segunda-feira, 12 de outubro de 2015

PORQUE NELE ESTÁ VOCÊ 
MILTON MACIEL

Dizem que o mundo por aqui está todo errado:
Miséria, violência, frio, seca, fome, guerra.
Dizem que é dura demais a vida aqui na Terra
E que viver neste planeta é carregar um duro fado.

Mas como pode ser verdade, se aqui existem flores,
Se existe arte, amizade, compaixão, se há os amores?
Como pode ser ruim um mundo, quando nele a gente vê
Que ele é maravilhoso, porque nele... está VOCÊ!

Basta existir você, seu coração nobre e fecundo,
Para fazer pleno e perfeito qualquer mundo.


sábado, 10 de outubro de 2015

POR ESO, AMIGO (Poemas en español) 
MILTON MACIEL
(Consejo para un  amigo, para no verlo
 fracasar, como marido y como jefe)

Por  eso, amigo, le digo.
Y hasta un consejo le doy:
Trate de ser controlado!
Las ilusiones de hoy
Mañana… serán pasado
Tanto ya pasó conmigo:
Lo que le digo, no es ciencia
Tan solo es mi experiencia.

SECRETO DE MATRIMÓNIO
Oiga, amigo, escúcheme:
Sus días mejores serán
Si usted trata a su mujer,
Con el cariño de ayer,
Y la misma devoción,
Respeto y admiración,
Del tiempo de enamorado.

No se engañe, es muy errado
Creerse uno absoluto,
Muy altivo, muy astuto
Y señor de la verdad.

Ser macho no es ser tirano,
Si no que es ser soberano
Sobre su propia conciencia
Y actuar con serenidad.
Sepa usted que es un error
Ser grosero, ignorante,
Imponerse por temor
Y tener poca paciencia.

Si usted quiere ser feliz,
Trátele bien a su esposa,
Que el candor de una rosa
Le trajo un día a su vida.
Sepa verla siempre hermosa,
Afuera de su apariencia,
Que la edad modificó.
(Por que el tiempo transformó
También la suya, paisano!)

No opere como gusano,
No sea usted traicionero.
Sea leal y compañero:
Con quién le ofreció la mano,
Trate de ser verdadero!

No acredite en chismoseadas
Ni se vuelva sospechoso.
Y no crea que dar patadas
Le hace más respetuoso.
Si es respeto que usted quiere,
Sepa hacerse respetar.
Y eso no es intimidar,
Si no que es hacerse humano,
Tolerante y comprensivo.
Y mantenerse cautivo
De la amistad solamente.

Y Como jefe, por favor,
Al mandar sea paciente,
No se juzgue superior!
Si usted tiene autoridad,
No se crea un gran señor
Ni dueño de la verdad.
El que pague que lo mande,
Pero no se haga el grande:
Respete cuando mandar!

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

CANZONE PER T.  # 14  
MILTON  MACIEL  

O livro a mente encandeia,
Destila poemas de amor.
E o coração se incendeia,
Em flamas, qual rubra flor. 

Em flamas, qual rubra flor,
Explode em brilhos a aurora.
Explode a frase a compor:
– Te amo ainda mais agora!

Te amo ainda mais agora,
Depois destes anos tantos.
A juventude indo embora,
Cresceram mais teus encantos.

Cresceram mais teus encantos,
Tornaram-se atemporais.
E, para meu próprio espanto,
Te amo cada vez mais.

Te amo cada vez mais,
Destilo poemas de amor.
E o coração se incendeia,
Em flamas, qual rubra flor.


quarta-feira, 7 de outubro de 2015

EU SEI OS SEUS PIORES SEGREDOS     
MILTON  MACIEL     

Ei, pessoa! É, você mesmo, pessoinha, que está lendo isso aqui! Você, sim. Eu descobri os seus segredos mais incômodos, sabia?  Pode crer! Você já vai ver. Como? Quem sou eu? Ora, você já vai ver também, não se afobe, não apresse o rio. Bem, de qualquer forma, eu  sou o cara que sabe os seus piores segredos. Inclusive aquele mais brabo, que ninguém pode saber, mas ninguém mesmo, senão você se ferra total, pessoa. Quer ver o que eu sei?

