos de um azul esverdeado quase diáfano me fitavam com candura e bondade, infundindo-me uma paz inacreditável.

Só então compreendi que eu tinha desmaiado e que aquela criatura divina, com um corpo escultural, denunciado por um conjunto de blusa e calça impecavelmente brancos, estava cuidando de mim, tratando de me reanimar.

Sim, minutos atrás eu tinha conseguido chegar ao cemitério, onde estava se dando o ato final do sepultamento do meu maior amigo. Jonas havia falecido estupidamente em um acidente de moto, algumas horas antes, naquele fatídico 12 de março de 2024.

Quando uma voz metálica e distante me deu a notícia por telefone, eu estremeci: Jonas! Não, não ele! Meu camarada de infância, colega de escola, de farra, de conquistas amorosas, de faculdade. Muito mais do que o irmão que não tive. Ultimamente a vida tinha nos afastado, com o meu trabalho me levando para uma cidade a mais de 2000 Km da nossa, de onde ele nunca quisera sair.

Foi muito difícil conseguir passagem de avião para aquela manhã e o voo ainda atrasou mais de duas horas; acabei chegando ao cemitério em cima da hora. Quando encontrei o local do sepultamento, este já estava acontecendo e cheguei no momento exato de ouvir aquele som horroroso, produzido pelas primeiras pás de terra arremessadas sobre o caixão. 

Durante toda a viagem eu tinha me portado de forma tranquila, estoicamente. Mas quando ouvi aquele barulho aterrador, tudo o que estava represado no meu consciente e no meu inconsciente extravasou num urro de fera e num ataque violento de choro convulsivo. Só então entrou, encaixou com toda brutalidade na minha mente, que Jonas estava partindo para sempre.

Comecei a ficar sem ar, tonto, vendo tudo girar à minha frente. Senti que alguém me pegava pelo braço enquanto eu estava desabando no chão. Depois toda a luz do dia se apagou e eu não sei por quanto tempo permaneci nesse estado. Só sei que agora estava recobrando a consciência, graças àquela criatura celestial à minha frente. Desejei saber quem era ela, seu nome...

Como se pudesse ouvir minha pergunta silente, a musa falou novamente, enquanto ajeitava minha cabeça no sofá onde tinham me colocado. Era evidente, então, que tinham me carregado lá de fora para aquela sala.

– Sou Telma, enfermeira. E você é o Orlando, eu sei. Pois agora fique quietinho, Orlando, descanse mais um pouquinho. Você já está bem e eu garanto que não vai ter mais nada. Ah, faz quase uma hora que eu trouxe você para cá. Lá fora está tudo acabado, mas você vai ficar bem agora.

Meus Deus, que criatura mais fantástica aquela! Que mulher maravilhosa! Eu me senti como um menino que acaba de descobrir que pode ganhar o presente mais incrível de sua vida. Desejei que ela nunca mais saísse do meu lado, era como se, de repente, eu tivesse que acreditar em algo de que sempre desdenhara: Sim, existia mesmo amor à primeira vista! Telma, minha doce Telma, levantou da cadeira onde estava sentada ao meu lado o tempo todo e disse:

– Agora eu preciso ir, Orlando. Mas daqui um instantinho você vai me encontrar de novo, certo? Só que eu quero que você seja um bom menino, fique aqui deitado mais uns dez minutos. Depois pode sair.

Vocês podem não acreditar, mas eu entrei em pânico imediatamente. Eu não queria que ela fosse, ainda que fosse reencontrá-la minutos depois. Era como se eu fosse perder a coisa mais preciosa que eu tinha descoberto na vida, algo completamente irracional. Tentei me segurar, ter um mínimo de controle. Ela parece que entendeu minha agitação, passou a mão carinhosamente pelo meu cabelo e – o céu, o êxtase! – aproximou de mim o rosto aveludado e deu-me um beijo suave e longo na face. Depois saiu, deixando no ar um suave perfume e dizendo, da porta:

– Você é muito querido, Orlando. Também eu teria gostado muito – e desapareceu.

Meu coração ficou aos pulos. Ela me beijou, me afagou! E disse que teria gostado muito... Teria... por quê? Ah, meu Deus, será que ela era casada?!

Não aguentei os dez minutos, nem bem ela sumiu da minha vista, no meio da alameda de ciprestes, eu me levantei de um salto e corri atrás dela. Chamei:

– Telma! Telma! – e corri entre as campas de grama, marcadas apenas por cruzes brancas e por lápides. Perguntei às pessoas que encontrava se tinham visto uma enfermeira loira, jovem, toda de branco. Não, ninguém tinha visto, ninguém mesmo.

