quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

O FECHAMENTO DE LIVRARIAS – 7ª Parte
O livro é caro demais para o brasileiro
MILTON MACIEL


Como eu disse no artigo anterior NÓS COMEÇAMOS MUITO MAL. A coroa portuguesa encarregou-se de nos dar esse início da baixíssima cultura, negando-nos o acesso à imprensa, ao livro e ao ensino superior.

Mas as coisas também foram mais complicadas para o nosso lado do ponto de vista demográfico e do aproveitamento de recursos naturais. Nossos colonizadores brancos foram mais atrasados que os colonizadores brancos da América do Norte. Nossos índios eram muito mais atrasados do que os peles-vermelhas americanos, de forma que o genocídio que os norteamericanos promoveram lhes foi muito mais rentável do que o genocídio promovido no Brasil. E, para completar, dos 11 milhões de escravos africanos que chegaram vivos às Américas, a metade deles veio parar no Brasil. Que foi o último pais americano a abolir a escravidão. Ou seja, comparando as três etnias, brancos, índios e negros, saímos sempre perdendo.

Com os recursos naturais, a coisa não foi menos dramática Os Estados Unidos declararam sua independência em 1763. Nós, só em 1822. Isso fez com que nossa ‘corrida do ouro”, acontecida durante o século XVIII, se desse toda sob o regime colonial e nosso ouro fizesse a riqueza de Portugal somente. Assim como aconteceu com a prata e ouro da America Ibérica, que foram todos para a Espanha.

A corrida do ouro americana deu-se quando eles já eram uma nação independente, digamos que o ouro ficou ‘em casa’. Os indígenas americanos tinham um rebanho de mais de 60 milhões de bisões, que crescia há séculos nas pradarias sob a sábia gestão dos nativos. Os brancos mataram quase todos esses “búfalos”, levando-os quase à extinção, para roubar as peles principalmente. Nossos índios não manejavam rebanhos de animais e eram quase todos pré-agricultores ou totalmente paleolíticos. Não servindo para o trabalho escravo e esse trabalho escravo sendo proibido pelo Marques de Pombal, foram expelidos para o interior do país, refugiando-se nas selvas. Onde também foram caçados, aprisionados e mortos. Dos possíveis 5 milhões originais, hoje restam uns escassos 10% disso como população indígena no país.

Em resumo, os brancos norteamericanos enriqueceram muito mais com o extermínio dos seus índios, mais aculturados e mais ricos. E tiveram uma população de escravos africanos muitíssimo menor do que a brasileira. Libertaram-na progressivamente, desde 1808 até 1863. Nós fizemos o mesmo, desde 1831 até 1888. Mas abandonamos totalmente a população de libertos à sua própria sorte, sem qualquer política de habitação, absorção e emprego para eles. Condenados a uma miséria ainda mais faminta do que a que havia nas senzalas.

Mas, ao menos, tivemos ativa sempre a miscigenação, diferentemente dos norteamericanos. Hoje somos um país mulato, com 52% da população formada por “pardos” e negros. Os americanos do norte contabilizam somente 12% de afrodescendentes na população deles.

Findo o nosso ciclo do ouro (ciclo português), o café assumiu o lugar de maior produto de exportação do país (ciclo brasileiro). Tornamo-nos um país relativamente rico, totalmente agrícola, baseado no grande latifúndio e na escravidão. Com a chegada de milhões de imigrantes na segunda metade do século XIX e início do século XX, a mão-de-obra escrava tornou-se antieconômica e de baixíssima produtividade, levando à rápida substituição pela mão-de-obra assalariada europeia. A industrialização a partir do início do século XX viria a seguir, inevitável. Mas chegamos muito atrasados nessa corrida econômica.

E, em especial, na CULTURAL, que é a que nos interessa nesta série de artigos.

Desembocamos na seguinte situação hoje:

POPULAÇÃO:    Brasil – 208 milhões; Estados unidos – 325 milhões

PIB per capita:     Brasil – 9 000 dólares; Estados Unidos – 59 500 dólares

Renda média mensal: Brasil: R$ 2 780,00; Estados Unidos – R$ 19 000,00

Preço médio do livro: Brasil   R$      40,50; Estados Unidos – R$        48,00

Livro/salário mínimo: Brasil: 4%               ; Estados Unidos:  0,6 %

Ou seja, no Brasil o livro é caro demais para os brasileiros!
E produzir e comercializar livros, portanto, é arriscado demais para editores e livreiros.

Ante um norteamericano que ganha cerca de 7 vezes mais que um brasileiro, um livro que custa praticamente a mesma coisa aqui e lá nos deixa em completa desvantagem. Ficamos com uma grande demanda reprimida por conta do poder aquisitivo insuficiente da população que lê.

Com poder aquisitivo 7 vezes menor e um mercado leitor também várias vezes menor, o resultado é que as tiragens no Brasil são normalmente pequenas demais, encarecendo ainda mais o preço final do livro.

Então, seguindo a comparação, chegamos ao final inevitável:

Livros completos lidos anualmente por habitante:
Brasil – 2,4
USA –  8,4

Total de livros produzidos em 2017
Brasil – 42,3 milhões –  Faturamento:  R$   1,7 bilhões
USA -   2,72 Bilhões – Faturamento: R$ 119,7 bilhões

Total de escritores publicados:
USA – 45 000
Brasil – ???

Os Estados Unidos não são, contudo o pais de maior renda per capita do mundo. Antes deles vêm países ricos com populações muito menores:
PAIS                 PIB per capita
Catar                 105 mil dólares
Luxemburgo       80 mil
Singapura            62 mil
Noruega              60 mil
USA                    59,5 mil

E estão longe de ser o país cuja população mais lê. Esse país é a ÍNDIA.

Número de horas semanais de leitura por habitante:
(Fonte: World Culture Score Index, UNESCO)
1 – Índia            10,4 horas
2 – Tailândia       9,2
3 – China            8,1
4 – Filipinas        7,6
5 – Egito             7,3
,9 – França          7,0
14 – Venezuela   6,2
18 – Argentina    6,0
23 – USA            5,4
28 – Brasil           5,0

Já vimos que nosso primeiro problema é econômico. Mas isso ainda não é nada ante nossa TRAGÉDIA EDUCACIONAL, nosso próximo tema, quando mergulhamos fundo no perfil do leitor brasileiro. E onde começam a aparecer as primeiras luzes nesse longo, escuro e íngreme caminho do livro e da leitura no Brasil. Com o consequente e atual FECHAMENTO DE LIVRARIAS. 

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