Pois então pára tudo. Não, é tudo mesmo! Pára tudo e pensa pra valer nesse seu podre mais brabo aí. Tá, eu sei que você tem um monte, mas é o pior deles, o mais cabeludão, é: AQUELE!!!  Agora pensa no medão que você tem que alguém fique sabendo disso. Pensa bem, pessoa! Está pensando? Imagina então se alguém descobre e começa a espalhar ISSO por aí, joga no ventilador. Acaba com você! Pois acontece que EU sei tudo!

A sua sorte é que comigo o seu segredo cabeludo está protegido. Eu não conto nada pra ninguém. Sou capaz do mais completo e abismal silêncio. Aliás, por causa disso, eu mesmo me dei dois apelidos: Túmulo Fechado e Sepulcro Caiado.

Que sorte a sua que fui eu quem descobriu essa coisa horrorosa. Francamente... Você, hein? Quem diria! Pessoinha, em você existe um feio lobo por baixo dessa pele bonitinha de ovelhinha. Mas a mim você não engana, não. Agora eu sei de tudo. Mas, como já afirmei, sorte sua é que eu sei guardar um segredo. É, não só você, mas todas as outras pessoas que eu flagrei, estão mais do que seguras comigo. Segredo total. Absoluto!

A menos, é claro, que uma pessoa não saiba reconhecer, não saiba demonstrar gratidão por esse meu proceder idôneo, essa minha canina lealdade para com uma pessoa pecadora e portadora de um segredo aviltante. Explico melhor: Já houve até quem equivocadamente pensasse que eu sou um chantagista qualquer, desses chantagistazinhos miúdos e baratos de periferia, que cobram pra não revelar segredinhos torpes de alcova, de viadagem ou de desfalques, de fofoca de comadre ou de cabeleireiro.

Argh! Eu tenho nojo dessa gente baixa e rasteira! Chantagistazinhos chinfrins! Aliás, eu tenho nojo de tudo que não tenha classe e um bom tamanho. Por isso mesmo eu só opero na descoberta de segredo brabo pra valer. Dos maiores! E de gente importante que nem tu, pessoinha. Gente que tem, além de importância e nome a zelar, uma sólida retaguarda financeira.

Não, não se assuste, já falei que eu não sou chantagista. Imagine, longe de mim a ideia malévola de lhe extorquir dinheiro em troca da manutenção do seu segredo. Nunca, eu tenho a minha ética e dela não me afasto um milímetro. Eu não cobro nada para manter o seu horrível segredo absolutamente secreto e protegido. Fique tranqüila, pessoa.

Agora, eu agradeço e aceito a gratidão das pessoas que eu protejo da execração pública ou de parte de pessoas amadas, de pessoas cornas amadas, familiares, empregadores, fiscais federais, etc. Não posso impedir que pessoas realmente generosas – como você, pessoa, tenho certeza – queiram demonstrar a sua enorme gratidão pela proteção que eu garanto a seus tenebrosos segredos. Nesse caso, elas, pelo geral, me fazem impressionantes e significativas doações espontâneas, que eu não sou capaz de recusar, por medo de vir a ferir suas suscetibilidades.

O meu Camaro amarelo, por exemplo, foi doação de uma dessas pessoas imensamente reconhecidas. Eu descobri o segredo de sapatagem dela e não contei pra ninguém, mas pra ninguém mesmo. É, quando eu digo ninguém, é porque é ninguém e fim de papo. Nem o arqui-tri-corno do marido dela ficou sabendo. Afinal, lembram? – eu sou o famoso Sepulcro Caiado! E isso que ela traía o marido com a irmã dele e com a namorada da irmã dele, ao mesmo tempo. Você, por acaso, ficou sabendo quem ela é? Claro que não, eu não contei até hoje.

