MILTON MACIEL
O maior dos poetas portugueses contemporâneos, Fernando
Pessoa, manifestava grande interesse por assuntos esotéricos. Revelações feitas
pelo escritor português Paulo Cardoso no livro “Mar Português e a
Mensagem Astrológica”, mostram um Fernando Pessoa muito mais envolvido com
a Astrologia do que se supunha até então.
O longo e persistente trabalho de investigação de Paulo
Cardoso foi possível a partir do momento em que os familiares de Pessoa doaram
todo o espólio cultural do poeta ao governo português. Paulo foi uma das poucas
pessoas a obter autorização para manusear o impressionante acervo de 30 mil
documentos originais, manuscritos ou datilografados.
O que ele descobriu, boquiaberto, é que nada menos que 2700
desses documentos se referem a assuntos de numerologia, geometria sagrada e,
esmagadoramente, de Astrologia. Aos olhos do pesquisador foi aparecendo aos
poucos um Fernando Pessoa astrólogo. E um astrólogo profissional,
que cobrava por consultas dadas, com uma tabela de preços encontrada em um
manuscrito de próprio punho, com preços para interpretação simples,
interpretação média e interpretação avançada.
Mas a coisa não parava aí. Paulo Cardoso descobriu que
Pessoa definia seus heterônimos astrologicamente. Aplicava técnica eletiva até
encontrar um mapa que mais se assemelhasse com o heterônimo que tinha em mente
criar. Em seu livro, Paulo Cardoso reproduz o mapa, feito pelo poeta, de seu
heterônimo Ricardo Reis, o médico. Este, Álvaro de Campos,
o engenheiro e Alberto Caeiro, o pouco culto, são os três mais
conhecidos heterônimos usados pelo poeta.
Mas o que mais impressionou Paulo foi descobrir o heterônimo
Raphael Baldaya, que Fernando Pessoa apresentou como sendo o mais
velho e o mais sábio de todos e que era astrólogo!
Sob esse nome fictício, Pessoa elaborou um projeto editorial
que lhe era especialmente caro ao coração: a publicação de um livro técnico de
Astrologia, com o nome “Essays in Astrology” – Ensaios
de Astrologia. Na revista “Delphos Astrologia, Vol. 1 No. 2
foi publicado o fac-símile da página original, datilografada pelo próprio
poeta, que é reproduzido no fim deste artigo.
O texto está datilografado em inglês, a segunda língua de
Pessoa, já que ele viveu muitos anos estudando na África do Sul. Uma grande
parte dos originais de Pessoa é redigida em inglês, já que esse fantástico
geminiano até nisso exibia sua dualidade: era absolutamente bilíngue.
Aliás, a manifestação da multiplicidade de talentos de
Fernando Pessoa é uma exteriorização do seu multifacetamento interior. O que
ele aprendeu a equilibrar com o auxílio da Astrologia, criando com ela os seus
heterônimos, seus diversos eu-mesmo, seus personagens internos.
Fernando Pessoa tinha o Sol em Gêmeos e Mercúrio, seu
dispositor, no sensível e poético signo de Câncer. Ali, na casa XI natal,
recebia a dupla quadratura de Marte e Urano, conjuntos em Libra. Uma estrutura
planetária que indica a existência de um possível hipertireoidismo em Pessoa.
Como escreveu Paulo Cardoso:
“A Astrologia vai-lhe ser uma filosofia de apoio, o fio
que lhe permitirá habitar e viajar o labirinto de sua interioridade, enveredar
por sua irresistível vocação de descobridor dos meandros do seu próprio
processo intelectual, sem que corresse o perigo de cisão total com o exterior,
com o mundo, o risco de ficar eternamente fechado, hipnotizado, extasiado,
sucumbido no delirante ritmo de sua mente. A Astrologia foi pois, a partir
dessa altura, a fórmula que respondia assiduamente às dúvidas que se lhe punham
acerca de sua sincronia com a vida e com o mundo.”
Projeto do livro de Astrologia de Fernando Pessoa, que não
chegou a ser publicado em razão da morte prematura do poeta:
ESSAYS IN ASTROLOGY
By Raphael Baldaya
I – The conventions in Astrology
1) The intellectual zodiac
2) The measures
3) The attributions
II – The zodiac
III – Directional Astrology
IV – Symbolic directions
V – Prenatal figures
VI – Mundane Astrology
VII – Defense and justification of Astrology
VIII – Horary Astrology
IX – The sorts
X – The fixed stars
XI – Transits and eclipses
XII – General reading of the nativity
XIII – The mundane houses
XIV – The foreign element in Astrology
Rejection of the Occult Element, of the Symbolic element