Subitamente meu passo foi interrompido por algo que eu não vi. Apenas sei que tropecei no próprio ar e, para não cair, me apoiei numa enorme lápide branca, de mármore, com uma inscrição e uma grande fotografia, como quase todas ali.

E foi quando, tal qual ela havia garantido, revi Telma.

Meus olhos levaram algum tempo para se desprender daqueles olhos diáfanos, de cor azul esverdeada, que me olhavam de dentro da fotografia colorida. Olhei para as letras e elas gritaram para mim o inacreditável:

Telma de Souza

* 27/01/1987      + 11/08/2014

Saudades dos seus colegas do Hospital Universitário

Caí de joelhos no chão, abracei-me à lápide, encostei meu rosto na fotografia sob o vidro oval. Minha Telma, meu anjo loiro, tinha morrido um dia antes de Jonas! Senti que ela estava ali comigo. E senti que naquele momento, sim, seria a nossa despedida. Fiquei feliz ao lembrar que ela disse que ela também teria gostado. Como eu teria gostado tanto, tanto! Mas não foi possível... 

Depois de um longo período levantei dali na mais completa e absoluta paz. Ela tinha partido! E fui tratar de fazer o que tanto Jonas como Telma queriam que eu fizesse, tive certeza: fui continuar minha vida.

E seria uma vida diferente. Telma, ao me socorrer, salvou-me mais do que o corpo: devolveu-me a crença nas pessoas, a crença na Vida. Antes de Telma, eu era materialista, agnóstico, cínico. 

Ela precisou menos de duas horas para me mostrar que eu estava redondamente enganado!

 

domingo, 17 de março de 2024

 TRÔPEGO PASSO

Milton Maciel

Trôpego passo meu, em meio à multidão,
Onde me levas, assim lasso e cambaleante?
Haverá sina pra este meu andar errante?
Alcançarei mais do que a poeira deste chão?

Se mal me arrasto pelo passadiço angusto,
É que, perdido, meu percurso é desatino.
E, quando penso ter chegado a meu destino,
O que encontro é só meu leito de Procusto.(*)

Nele eu suporto a mais terrível das torturas,
Que é recordar seu olhar frio e indiferente,
A me dizer que o seu desprezo é permanente
E que, à frente, só terei penas mais duras.

E me prosterno neste tremedal tremendo,
Vendo que a vida se me esvai a cada instante,
Você, de mim, a cada dia mais distante,
E eu, sem você, a cada dia mais sofrendo.

Ah, e pensar que o findar das minhas penas
Ocorreria a um simples gesto seu... apenas!

(*) LEITO DE PROCUSTO: 
esse Procusto era um criminoso sádico de Elêusis, Grécia antiga. Ele recebia hóspedes em sua casa e lhes dava uma cama para dormirem. Então, se o hóspede fosse maior que a cama, amarrava-o e cortava-lhe os pés. Se fosse menor, esticava-o com cordas, num suplício horrível. Sempre tinha como se divertir, pois, na verdade, tinha dois quartos de hóspedes com camas de tamanhos bem diferentes. Teseu matou-o: amarrou-o atravessado em uma de suas camas e o fez caber, cortando-lhe as pernas e a cabeça (romântico isso, não? Ao menos os sádicos devem achar). Leito de Procusto passou para a literatura como sinônimo de ambiente de torturante sofrimento.



quinta-feira, 14 de março de 2024

 EL NENÚFAR BLANCO 

MILTON  MACIEL  -  poesías en español 
(Glossário abaixo)


Un día pasé por el lago…
Y me tuve que parar por un tiempo infinito.
El nenúfar se puso una flor blanca, diáfana
Que en el centro ardía como oro.
Alrededor las hojas verdes oscuras y brillantes.
Y abajo, en el agua calma y fría, el cielo en los reflejos.
Componia el sol el resto de un milagro de luces y colores.

Entonces me quede a mirar el nenúfar blanco
Y el, en su mudez, me habló de ti.
Y  me dijo como eras tú, tan bella y tan pura,
Tan superior, que hasta los nenúfares te amaban.
Me contó el que tú me amabas con pasión.
Me reveló que perderte fue el peor error de mi vida.