Por aí você vê como você pode ficar tranqüila, pessoa. Seu horrível segredo está em boas mãos. E eu não quero nada, absolutamente nada de você como condição para ficar em silêncio. Pode acreditar.

Agora, em contrapartida, eu espero não ter com você mais uma decepção traumatizante. Já chega a de ter descoberto sua barbaridade. Você, hein, quem diria?! Mas não vou ter, não, é claro que você não é do tipo capaz de cometer uma ingratidão horrorosa com o seu protetor aqui, não é mesmo? Com toda certeza você vai querer me presentear espontaneamente com um mimo delicado qualquer, sem exageros por que eu sou um moço tímido e fico logo sem jeito quando as pessoas querem me dar coisas de grande valor.

Eu me contento com pouco. Pra você ver como isso é verdade, vou até lhe dar uma ajuda e indicar umas coisinhas que eu gostaria de ganhar ou de que estou precisando. Por exemplo, eu apreciaria muito um gesto de gratidão consubstanciado (Hehê, português supimpa! Sou dos bons nisso também.) em algo simples e pouco espalhafatoso, como uma macinho modesto de notas de cem reais, totalizando não mais do que cem mil (convém que não seja menos do que isso também, questão de volume, sabe como é?). Ou um plano de viagem de volta ao mundo em 60 dias da Porcellatur, que é mais ou menos nesse mesmo valor modesto também.

Agora, precisar, precisar mesmo, eu não estou precisando de nada. É que eu sou um cara simples de todo, humilde como poucos. Só se a pessoinha achar por bem me presentear com um título de sócio remido do Paulistano, para a família, não é?

Ah, você quer saber como é que eu descobri o seu segredo? Ora, eu digo, eu não tenho segredos, não sou como você. Pra começo de conversa, eu tenho contratadas cinco agências de detetives. São as melhores do país, sabe. Sim, claro que são caríssimas. Mas sabe como é, eu tenho essa enorme felicidade de ser sempre contemplado com tantas demonstrações de gratidão das pessoas que protejo, que dá para pagar as agências com uma fração apenas do que recebo.

Mas as minhas melhores fontes não me custam quase nada. Como a quase totalidade das pessoas que eu investigo para proteger, preocupado com o sigilo total sobre as vidas delas, são mulheres, eu faço consultas espirituais pedindo que me informem se uma determinada fulana é digna de confiança e do meu amor, minto que quero casar com ela. Se for casada, digo que ela vai largar o marido. Se for muito velha, digo que tenho um fraco pela terceira idade. Ou mesmo pela quarta, se for o caso. O fato é que funciona. Por uma miserinha tipo 50 ou 100 reais, saio de lá com a ficha completa. Como foi no seu caso, pessoinha simpática.

As santas criaturas que me garantem o meu trabalho benemérito são Pai Tutufum e Mãe Cigana. É fazer a pergunta e lá vem chumbo grosso. Como é difícil encontrar uma pessoa sem podres, hoje em dia! Uma única vez aconteceu, uma tal  de Neuza Osório, de quem os dois guias espirituais só falaram coisa boa. Nunca mais esqueci esse nome. Tenho ódio dela até hoje, daquela inútil que não prestava pra nada, pelo menos pra mim.

Mas é isso, pessoinha. Você já pode imaginar o que Pai Tutufum me contou a seu respeito, não é? Pois é. Ele entregou você totalmente pessoa, me contou sua vida todinha, desde que você tinha sete anos e já estava começando a aprontar. Aí ele deu o serviço completo e até eu fiquei de cabelo em pé quando soube DAQUILO!

