TERMINEI !
MILTON MACIEL
Está
escrito o meu 10o romance, “A GUERRA DE JACQUES”. Acabei esta noite,
às 3 da manhã, depois de escrever as últimas 64 páginas em dois dias, ritmo de
batucada, 440 páginas totais. Três dias inteiros sem tocar piano, teclado só de computador!
Começou para
ser mais um dos livros que escrevo como “ghost
writer”, escritor fantasma, onde meu nome não aparece como autor. Mas os
clientes, lá pela metade do trabalho, me pediram para que eu figurasse como
co-autor.
Foi
memorável. Estudei e pesquisei como um louco, li 12 livros em um mês, deixei o Dr.
Google enfarado de tanto me ver: a história se passava nos últimos anos da 2ª
Guerra Mundial e eu ignorava muitos dos seus horrores! Estudei mais de 50 mapas, assisti dezenas de filmes e vídeos.
Então comecei a escrever. Saltei de
trens que, atravessando Bélgica e Holanda, levavam prisioneiros belgas e
franceses para o trabalho escravo na Alemanha. Bombardeei cidades inglesas e
alemãs, destruí incontáveis Stukas, Spitfires, Messerschmitts e fortalezas
voadores B-29 em tremendas batalhas aéreas. Esmaguei Londres, Bruxelas e
Antuérpia com bombas voadoras V1 e V2. Destruí altos fornos, aciarias,
estradas, pontes, ferrovias, represas, botei abaixo hospitais lotados, escolas,
edifícios, casas humildes, dizimei exércitos e populações civis inocentes aos
milhares e milhares. Sem piedade. Porque EU era a Guerra!
Mas, no
fim, fui derrotado, porque a trama é uma história de AMOR. Do amor entre um
rapaz e uma moça da Bélgica que, unidos, vencem dez vezes a morte e mil vezes a
desesperança; em Bruxelas, em Essen, Alemanha, em Paris, França, a bordo de um
navio mercante no Atlântico e na nova pátria que os acolheu amorosamente, por
onde entraram pelo Rio de Janeiro para irem viver todo o resto de suas longas vidas na
São Paulo da garoa. A história é baseada em pessoas e fatos da vida real! Ela
me foi encomendada pelos filhos brasileiros, hoje sexagenários, desse casal de
heróis da Resistência Belga.
Agora vou
para aquele período de umbral, em que sinto uma falta brutal de Jacques e de
Loulou, de Phillipe Delmas e Émile Heide, de Lucien, Mireille, Jean Pierre
Tissot, do Coronel Parucker da Wermacht, do cabo Dieter Maluco da SS, de
Copacabana, do Zé Carioca, do cônsul belga em São Paulo, Lars Verlinde, que
ensina a Jacques porque se deve amar o Brasil. Vivi meses com eles todos os
dias, tornaram-se parte de mim. Ou eu, deles. Vou ficar muitos dias sem poder criar
personagens novos, porque estou ainda em íntima comunhão com os de Jacques
Rosen.
É um período
muito estranho esse. Assisti à gravação de uma entrevista de Clarice Lispector,
aos seus 56 anos (faleceria um ano depois), em que ela dizia que estava MORTA,
que só voltava a viver quando começava a escrever de novo. Sei muito bem o que
ela quis dizer. Uma parte de nós morre junto com o fim da nossa história.
Mas,
felizmente, renasce depois, quando novos personagens começam a nascer ainda
hesitantes dos nossos dedos aflitos nos teclados, para encenarem novas histórias
que nos levarão novamente a viver, florescer e morrer, ad infinitum, até o fim da nossa finitude.
Joinville,
16/4/17 MM
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