De mis ojos dos lágrimas cayeran al agua, que se crispó.
Me puse de rodillas y le respondí al nenúfar blanco:
Le dije lo grande que es mi arrepentimiento y mi dolor.
Que cuando me desperté de mi egoísmo… era tarde demás.
Que cuando te fui a buscar, te habías ido para siempre.
Que cuando me di cuenta, estaba irremediablemente solo.
Y que todo fue nada más que culpa mía. Mea culpa

Se crispó el agua otra vez, mas lágrimas caían.
El nenúfar cerró sus pétalos, uniéndolos como en una oración.
Y entendí que oraba por mí y por mi alma destrozada.
Lo hacia con la dulzura  y el puro amor de los nenúfares.
Y yo… Yo hice lo mismo con mis manos.
Las junté en oración y oré a ti.
Y te pedí perdón.
Y te dije como te amo.
Y te hable que sé que no vuelves más. Nunca más!
Y te confesé que, aún así, te voy a esperar para siempre. Todo el siempre…

El nenúfar blanco abrió entonces sus pétalos otra vez
Y de su centro de oro dos gotas se cayeron. El agua se crispó.
El nenúfar blanco lloraba mi dolor!...
Yo entonces me extendí en la orilla
Y le besé a sus pétalos uno a uno.
Y fue como si te besara!

Desde entonces vuelvo al lago todos los días.
Y los nenúfares me hablan de ti.
Y yo les hablo de ti a ellos.
Te recordamos con amor.
Te besamos en los pétalos.
Y sufrimos en paz,
En paz lloramos.
Y el agua se crispa…
Por que te amamos!

NENÚFAR (Nymphaea juno) é um tipo de lótus. 

GLOSSÁRIO:
se puso - se pôs
quede = fiquei
error = erro
rodillas = joelhos
me di cuenta = me dei conta
pétalos = pétalas
uniendolos = unindo-os
dulzura = doçura
vuelves = voltas
cayeron = caíram
lloraba = chorava
orilla = margem
besé = beijei
hablo = falo
ellos = eles


sábado, 9 de março de 2024


AS JOINVILLES NO MUNDO
MILTON MACIEL

Existem ao menos três cidades com o nome Joinville dignas de nota neste mundo: duas na França e uma no Brasil. E mais uma Ilha Joinville, que faz parte do Arquipélago de Joinville, na Antártida.

JOINVILLE do Brasil é razoavelmente conhecida pelos brasileiros. Trata-se da 3ª. maior cidade do Sul e é a maior cidade de Santa Catarina. Situada bem ao norte, tem 600 mil habitantes e se destaca pela produção industrial, assim como por sediar o maior festival de dança do mundo e ser o local da única escola do Balé Bolshoi fora da Rússia.                                                                                                                                                                                                                             (Foto 1 - Joinville-sur-Marne)
As Joinvilles da França são duas:

JOINVILLE-sur-Marne

(atenção: em francês pronuncia-se JoAn Ville, com acentuação tônica no Vi  e pronúncia rápida e mais gutural do a de Joan, quase um som de E   ʒwɛ̃vil] )   Join = Juntar   Ville = vila, cidade


Comuna do distrito (arrondissement) de Saint Dizier, no Estado (département) de Alto Marne (Haute-Marne), na região de Champagne-Ardenne. Dista 210 km de Paris

É a mais antiga e foi fundada pelo general romano Flavius Jovinus, quando mandou construir um forte de toras de madeira, em 354 A.D., para resistir às invasões dos alamanos à Gália. Este general romano é um dos personagens do meu romance histórico “Aline de Troyes, uma guerreira gaulesa” (pronuncia-se Troá), que narra as lutas de gauleses e romanos contra os alamanos, em 363 A.D. No fim desse livro coloquei um bônus com o título As Joinvilles do Mundo, que reproduzo aqui agora.

Até hoje esta Joinville é uma pequena cidade, pouco mais do que uma vila de 4 000 habitantes, mas tem uma arquitetura primorosa e uma grande beleza, com seus canais (biefs) do Rio Marne.


JOINVILLE-LE-PONT

A outra Joinville é praticamente grudada em Paris, separada dela apenas pelo Bosque de Vincennes. E ligada a Paris por uma ponte (pont), de onde vem justamente seu nome.

Comuna do distrito Nogent-sur-Marne, no Estado de Vale do Marne (Val-du-Marne), região de Île de France, onde fica também Paris. A cidade é dividida ao meio pelo rio Marne que, após passar por ela, faz um grande curva e vai se reunir ao rio Sena, na ponte Charenton, para atravessar Paris.

