Ou De como Emagrecer para Entrar num Vestido
Encontrei ontem o diário ultra-secreto da Mari a
 Regina. Passei a noite toda lendo. Indiscrição? Claro que é! Mas quem 
disse que eu sou discreta? E também com tudo o que aconteceu, vocês vão 
acabar me dando razão. Eu li tudo e vou fazer mais: vou mostrar pra todo
 mundo. No fim vocês vão me dar razão. Vejam só, vou mostrar aqui só 
algumas páginas, as mais interessantes, por que a xaropada é muito 
grande:
23 de Novembro. Querido diário, estou tão feliz! A Mari ana me convidou para ser madrinha no casamento dela. Eu, madrinha, que maravilha! Puxa, justo a Mari ana, tão pernóstica, tão metida a besta. Não, Meu Deus, que que eu estou dizendo! Não, a Mari aninha é muito querida, imagina, me convidou para ser sua madrinha. Ela é um amor.
24 de Novembro. Querido
 diário, hoje eu tive que fazer aquilo. Tive, sim, não teve jeito. Pois 
é, subi numa balança! Droga, levei um susto, claro, depois de tanto 
tempo... Bem, eu admitia para as pessoas que estava acima do peso ideal.
 Quanto? Ah, uns dois quilos. Não, uns cinco talvez. Mas elas pareciam 
não acreditar, olhavam de um jeito tal que eu me sentia um baleia, como 
se tivesse dez quilos de excesso. Bem, então com a história do 
casamento, do vestido, sabe como é, eu tive que subir na balança. E sabe
 o que a desgraçada me disse: que eu estou com quinze quilos a mais. 
Quinze! Por isso é que eu não gosto de balança. Eu odeio balança!
27 de Novembro. 
Querido diário, estou animada de novo. Depois da depressão do encontro 
com a balança, fui à costureira e escolhi o vestido que ela vai fazer 
pra mim. Um arraso! Tá na cara que eu vou ficar mais bonita que qualquer
 outra, até que a própria noiva. Fiquei super animada. Tanto que corri 
para o médico e consegui ser atendida na hora, de tanto que eu fiz 
chantagem, que ia me matar, que estava em depressão profunda, não vou 
contar o resto que eu tive que fazer, mas ele me atendeu na hora. Vou 
entrar em dieta! Vou perder logo, logo, esses malditos quinze quilos.
1 de Dezembro. 
Querido diário, estou animada. Hoje é o meu quarto dia de dieta e eu 
estou me sentindo ótima. Acho até que vou me pesar. Estou ansiosa. Mas o
 médico disse pra esperar uma semana. Vais ser difícil. Eu odeio 
esperar!
2 de Dezembro. 
Querido diário, difícil é fazer essa dieta! Ontem não resisti, tive que 
dar uma quebradinha. Mas foi só de noite, na pizzaria com a turma. Só 
quatro pedaços, e olha que era rodízio. Mas hoje estou de volta ao 
rigor. Espartana! Eu sou forte. Tenho força de vontade!
4 de Dezembro. Querido diário, estou arrasada. Subi na maldita. Perdi peso, sim. Sabe quanto: 500 gramas !
 Só meio quilo depois de uma semana comendo capim e peito de frango 
grelhado, coisa mais insossa e horrorosa! Uma semana sem botar um 
chocolate, um docinho que fosse, na boca e aquela ingrata me apronta uma
 dessas... Eu odeio balança!
11 de Dezembro. 
Querido diário, a coisa vai mal. O casamento é em 14 de Janeiro. E eu 
tenho que estar esbelta para entrar naquele vestido maravilhoso. Ontem 
foi o dia da primeira prova. A costureira fez como eu pedi, bem nas 
medidas do manequim que eu sei que vou ter na semana do casamento. 
Resultado; não entrei no vestido, é claro! Saco! Pra piorar, aquela 
velha azeda ainda resolveu me dar lição de moral. Me esculachou, disse 
que eu devo estar tapeando a dieta. Quatro-olho desgraçada! Como era a 
segunda semana de dieta, subi de nova na maldita, só pra desfeitear 
aquela insolente. Pois é, eu estou dois quilos mais magra! Dois quilos! 
Velha nojenta...
14 de Dezembro. 
Querido diário, hoje tive uma recaída. Também, vi o Rodolfo com a nova 
namorada dele! Foi a primeira vez. Fiquei arrasada. Eu precisava de algo
 urgente pra esquecer. Entrei na primeira confeitaria que achei e me 
entupi de sorvete e torta, fiquei uma duas horas lá dentro, comendo e 
chorando escondida. Ainda sobrou um pouco de torta, trouxe pra casa. 
Hoje não tem dieta! Estou arrasada de novo. Eu odeio o Rodolfo!
18 de Dezembro. 
Querido diário. Hoje é dia de subir na maldita. Não vou. Não quero me 
aborrecer, me irritar com aquela filha da puta. Vou deixar para depois 
de amanhã, afinal tenho retorno ao médico mesmo. Puxa, vou ter que 
maneirar. Não, vou ter que fazer um puta dum esforço, senão o cara vai 
pegar no meu pé pra valer!
