terça-feira, 12 de maio de 2020


AFLUÊNCIA - Como o consumismo desenfreado erode nossas vidas. E mata mais em época de pandemia.
MILTON MACIEL 

Casas enormes, televisões cada vez maiores, mais carros ainda, rostos mais jovens a qualquer custo – estes objetivos são freneticamente perseguidos pelos workaholics de classe média. Ainda que, para lograr isso, tenham que se esfalfar (estranhamente SENTADOS* dezenas de horas por semana) em detrimento de sua saúde e de suas relações familiares.

Especialmente porque o nível de tensão é sempre mantido altíssimo, já que a maior parte das aquisições é conseguida através do uso do crédito, criando toda uma geração de devedores compulsivos estressados, eméritos e eternos pagadores de juros vitalícios.

Algo que é ainda mais tensionante para as mulheres que trabalham, uma vez que são obrigadas a gastar, ao longo de toda sua vida, duas a três vezes mais que os homens de sua mesma idade – porque sujeitas a custos muito mais elevados, causados pelo maior complexidade do organismo feminino (custos biológicos), pelo arsenal de consumo obrigatório de roupas, acessórios e produtos e serviços de beleza (custos comportamentais) e pelo denominado “imposto da vagina”, que impõe às mulheres preços mais elevados que os dos mesmíssimos produtos vendidos para homens (custos mercadológicos)**.

Isso numa sociedade onde as mulheres têm jornada dupla de trabalho, ganham menos do que os homens para fazer o mesmo trabalho e são, em 50% dos casos, as únicas que sustentam a família, é muito mais do tensionante – é cruel.

“Estudos conduzidos em diversos países mostram que se você coloca um alto valor nessas coisas, você está muito mais sujeito a sofrer de depressão, ansiedade, dependências e desordens de personalidade. Pessoas nos países de língua inglesa têm o dobro da possibilidade de desenvolverem doenças mentais do que as pessoas que vivem na Europa continental.

Cuidado com o vírus da AFLUÊNCIA! Uma epidemia de consumismo descuidado está varrendo o mundo com a perseguição compulsiva de mais dinheiro e mais posses, tornando as pessoas mais ricas e mais... tristes!”

Este é o aviso cabal dado pelo psicólogo inglês Oliver James, em seu best seller “AFFLUENZA”*** (Afluência, em português, com o significado de abundância, fartura). O nome faz trocadilho com o vírus da influenza (gripe) e a palavra inglesa para afluência, que é affluence.

“Nós ficamos mais viciados em ter do que em ser e passamos a confundir nossas necessidades com nossas vontades”, conclui o autor.

E este é o caminho garantido para a INFELICIDADE.


É também o caminho para nos transformarmos numa sociedade que não apenas vive e ´se mata´ no trabalho em busca da afluência, mas também uma sociedade que literalmente se mata durante processo, porque de fato MORRE por causa da afluência.
Mesmo em tempos de pandemias, quando as moléstias infecciosas voltam a ter participação sensível no número de óbitos totais, ainda assim as chamadas “doenças da civilização” ou “moléstias da afluência” seguem sendo aquelas que mais matam no mundo. Doença cardiovascular, hipertensão, obesidade, intolerância à glicose, diabetes, dislipidemia e câncer seguem sendo os grandes aflitores e maior preocupação para as autoridades mundiais da saúde.

MOLÉSTIAS DA AFLUÊNCIA E COVID-19

As doenças acima citadas estão na base daquilo que torna agora os infectados pelo coronavírus particularmente suscetíveis ao desenvolvimento de casos críticos e fatais. Análises feitas com 5 700 casos de internação em Nova Iorque**** revelaram que as ditas COMORBIDADES  são exatamente as citadas acima: hipertensão, obesidade, síndrome metabólica, resistência à insulina, diabetes e doença cardiovascular prévia puxando o trágico cordão. Basicamente doenças metabólicas, resultantes de uma alimentação errada e excessiva e de uma sedentariedade cada vez mais patológica.

Ter uma ou mais dessas moléstias da afluência dobra a possibilidade de internações e mortes em pessoas com menos de 60 anos. E 88% dos pacientes internados, mostra o estudo, tinham pelo menos DUAS dessas comorbidades ao mesmo tempo.
Constatou-se que níveis elevados de glicose no sangue desempenham um papel importante na replicação do vírus e no desenvolvimento das tempestades de citocina.
Isso sem falar que já está comprovado que a obesidade é um fator de risco para qualquer moléstia infecciosa, pois faz baixar o nível geral de imunidade da pessoa.
É, amigo, cuidado! Afluência mata e pode matar um pouco mais agora.

REFERÊNCIAS
* Livro “SITTING KILLS, MOVING HEALS”, Dra. Joana Vernikos, pesquisadora e treinadora de astronautas da NASA - How modern sedentary lifestyles contribute to poor health, obesity, and diabetes, and how health can be dramatically improved by continuous, low-intensity, movement that challenges the force of gravity. 

** Livro “COMO É CARO SER MULHER!”, Milton Maciel - Custos biológicos, sociais e mercadológicos como barreiras à independência econômica das mulheres

*** Livro “AFFLUENZA”, Dr. Oliver Jones - There is currently an epidemic of 'affluenza' throughout the world - an obsessive, envious, keeping-up-with-the-Joneses - that has resulted in huge increases in depression and anxiety among millions.

**** High prevalence of obesity in severe respiratory syndrome coronavirus-2 requiring invasive mechanical ventilation - https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1002/oby.22831

Nenhum comentário:

Postar um comentário