Esta cidade começou a surgir em 1251, quando foi construída a ponte sobre o rio Marne, tornando-se a vila de Sait Maur

Em 1831, o rei Luiz Felipe autorizou que a comuna passasse a se chamar Joinville-Le-Pont, em homenagem a Francisco (François) de Órleans, seu terceiro filho e príncipe de Joinville (título nobiliárquico este derivado da primeira Joinville, a do Alto Marne, como mostro a seguir). 

Foi ajuntado o Le-Pont ao nome Joinville, para não haver confusão desta nova Joinville com a velha Joinville do Alto Marne, cujos habitantes protestaram veementemente contra a usurpação do nome Joinville.

Esta Joinville-Le-Pont é a cidade-gêmea da Joinville do Brasil, fundada por imigrantes alemães, noruegueses e suíços que chegaram, em 1851, às terras da Colônia Dona Francisca, em Santa Catarina, terras que faziam parte do dote que a princesa Francisca Carolina Joana Carlota Leopoldina Romana Xavier de Paula Michaela Gabriela Raphaela Gonzaga de Bragança, filha de Dom Pedro I e irmã de Dom Pedro II, levou para o seu casamento com o príncipe de Joinville, François d´Órleans, em 1843.

Vemos assim que François Ferdinand deu origem a DUAS cidades com  o nome Joinville.

Levadas a uma LINHA DO TEMPO, vemos as Joinvilles assim:

354                            1251                  1831                     1851
Fundação da        Construção da   Mudança de           Fundação de
1ª Joinville por     ponte sobre       nome para              Joinville no
Flavius Jovinus    o Marne            Joinville-Le-Pont   Brasil

                                     Foto 2 - A ponte que dá nome a JOINVILLE-le-Pont

OS PRÍNCIPES DE JOINVILLE

Quase todo mundo no Brasil, inclusive os moradores da Joinville catarinense, quando veem alguma menção ao Príncipe de Joinville pensam duas coisas erradas:

1 – que ele é o único príncipe com esse título
2 – que ele nasceu em Joinville da França

Então vamos esclarecer, com especial destinação para as crianças e estudantes em geral da Joinville brasileira:

DE JOINVILLE é um gentílico e ao mesmo tempo um título nobiliárquico SENHOR (SEIGNEUR), que começou a existir no início do ano 1000 AD, atribuído a grandes senhores originalmente estabelecidos na Joinville-Sur-Marne.

Já o DE JOINVILLE de François Ferdinand (1808 a 1900), o “nosso” príncipe, é só um título nobiliárquico (PRINCE). Ela não só não nasceu em Joinville como não consta que jamais tenha estado lá.

Foram 12 Senhores de Joinville da casa de Vaux (Jean de Joinville, biógrafo de São Luís da França, foi o oitavo), seguidos de 7 senhores da casa de Vaudémont.

Em 1386 o título mudou de Seigneur para PRINCE. E os Príncipes de Joinville são, até hoje, a bagatela de 22 (9 da casa de Guise, mais 12 da casa de Orleans.  Nosso François é apenas o 17º Príncipe de Joinville, o 8º da casa de Orleans. O último e atual Príncipe de Joinville, Henri IV, nasceu em 1999, tem vinte e cinco aninhos e é também Conde de Paris.


AS JOINVILLES DA ANTÁRTIDA

Existe um arquipélago de 18 ilhas no mar da Antártida, que recebeu o nome de Arquipélago de Joinville. A maior de suas ilhas é a Ilha de Joinville. Tem 20 km de largura e 60 km de comprimento (equivalente à distância de Joinville ao Parque Beto Carrero, em linha reta). A ilha e o arquipélago não têm habitantes, o clima é frio e hostil demais.

O Arquipélago foi descoberto em 1838 pelo navegador francês Capitão Jules Dumont d'Urville, que dirigia uma expedição marítima chama Príncipe de Joinville, em homenagem a François Ferdinand d’Orléans, terceiro filho do Duque d’Orléans, o Rei Luís Filipe I de França.

d`Urville sapecou o nome Joinville em suas descobertas, e, mais tarde, ele foi também homenageado: hoje a segunda maior ilha do arquipélago é a Ilha d’Urville.

Mais uma vez o “nosso” príncipe cumpriu o seu estranho destino de proporcionar nomes às Joinvilles do mundo: Joinville-le-Pont, Joinville do Brasil e Ilha e Arquipélago de Joinville - lugares em que ele NUNCA ESTEVE !

                                       Foto 3 - Cientistas na Ilha de Joinville, Antártida