Mas você pode ficar tranqüila e confiante, pessoinha. Minha boca é um túmulo, já disse, eu sou o Sepulcro Caiado, lembra? De mim ninguém jamais vai ficar sabendo essa indignidade. Eu sou seu protetor. E sou o grande amigo das pessoas que, como eu, sabem valorizar esse sacrossanto valor humano que é a GRATIDÃO, como deve ser o seu caso.

Sim, porque se não for, bem... EU ODEIO PESSOAS INGRATAS! Nem sei o que sou capaz de fazer com elas...

terça-feira, 6 de outubro de 2015

TUDO É PURO ENCANTAMENTO
MILTON  MACIEL 

Em noites de Lua Nova,
Quando as estrelas, no alto,
Cintilam tons de cobalto,
Todo o meu ser se renova.
Vivo um mágico momento:
Tudo é puro encantamento.

Meu peito se expande em trova
De amor a esse firmamento.
E, num andamento lento,
Entoo pra Lua Nova.
Versos dos quais o acento
Traduz puro encantamento.

Respiro o céu num alento,
Tudo é puro encanto e vida.
E em cada estrela encantada,
Por todo esse firmamento,
Vem-me a visão sugerida
Dos olhos de minha amada.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

O EMPREENDEDOR  HONESTO  
MILTON  MACIEL  

Ah, fornecedores! De um tempo para cá os fornecedores, triste espécie de maciça e reconhecida intolerância, passaram a achar que eu devia pagar suas duplicatas, em que pese minha evidente impossibilidade – para não mencionar minha total falta de vontade – de fazê-lo. Engraçado isso: os caras vendem a prazo, o vencimento chega e eles se julgam no direito de receber em dia. Ora, não vendessem, então! Que falta de espírito esportivo, francamente...

Por outro lado, os clientes deram para achar que meus produtos não são bons. Vejam só: justo os meus produtos! Uns incoerentes, uns ingratos, só querem o venha-a-mim, uns refinados egoístas. Nem querem saber do trabalhão que dá fazer aquilo no Paraguai, passar por baixo da Ponte da Amizade (nome dado em reconhecimento à amizade dos guardas, nossos fachas), produzir e colocar embalagens e rótulos idênticos aos verdadeiros, aos importados mesmo.

Ora, rotular virtualmente é uma arte. E impedir que a importação se faça de verdade é um ato patriótico – bi-patriótico, aliás, pois beneficia tanto a economia guarani quanto a tupiniquim. Afinal, essas coisas com marcas suntuosas, grifes norte-americanas ou européias, são todas feitas na China mesmo!... Ora, os verdadeiros patriotas preferem o Guarani e o Real ao Yuan, é lógico.

O problema é que os ingratos dos clientes queriam devolver os produtos – produtos paraguaios legítimos, não qualquer porcaria Made in China, vejam bem! Muita ignorância, maldade humana mesmo. E deram para exigir o cumprimento da garantia, queriam trocas, devolução de dinheiro, conserto de equioamentos. Francamente, como se fosse responsabilidade minha garantir essas pendengas, consertar ou trocar essas bugigangas. Ora, não comprassem, então! Que falta de espírito esportivo, francamente...

Digam-me então, como pode um bom cristão, temente a Deus, trabalhar como um salutar agente de importação de produtos de grife legitimados, sob condições tão adversas? Ora, simplesmente não pode.

Já não basta ter que se esconder da esposa com a amante e da amante com a namorada, o cristão ainda tem que se esconder de credores inconvenientes e de compradores metidos a sebo. Grossa falta de responsabilidade dos governos, que não prestigiam os empreendedores honestos e cheios de iniciativa como eu. Somos todos vítimas desse sistema medieval e obscurantista, que quer nos obrigar a pagar dívidas impagáveis com os SPCs da vida, que quer nos obrigar a cumprir garantias impossíveis com os Procons da vida. Que país é este, Senhor?! E, como se não bastasse essa espoliação, ainda querem que a gente pague impostos.