20 de Dezembro. 
Querido diário. Acabo de chegar do médico. Não preciso dizer nada, não 
é? Foi horrível. Três quilos em três semanas!... Se bem que eu acho que a
 balança dele deve estar bem errada, pelo menos uns três quilos a mais. 
Nas minhas contas, eu já devo ter perdido mais de cinco quilos. Amanhã 
vou até me pesar na maldita, só pra confirmar a minha certeza. Eu odeio 
balança de médico!
24 de Dezembro. 
Querido diário, estou firme como um rochedo, um poço de força de 
vontade. Subi na maldita e ela me disse que eu já perdi quatro quilos! 
Vitoriosa! Será? Quase um mês e quatro quilos? É, é pouco, o casamento é
 em 14 de Janeiro. E o pior é que hoje é noite de Natal. Eu adoro Natal.
 Como é que alguém pode ficar de dieta numa festa de Natal? Ainda mais 
com a montanha de coisas boas que a vai ter na casa da minha avó!
25 de Dezembro. Querido diário, eu odeio Natal!
31 de Dezembro. 
Querido diário, voltei à dieta pra valer depois daquele Natal desgraçado
 de comilança. Subi na maldita hoje: cinco quilos! Até que estaria 
razoável, não fosse pela noite que vem aí, não é? Noite de Ano Novo. Ah,
 eu adoro Ano Novo, foguetório, champanhe (sempre bebo demais) e aquele 
montão de coisa boas (sempre como demais).
1 de Janeiro. Querido diário, eu bebi demais. E eu comi demais... Eu odeio Ano Novo!
4 de Janeiro. 
Querido diário. Sabe o que a maldita teve a coragem de me dizer? Pois é,
 que eu continuo só nos cinco quilos. E o casamento é daqui a 10 dias! 
Estou entrando em desespero. Pra  piorar,
 hoje foi o dia da segunda prova na costureira. Ah, nem vou contar como 
foi horrível. Eu me descontrolei (dei para andar muito nervosa 
ultimamente, nem pareço eu), xinguei a velha, falei que ela errou as 
medidas. Ela não disse nada, mas em compensação, durante a prova, me 
encheu de alfinetadas a toda hora. Desgraçada. Eu odeio costureiras!
5 de Janeiro. 
Querido diário, sonhei com chocolate a noite inteira. Um chocolatào 
macho, gostoso como só, eu mordia ele em cima, ele transava comigo por 
baixo, que sonho maravilhoso! Acho que passei a noite gozando 
duplamente. Acordei exausta, mas feliz, aliviada. Aí eu não subi na 
maldita, é claro. Tomara que eu tenha esse doce sonho gostoso outra vez 
esta noite. Vou até dormir mais cedo.
6 de Janeiro. Querido
 diário, essa dieta está acabando com os meus nervos! Tive outro sonho 
enorme esta noite, Mas em vez de ser a delícia do chocolatão, sonhei foi
 com a bruxa da costureira. E ela passou a noite toda me espetando som 
uns alfinetes enormes, pareciam agulhas de tricô. E rindo da minha cara.
 E como se não bastasse, o médico entrava no sonho, mandava eu tirar o 
vestido e ficava pegando nos meus peitos, mostrando pra costureira onde 
ela tinha que passar a tesoura para tirar o excesso. Acordei 
emputecidíssima, é claro!
7 de Janeiro. 
Querido diário, falta um semana pro maldito casamento. Não agüentei a 
pressão, estou nervosíssima, super chateada, super irritada! Estou aqui 
pensando quem foi que eu ainda não xinguei esta semana. Briguei com todo
 mundo! E, depois do sonho do chocolate, eu não consigo mais ficar sem a
 minha barrinha diária, recaída da braba. Caramba, eu preciso de doce! 
Eu preciso de comida! E sabe o que mais? Eu preciso de macho, tá! Tô 
numa secura danada desde que o Rodolfo se mandou com aquela magricela 
ossuda. Ah, se pelo menos eu  tivesse o sonho com o chocolate de novo...
8 de Janeiro. 
Querido diário, sonhei com chocolate de novo! Mas dessa vez não foi 
legal. Nem bem transei, fiquei grávida. Em instantes eu estava com um 
barrigão gigantesco. E aí passei o resto da noite parindo tudo que é 
tipo de chocolate, até caixas enormes de dúzias eu pari. Foi horrível! 
Essa dieta esta acabando comigo! Acho que vou largar tudo...
9 de Janeiro. 
Querido diário, cinco dias para o casamento. Cinco quilos é tudo o que 
eu perdi, sofrendo como um condenado no deserto. É injusto! Será que 
Deus existe mesmo? Porque, olha, o que eu tenho rezado desde o começo 
dessa dieta desgraçada... Ah, que bom se eu tivesse mais tempo!... Por 
que essa assanhada da Mari ana
 tinha que casar logo agora? Por que ela não adia essa droga de 
casamento? Ei, taí uma boa idéia. Se o casamento for adiado, eu tenho 
mais tempo pra emagrecer! Acho que vou pensar nisso. E quer saber que 
mais, querido diário? A culpa de todo esse meu sofrimento é da Mari ana mesmo. Não sei por que essa pernóstica, essa emproada, essa nojentinha, foi inventar de me convidar pra madrinha.
