domingo, 22 de outubro de 2017

FICÇÃO LITERÁRIA, FICÇÃO DOMINANTE E FICÇÃO DE GÊNERO 
MILTON MACIEL

Quem não é do ramo não tem obrigação alguma de perceber, mas, da mesma forma que na arte musical, existem diferentes manifestações na arte literária. Naquela temos a música erudita, a música popular de alto nível, com melodia e poesia de qualidade e a música tipo povão, de largo consumo e sem maior responsabilidade estética, tanto na melodia, quanto na letra. A disseminação, o consumo e o “sucesso” de cada uma delas dependem do grau de cultura do público consumidor. 

Em termos de música brasileira, especificamente, um breganejo trepidante, cuja letra fale de balada, cerveja e bunda grande, vai ser apresentado e vender (e isso define o “suce$$o”!) muito mais que uma composição de Chico Buarque; e esta, por sua vez, muito mais do que uma composição de Villa Lobos.

Forma-se, de forma muito natural e compreensível, uma pirâmide com a música erudita no topo e a música-povão na base, proporcionalmente ao nível intelectual e cultural das diferentes faixas de público consumidor.

A mesma coisa ocorre com a literatura de ficção, com a ficção literária no topo, mas uma distribuição bem diferente nos outros níveis. Em literatura e, ainda mais especificamente, em termos da realidade do mercado livreiro no mundo, a ficção pode ser dividida em:

Ficção literária, ficção dominante e ficção de gênero

Ficção literária é a de mais alto nível. É muito mais alicerçada no personagens e sua psicologia do que no enredo ou trama. A linguagem é a mais complexa e rebuscada possível, o grau de erudição do autor é máximo. Ele não tem preocupação em atingir o grande público, uma vez que sabe que este não tem nível cultural suficiente. De um modo geral, preocupa-se mais com seus pares, com a crítica acadêmica e com o pequeno nicho de seus leitores especiais. As editoras comerciais de porte não têm preferência por autores novos de ficção literária.

Ficção dominante (mainstream) é aquela que tem mais apelo comercial em um certo momento. É absolutamente episódica e ‘sazonal’. Chega, explode, domina, é imitada, declina e passa. Harry Potter, O Senhor dos Anéis e os vampiros e lobisomens de Crepúsculo são exemplo disso. Em grande parte, recebe o apoio do cinema e o sucesso comercial é tremendo. As grandes editoras sonham o tempo inteiro com essa ficção, pois sabem que é ali que vão ter o maior retorno para o seu investimento.

Ficção de gênero é todo o resto. Entre gêneros principais, seus subgêneros e endosubgêneros, podemos contar mais de 60 possibilidades. A ficção dominante sempre será de um desses gêneros, alçado subitamente ao alto do palco. Em meu livro “A Arte e a técnica do romance (Milton Maciel, IDEL, 2017), da série “Como Escrever Ficção”, eu mostro todos os 62 gêneros e subgêneros mais usuais, explicando um por um. Vou dar aqui apenas UM exemplo de gênero e seus diferentes subgêneros e endogêneros dentro de cada subgênero.

I - Gênero: SUSPENSE
Subgêneros: Mistério, crime e tríler (thriller)

I.1 - Subgênero MISTÉRIO
Predomina o enredo sobre os personagens, a narrativa e o protagonismo envolvem os agentes que atuam do lado da lei

Endosubgêneros do subgênero Mistério:
Sereno – O protagonista não usa violência, apenas sua capacidade de solucionar mistérios, como a Miss Marple, de Agatha Christie.
Policial agente – Aqui o protagonista é um tira ou um detetive particular, que age de forma heroica e com uso de violência quando necessário
Policial equipe – O Mistério é resolvido por uma equipe multidisciplinar de policiais, como na série CSI e outras.
Médico, científico ou forense – A solução depende do conhecimento de médicos, cientistas ou patologistas forenses, algo fora do alcance de policiais normais.
Juri – Uma forma clássica de resolver o mistério através da atuação brilhante de advogados e promotores muito talentosos.
Histórico – Aqui o crime praticado, ou o mistério histórico ocorreram no passado e os envolvidos, vítimas, perpetradores e testemunhas já estão todos mortos. Protagonistas vão desencavar a verdade através de evidências e documentos que são resgatados pelos protagonistas e analisados por peritos. É um dos mais promissores filões do subgênero Mistério atualmente.

I.2 - Subgênero: CRIME
Predomina o enredo, mas aqui a narrativa e o protagonismo são, via de regra, dos próprios criminosos, como em “O Chefão”, de Mário Puzzo  ou em “Lúcio Flávio , o passageiro da agonia”, de José Louzeiro. Não existe Mistério, sabe-se quem são os criminosos desde o início.

O subgênero tem um único Endosubgênero estabelecido até o momento: o Noir. Nele o protagonista vive na fronteira entre a lei e a marginalidade, nunca se sabe se ele vai resolver ou cometer um crime e a grande surpresa final consiste exatamente em sua decisão e suas consequências.

I.3 - Subgênero TRÍLER (thriller)
Neste subgênero, de total predomínio do enredo, o suspense combina-se com ação, ritmo acelerado, surpresas, sustos, perseguições, grandes riscos, violência. Thrill, em inglês, quer dizer excitação e o thriller, aportuguesado já para tríler, tem que ser excitante. Às vezes pode chegar até mesmo à beira da porta de outro gênero, o terror.

Endosubgêneros do subgênero Tríler:
Psicológico
Político
Sobrenatural
Tecnológico (techno-thriller)
Erótico 

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