Impostos, vejam bem! Algo que é imposto, enfiado goela abaixo no coitado do cidadão, que passa a ser tachado de contribuinte, nome mais horroroso, desrespeito total. Ora, como contribuinte? Como pensar em contribuição, quando o negócio é imposto a ferro e fogo pelos nababos no poder? Ora, minha filosofia sempre foi a mais correta e honesta possível: sempre fui contra a corrupção pública, contra o desvio de dinheiro do povo. Por isso mesmo é que sempre me neguei a pagar impostos, sempre evitei que meu dinheiro particular virasse dinheiro público. Para que? Para ser vítima de desvios e maracutaias? Não, não o meu, prefiro que ele fique no meu bolso ou no meu banco, antes que seja transformado em dinheiro sujo nas mãos de administradores públicos corruptos. Não, não mesmo – meu lema é tudo pela honestidade, dinheiro limpo, limpinho na minha mão.

Agora vejam a incoerência, o despautério, o desrespeito total e absoluto: ambos, fornecedores e clientes, passaram a insinuar que eu é que sou desonesto. Justo eu, que tenho essa divisa marcante, unívoca – tudo pela honestidade. Chega a dar um desencanto total, um desânimo, uma vontade de deixar todos eles na mão, não lhes comprar mais nada fiado, não lhes fornecer mais nenhum desses meus produtos de grife (pagos obrigatoriamente de forma antecipada, é lógico, nunca se sabe se os clientes vão ser honestos e pagar em dia suas dívidas comigo).

Com essa demonstração de incompreensão e intolerância por parte de clientes e fornecedores, cheguei a cogitar seriamente em deixar o país, oferecer meus préstimos de importador a nações mais civilizadas, onde o empreendedorismo e a honestidade sejam de fato reconhecidos, estimulados e enaltecidos. Minha primeira opção foi a Bolívia, por ser a mais óbvia.

Mas depois passei a considerar seriamente as Ilhas Fiji, por causa da qualidade da água mineral. Confesso que acabei ficando num impasse, o que me manteve imobilizado até este dia, impedindo-me de tomar uma decisão. Bom para o Brasil que, enquanto isso, vai se locupletando de minha presença benfazeja. Que o faça enquanto pode, pois não há de ser por muito tempo.

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

AO PÉ DA LETRA   
Ou De Como me Ferrei Traduzindo Inglês (e de como isso foi o melhor negócio!)   
MILTON  MACIEL   
  
Ô língua desgraçada essa de americano, o tal de inglês! Descolei um bico aqui na Glória, no hotel. Um ajudante de valet se mandou com uma cabrocha e não deu mais as caras. O hotel ficou em necessidade e aí o Moqueca me indicou pra vaga. Os caras tavam tão a perigo que nem teste fizeram comigo. Mas me exigiram uma coisa: Você fala inglês? Porque tem que falar alguma coisa e entender o que os gringos pedem. Você se vira com inglês?

Na hora eu gelei e menti: Iéssér, ta tudo dominado, bróder. O cara engoliu e me deu a vaga. Aí eu fiquei na maior fria, é claro, com medo que algum hóspede gringo viesse falar direto comigo. Mas não deu outra, menos de uma hora depois já veio o primeiro e falou um treco esquisito assim:

 – Rauareiudúin – Foi mais ou menos isso.

Eu fiz que não era comigo, acenei pro outro lado da rua e saí correndo, como se fosse atrás de alguém. O gringo pegou outro pra cristo. Me safei, mas foi por pouco. Aí fui pedir socorro pro Moqueca. O negão tremeu todo aquele enorme barrigão, na maior gargalhada com o meu problema. Mas aí ele foi legal, disse que ia afanar um dicionário de inglês que tinha na portaria e trazia pra mim.

Não sei pra que isso! Quando peguei aquele troço na mão, bróder, era só coisa que ninguém pode entender. Mas o Moqueca disse que foi assim que ele se desapertou, mais a ajuda da Raíssa, que se virava em Copacabana e tinha uma pá de cliente gringo, trasava legal um monte de palavrório de americano. Mas aí eu dei um arrocho no Moqueca.