10 de janeiro. Querido diário, essa Mari ana
 é minha inimiga! Só pode ser, estive pensando muito. Sabe por que ela 
me convidou? Foi pra tirar uma onda comigo. Ela sabia que, se eu fosse 
madrinha, ia ter que entrar num vestido novo, ia ter que emagrecer. É 
isso, como é que eu não percebi na hora?! Burra, era só dizer não e ela 
que fosse derramar a maldade dela em cima de outra. Eu odeio a Mari ana!
11 de Janeiro. 
Querido diário, já sei como me livrar desse pesadelo. Começa que já 
parei a maldita da dieta hoje mesmo. Chega! Vou pro rodízio de pizza de 
novo hoje. E vou comprar um monte de chocolate e de sorvete. O vestido 
pro casamento? Que casamento? Esquece, não haver nenhum casamento! Como?
 Ah, me aguarde, você não perde por esperar. Nem aquela desgraçada da Mari ana.
 Ela vai ver o que e bom pra tosse. Nunca mais ela convida outra... 
digamos, levemente rechonchudinha pra madrinha de casamento. Eu odeio a Mari ana!
12 de Janeiro. 
Querido diário, está feito! Já mandei a carta pro Antonio. É, Antonio, o
 noivo. Diário, me superei! Nunca mandei uma carta anônima tão bem feita
 como esta, palavra! Mas nem aquela que enrolou o Padre Augusto naquela 
investigação de pedofilia, que eu considerava minha obra prima. Estou 
orgulhosa de mim. Só quero ver se vai ter casamento agora! Olha, diário,
 as coisas que eu contei naquela carta deixam qualquer cafetina de 
bordel morta de vergonha. Carreguei nas tintas mesmo! Além de contar 
todos os podres da Mari ana, 
que não são poucos, o que eu inventei de sacanagem deixa o livro da 
Bruna Surfistinha no chinelo. Eu sou um gênio. Agora aquela filha da 
puta vai se ferrar. Eu odeio a Mari ana!
13 de Janeiro. Querido diário, o circo pegou fogo! Tá o maior escândalo na família. O corno do Antonio entrou aos berros na casa da Mari ana,
 falou que não casa mais! Fiquei sabendo agora, a Gilda me ligou toda 
feliz com a fofoca. E aí aproveitou pra me contar mais umas da Mari ana, que ela diz que ouviu da Amanda, que foi empregada na casa daMari ana por uns tempos. Bem feito! Se eu soubesse antes...
14 de Janeiro. Querido diário, vai ter casamento!!! Pois o corno do Antonio acreditou em tudo o que a Mari ana
 e a mãe dela contaram. Que é tudo mentira, que a menina é inocente, que
 é invenção de alguma maluca despeitada, de um espírito diabólico, um 
monte de besteiras mais. O cara é muito trouxa mesmo, vai ter a maior 
galhada da história de São Paulo, ele que se prepare. Se já começa 
relevando assim, aí mesmo é que a Mari ana vai se servir. Corno manso! Eu odeio a mãe da Mari ana. Eu odeio a Mari ana!
 Eu odeio o Antônio! Eu odeio todos os cornos mansos, uns sem caráter, 
uns bunda–moles! Eu odeio casamento! Eu só amo o meu chocolate... Quero 
mais!...
Pois é, aí parou o diário, foi a última pagina. 
Quando aquela gorda doida entrou na igreja atrasada, depois que a 
cerimônia tinha começado, usando um vestido salmão que não fechava nas 
costas, na bunda, nas coxas, em lugar nenhum, com a roupa de baixo 
aparecendo, toda lambuzada de chocolate e gritando que odiava casamento,
 que odiava toda e qualquer pessoa ali presente cujo nome ela lembrasse,
 que odiava o padre, que odiava a Mari ana e que odiava o Antônio... Céus, foi um Deus nos acuda! Seguraram aMari a
 Regina, que estava no maior surto, e chamaram socorro médico urgente. 
Ela saiu de lá em camisa de força, xingando o Antônio de corno manso, a Mari ana de puta e entregando fácil, fácil quem tinha sido a autora da carta anônima.
Pois é, ela está internada até hoje. Por isso eu 
remexi nas coisas dela até encontrar o esconderijo secreto do diário. 
Não me arrependo. Agora vocês sabem quem é a Mari a Regina. Estou contente. Eu odeio a Mari a Regina!
A Mari ana?
 Na Europa ainda, com o corno do marido, lua-de-mel. Ela me ligou ontem,
 falando que está meio de rolo com um sueco lindo, que está no mesmo 
hotel deles, em Gstaad. Essa  Mari ana ! Mari a Regina é que está certa: uma putinha!

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