– Ta, mas e o tal de rauareiudúin, como é que fica?  Moqueca rebateu na hora:

-  É ingreis, mano, é Rau are iu duing, qué dizê que eles ta te cumprimentando, que nem se dissesse E aê, tudo legal? O Rau qué dizê Como. O iu é você mesmo, mermão. E o duin quer dizer fazendo. O are eu não sei, acho que ta ali de bobera, não faz falta traduzir.

Eu estranhei: Ué, quer dizer que eles me cumprimentam querendo saber como é que eu tou fazendo?! O  Moqueca confirmou: Língua de doido, sô! De qualquer jeito, mais na minha, voltei pro meu lugar e fiquei esperando o próximo gringo. O Moqueca me ensinou que, quando você não entende, deve dizer sempre iéssér ou então veriuél, que aí os gringos ficam contentes.

O próximo gringo era uma gringa. Alta, loira, é claro, queimada como camarão e quarentona. Fiquei esperando o rauareiuduin para responder vériuél. Pois o diabo da gringa veio com outra coisa:

– Rauduiudu? – E eu me ferrei de novo! Arrisquei um vériuél e ela ficou satisfeita, até riu pra mim: Gud, véri gud.

Dei o golpe do aceno de novo e  corri pro Moqueca. Que raio queria dizer isso, os gringos mudavam o jeito de chegar na gente assim, é? O Moqueca curtiu de novo com a minha cara e falou:

– Olhaí, mermão, tu tem que intendê as palavra, saco! Esse tal de du quer dizer fazer. O resto fica fácil.

– Então dessa vez a gringa não quer saber como eu estou fazendo, ela quer saber como é que eu faço. É isso? O Moqueca fez com a cabeça que sim, que era mais ou menos isso.

Coisa estranha esses americanos! Cumprimentam perguntando como é que e gente ta  fazendo. Ou então como é que a gente faz. Mas faz ou ta fazendo o quê? Será que era o que eu tava pensando? Muita cara de pau deles! Mas é gente de outro país, sabe lá como eles não são abusados por lá.

Aí a coisa continuou por uns dias sem maiores problemas, um gringo velho e aquela gringa vermelha eram os únicos que pareciam ter preferência por mim. O homem sempre me perguntava como é que eu to fazendo. E a mulher sempre perguntava como é que eu faço. E ela sempre sorria e piscava o olho pra mim. Aí saquei o que a gringa tava querendo. Era mesmo o que eu tinha imaginado. Ela queria saber como é que eu faço aquilo, tava na cara! O jeito de sacana dela não deixava dúvida.

Aí me preparei pra guerra. No outro dia, eu cheguei com um albumzinho de fotos desses de revelações de uma hora. Ali eu tinha uma boa dúzia de fotos minhas com a Guiomar, a gente na cama e no chão do motel, fazendo as coisas de tudo que é jeito, uma beleza. A gente armava a máquina pra 30 segundos, corria pra posição e clic! Ficou um espetáculo. Agora é que a gringa ia ver como é que eu faço o negócio sério. E não deu outra. Assim que ela veio, toda sorridente e me perguntou, piscando aquele olho sacana,rauduiudu, eu respondi na mesma hora iéssér e estendi o álbum pra ela, já aberto na primeira foto.

Pensei que a gringa ia ter um troço! Primeiro ela arregalou os olhos, com cara de susto. Depois ficou duas vezes mais vermelha do que já era. Aí olhou pra mim com cara de furiosa e falou alto:

 – Rauduiudér?!!! Ariú creizi? Rauduiudér?!

Não entendi! A gringa parecia furiosa. Mas, apesar disso, ela olhou todas as fotografias, me olhando com cara de reprovação. Aí ela jogou o álbum no chão, na minha frente e saiu falando um monte de coisa naquela língua arrevesada dela.

Aí eu fiquei assustado. Será que a gringa achou que eu fazia as coisas muito mal? Ou bem demais? Achei depois que era porque, no país deles, eles devem de fazer tudo muito diferente, então. Claro, corri pro Moqueca. Mas ele não sabia o que era aquela história de rauduiudér, de ariucreizi.

Então a gente foi até a recepcionista, que é fera em inglês e a gente falou o que a gringa tinha gritado pra mim: rauduiudér e areiucreizi. A moça explicou, escrevendo pra gente ver como era;

– How do you dare significa Como você ousa. E Are you crazy quer dizer Você é louco?

Aí o caldo engrossou pro meu lado: um gerentezinho imbecil estava ouvindo tudo e foi me entregar pro chefe geral, o japa. Rua na mesma hora! Me mandaram embora e fim de papo. E o pior é que eu continuava sem entender. O raio da gringa me perguntando, com ar de safada, como é que eu faço e quando eu, porque não podia falar a resposta, levei o álbum, ela acaba ficando uma fera.

Bom, voltei pro barraco, peguei o violão e comecei a me dedicar a criar o próximo samba-enredo da Estácio. Esse ano tenho certeza que vou emplacar, junto com meus parceiros. Passei a tarde inteira na rede, tocando, compondo e mandando umas bramas. E aí aconteceu a coisa mais estranha de toda a minha vida, algo que eu nunca podia esperar.

Lá embaixo eu vi um táxi parando e o motorista mandando os moleques pedir autorização pras chefias lá em cima, pro passageiro poder subir. Não, claro que não é isso a novidade, isso é super comum, porque se o cara sobe sem autorização, leva chumbo na primeira curva. Mas o incomum foi o que veio depois. Eu esqueci a coisa do táxi e voltei a tocar meu samba, beber minhas cevas, quando o tal do passageiro encosta na minha rede, no meu barraco e fala comigo:

– Raí rânei, raudoiudu?

Levei o maior susto, gente! Pois se era a gringa vermelha em pessoa! Aí ela foi logo me pegando, me beijando, passando a mão em tudo que era lugar, falando um monte de coisas sem parar, parecia que tava com uma fome de anteontem. E olha que tava mesmo, porque foi difícil matar a fome da mulher!

Conclusão: a gringa tinha se amarrado nas fotos do albumzinho, deu uma de fazer doce na hora, mas quando soube que tinham me mandado embora, ficou uma fera com o gerente do hotel. O Moqueca me contou que ela só faltou dar porrada no cara, um japonezinho baixinho que só se curvava o tempo inteiro, pedindo perdão. E ela exigiu o meu endereço, que o Moqueca passou na mesma hora pro João Fancha, um motorista de taxi que faz ponto no hotel. E a gringa veio atrás de mim. Essa é a história incrível!

E agora o mais difícil de acreditar ainda: Amanhã o papai aqui está embarcando pros Esteites, com o violão, pra mostrar o meu samba pra gringalhada. A gringa, que aliás se chama Márion, tá me levando, vou morar com ela em Miami, que ela diz que é quentinho e tem praia como o Rio, pra eu não estranhar. Com todas as mordomias e uma boa grana. E o gostosão aqui só tem que comparecer todo dia nos conformes das fotos com a Guiomar. Foi só o tempo de tirar o meu passaporte e o meu visto de artista, ela tratou disso pessoalmente no Consulado, se responsabilizou por mim. Durante esses meses, fiquei no hotel como hóspede, meu chapa! No apê da gringa, quer dizer, da Márion. Tirando onda com a cara do japurunga que me demitiu, fazendo ele de capacho, dando cada puta gorjetão pro Moqueca!

Ah, se eu aprendi inglês?  Ainda estou no iéssér e no vériuel. Isso é suficiente pra o que eu tenho que fazer. Nessas horas, o discurso é sempre ela que faz.